quinta-feira, 28 de março de 2019

De Modistas e Alfaiates à Indústria de Confecções


Até a metade da década de 1950 não existiam em Fortaleza as indústrias de confecções que oferecem roupas prontas, que preenchem as exigências de um público diversificado no gosto e no orçamento. A demanda por figurinos que atendessem a um determinado padrão no modo de vestir, surgiu ainda no século XIX, quando a cidade vivia as delicias da Belle Époque. 

Moda feminina nos anos 20 onde prevalecia tecidos arejados como seda, cetim,
 charmeuse e o crepe da china. Foto de 1926 
(imagem do livro Fortaleza Belle Époque)
   
Na remota década de 1860, já havia anúncios de artigos vestuários publicados na imprensa, oferecendo variado sortimento de finos tecidos (sedas, merinos, veludos, caxemiras e cretones) chapéus, luvas, gravatas, sapatos e figurinos tanto para adultos e crianças. 


Atenção – para o baile do Clube chegaram para o Bazar Cearense as verdadeiras luvas de pelica, de Juven, para homem e senhora. Rua da Palma, n° 93. 
(anúncio publicado no jornal Pedro II – 1868) 

moda dos anos 30

Predominava então, e por muitos anos depois, o comércio de tecidos, onde as pessoas adquiriam o necessário para confecção das vestimentas, trabalho que era realizado pelas inúmeras costureiras ou alfaiates espalhados pela cidade. Os anos 1920 considerados por muitos historiadores como “turbulentos e anos loucos” marcaram uma época de efervescência cultural, movimentos feministas e também de uma moda importada da Europa, que vai ditar ousadas formas de vestir e consumir produtos de beleza no Brasil e no mundo, tendo as mulheres como alvo principal. 



A disponibilidade de materiais e tecidos fomentou a procura por modistas e alfaiates, pois apesar de inicialmente, visar apenas as mulheres, os homens também andavam elegantemente trajados. Assim, a elite de Fortaleza se viu disposta a consumir as novidades, frequentar espaços modernos com a intenção de se distinguir do resto da população por seu poder aquisitivo; assim, homens e mulheres aderiam à moda vinda de Paris como uma regra da modernidade. 




Os profissionais da costura eram muito procurados especialmente quando o assunto eram vestuários de festas e casamentos. Entre as modistas, o grande destaque ficou por conta de Dona Edmea Mendes, considerada a “dama da moda cearense”, uma das primeiras a usar o artesanato na alta-costura. Vestiu três gerações de mulheres e sua especialidade eram os vestidos de noivas. Com muito talento, conseguiu se destacar a partir da década de 40 do século passado, quando a indústria de confecções ainda não existia em Fortaleza e engatinhava no Brasil. Além das habituais linhas e agulhas, Edméa investia em sua loja. A “maison” inspirava-se no requinte das casas parisienses da época, com salas para provas e boutique para a venda do prêt-à-porter. 

um dos alfaiates mais antigos de Fortaleza, com 77 anos no ofício, o Sr. Osmundo Sousa mantinha sua alfaiataria no Edifício Lobrás, no Centro, até 2015, quando faleceu 
  
Os alfaiates se estabeleceram em sua maioria no centro da cidade, e eram especialistas em roupas masculinas sob medida, de forma artesanal. As peças eram exclusivas, modelo, medidas, tipo e cor do tecido eram escolhas do cliente, totalmente personalizadas. Nos tempos modernos, apesar da infinidade de opções de trajes prontos, para entrega imediata, muitos alfaiates ainda são encontrados em Fortaleza, com uma clientela fiel e seleta, já que não custa pouco, a confecção de uma peça exclusiva.

As coisas começaram a mudar a partir de 1934, quando Rubens Lima Barros fundou a Loja "A Cruzeiro", na Rua Guilherme Rocha (mais tarde mudou-se para a Rua Barão do Rio Branco, no chamado "quarteirão sucesso da cidade"),  que inaugurou a era das camisarias. Vendia camisas pré-acabadas, fazia uma peça em uma hora. Havia uma propaganda que mandava o cliente ir tomar um café no Abrigo Central, que quando voltasse, a camisa estaria pronta. Depois da A Cruzeiro surgiram outras camisarias que começaram a trabalhar com a roupa completa, o terno pré-acabado. A Cruzeiro criou a “Confecções Dahra”, que depois virou Romac. Em 1957, a Romac foi vendida para Agenor Costa. 


A Romac S/A Confecções foi oficialmente a primeira indústria de confecções da cidade, comercializando roupas prontas, para o público masculino. Vendida mais tarde para Vicente Paiva, adotou o slogan “Romac veste melhor”, chegou ao mercado internacional, exportando suas criações para vários países.


propaganda da Romac - 1975

Depois da Romac surgiram várias indústrias de confecções, a exemplo da  Saronord, que iniciou as atividades no ano de 1964, produzindo calças e camisas masculinas em grande escala, separadas por tamanho, pequeno, médio e grande. A primeira indústria dedicada ao público feminino, foi a Del Rio, criada em 1963, com uma linha de lingeries e peças intimas.

propaganda da Saronord - 1970

E a indústria da moda nunca mais parou de crescer. As peças que são produzidas no Ceará nos dias atuais, levam a um passeio por fios e máquinas que movimentam uma indústria potente para o País. O bojo de biquínis e sutiãs, os fios de vestidos, blusas e bermudas e o popular jeans produzidos no Estado, elevam o Ceará ao topo do ranking da América Latina nesses segmentos. Considerando toda indústria têxtil brasileira, o Estado está em quinto lugar. Com 2,9 mil empresas formais, o Estado atualmente é o responsável por 6,8% da concentração das indústrias têxtil e de confecção do Brasil. 

consultados:
Diário do Nordeste
O Povo
Anuário do Ceará
Memória do Comércio Cearense – de Cláudia Leitão 
Fortaleza Belle Epoque reformas urbanas e controle social 1860-1930, 
de Sebastião Rogério Ponte
fotos Internet