segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Raimundo Ramos de Paula Filho – Ramos Cotoco


Raimundo Ramos de Paula Filho ou Ramos Cotoco (1871-1916)  – como era largamente conhecido por lhe faltar o braço direito – foi um dos mais populares artistas que o Ceará já produziu.Pintor, músico, e poeta lírico, Ramos Cotoco nasceu em Fortaleza e aqui viveu toda sua agitada vida boêmia.
Colorista inigualável, ninguém melhor que ele soube desvendar os segredos da combinação de tonalidades, da perspectiva aérea, da noção de profundidade. Suas paisagens eram apreciadas devido à poesia que trazia implícita; suas árvores pareciam mover-se; suas cachoeiras eram de uma leveza tal que davam a impressão de minúsculos lençóis de água.
Era o mágico dos pincéis, o soberano das cores.
Malsinado por seu estilo de vida desafiador, mas extremamente requisitado como artista, não lhe faltava trabalho: abria letreiros, fazia cartazes dos cinemas, pintava anúncios multicores de lojas de modas, armarinhos e casas de ferragens.
Quando atingiu o apogeu de sua popularidade como pintor, não havia alpendre ajardinado ou sala de jantar onde seu pincel mágico não desse o sinal de sua presença, valorizando com sua arte, ricos espaços internos de solares e bangalôs.
Apesar dos razoáveis ganhos financeiros que sua arte lhe proporcionava, nada amealhava, pois não abria mão de sua alegre boêmia. Largava o serviço cedo, pelas quatro da tarde, e caía na farra. Apostava no jogo do bicho, jogava sinuca, arriscava no carteado. Nas noites de lua, reunia os amigos na Praça do Ferreira para serestas que duravam a noite toda.   
Figura ímpar em Fortaleza, trajava-se com um paletó de estopa, talhada porém, pela melhor alfaiataria da capital – a Alfaiataria Amâncio – e de cuja lapela pendia o topázio de girassol – (no dizer de Otacílio de Azevedo, contemporâneo e amigo pessoal do artista).
Outras vezes andava mergulhado num surrado jaquetão de casimira azul, calças muito largas, boca-de-sino (que anos mais tarde se tornaria moda em Fortaleza), chapéu de palhinha raso, envernizado. 
Era descrito como excêntrico, fazendo questão de escandalizar os grã-finos da época, vestindo-se espalhafatosamente, bebendo, jogando e fazendo serestas sempre na companhia dos seus amigos diletos e também pintores José de Paula Barros e Antonio Rodrigues, no pleno exercício diário da boemia. 

Publicou em 1906 o livro Cantares Boêmios, por uma tipografia local, edição do autor. Ressalta-se nessa publicação sua qualidade de letrista. Na opinião de criticos que apreciaram a obra, provavelmente sua poesia não se firmaria como produção literária, sem o complemento da melodia.
Por isso o poeta acertou ao incluir muitas partituras de suas canções no volume de versos.
No Museu do Ceará, no espaço reservado ao Ceará Moleque, um painel reproduz uma famosa modinha de Ramos Cotoco:

O BONDE E AS MOÇAS

Na rua onde passa o bonde
Moça não pode engordar
Não trabalha, não estuda, não descansa...é um penar.
Se o bonde passa, está na janela:
Se o bonde volta,
Ainda está ela...
Namora a todos,
É um horror;
Aos passageiros
E ao condutor
Todas elas, sem exceção
Tem as mangas dos casacos
De viverem nas janelas
Todas cheias de buracos
Algumas eu tenho visto
Correrem lá da cozinha
Com a boca cheia de carne
Sujo o rosto de farinha
Outras, de manhã bem cedo,
Acordam atordoadas
Vem o bonde... elas já surgem
Com as caras enferrujadas.
As parelhas já conhecem
Estas moças de janelas
Quando passam se demoram
Para olharem para elas.

 teto do altar-mor da Igreja de Nossa Senhora do Carmo



Teto do foyer do Teatro José de Alencar.

Mas foi na pintura que Ramos Cotoco mais se destacou. Seus trabalhos podem ser encontrados no Teatro José de Alencar, nos nomes e desenhos pintados sobre as grades dos camarotes, e nas alegorias em torno dos retratos de Carlos Gomes e de José de Alencar, no foyer do teatro.
São também de autoria de Ramos Cotoco as telas encontradas no teto do altar-mor da Igreja de Nossa Senhora do Carmo e no prédio da Sociedade de São Vicente de Paulo, na Praça do Coração de Jesus.
Raimundo Ramos faleceu em 1916. Foi o maior artista plástico do seu tempo.

pesquisa:
Fortaleza Descalça, de Otacílio de Azevedo
Sábado - Estação de Viver, de Juarez Leitão

11 comentários:

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

M A R A V I L H O S O !

Aliás, MARAVILHOSOS: o "post" e o artista.....Eu, praticamente, nasci vendo as imensas, coloridas e belas pinturas de Ramos Cotoco.
É bem verdade que só vim saber quem era o autor já grandinha..rsrsrs
Desde criança frequento o TJA, a Igr. do Carmo e estudei SSVP.

Então, Fátima, a pintura de S.Vicente de Paulo, ainda está lá, na sociedade ?....pelo jeito sumiu mesmo,vc não mostra aqui na postagem!

Não conhecia a veia poética desse admirável artista!

Linda postagem!!!!!

Fatima Garcia disse...

Oi Lucia obrigada pelos comentários. Com relação ao quadro do prédio das vicentinas, na verdade eu não sei, pq não fui até lá. A vez que passei por ali estava fechado, fiquei de ligar p/ver um horário, mas não voltei. QQ hora dessa passo lá e completo o post.
bjs

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Fátima, acredito que ocorram, em todos os domingos, por voltas da nove da manhã, as tradicionais CONFERÊNCIAS com os "confrades vicentinos". Você pode arriscar uma ida lá....às vzs tem até um bom cafezinho..rsrsrs...se quiser companhia, estou ao seu dispor...Pra enriquecer, MAIS AINDA, seu "blog", vale à pena um "domingo vicentino"....

Boa noite!

César Martín disse...

Fantástica publicação, senhora.
Estou conhecendo agora este gênio absoluto da arte na nossa querida cidade.
Estou sabendo que a Orquestra de Flautas da Universidade Federal do Ceará, regida pelo Maestro Valdinez Cláudio, está interpretando músicas deste genial Ramos Cotoco.
Arte fina e autêntica que se perpetua!
Parabéns pelo seu espaço, muito obrigado!
C.M.

Fátima Garcia disse...

César,
muito bom saber que a orquestra da UFC está resgatando a obra musical desse grande e esquecido nome das artes cearenses. Não conheço as músicas, mas as pinturas são divinas. Deveria ser mais divulgado. Obrigada pela visita

Fátima Garcia disse...

muito criativo mesmo, Porao

fatima abreu disse...

Amei este blog. Parabéns.

Fátima Garcia disse...

obrigada pela visita, fatima abreu, volte sempre
abs

Unknown disse...

Genial o Ramos Cotoco. Sem dúvida, o Falcão deve ser a reencarnação dele.

Rinaldo ramos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rinaldo ramos disse...

Genial e fantástico artista de Fortaleza. Foi o grande de sua época. Está eternizado nas suas obras. Me orgulho de ser seu bisasobrinho.