quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Incêndios em Fortaleza Nos Tempos Antigos

 

Na Fortaleza de antigamente, até por volta do início dos anos 30, os incêndios na capital eram combatidos à base dos baldes de água, dependendo também de haver água disponível.  Sem maiores recursos a serem empregados na atividade, geralmente os incêndios se extinguiam por si mesmos, depois de queimar tudo o que tinha para queimar, com perda total dos bens. 


Rua Floriano Peixoto, esquina com a São Paulo
 

Em razão da inexistência de equipamentos de combate ao fogo, diversos estabelecimentos desapareceram, consumidos pelas chamas. Os incêndios ocorriam com maior frequência no centro da cidade, onde se concentrava o maior número de estabelecimentos comerciais. Há registros de vários incêndios naquela região.  


No dia 13 de junho de 1885, um incêndio destruiu a Casa Conrado Cabral, loja que comercializava máquinas, ferragens e acessórios, de propriedade de Raul Conrado Cabral, situada na Rua Major Facundo; 

em 31 de agosto de 1886, um incêndio consumiu a casa de negócios de José Pinto Coelho, na esquina das Ruas Major Facundo e Liberato Barroso; 

Já em 1902 um grande incêndio acabou com o sobrado do coronel José Eustáquio Vieira, na esquina da Rua Barão do Rio Branco com Rua Senador Alencar. O que restou foi demolido em 1907. Hoje nesse endereço está o Palacete Guarani, construído em 1908, por Geminiano Maia, o Barão de Camocim.



À medida que a cidade se expandia, e aumentava o número de comércios e serviços, o alcance e os prejuízos causados pelo fogo sem controle, aumentavam também. Assim, no 20 de junho de 1907, um incêndio consumiu a mercearia de José Carvalho, na esquina das ruas Barão do Rio Branco com Liberato Barroso;


Em 24 de janeiro de 1924, um incêndio de grandes proporções, destruiu o prédio do Ceará Sporting Club, a mercearia de Rios e Companhia, a Sapataria Catete e a Alfaiataria Cyrino, todos localizados na Rua Senador Pompeu.


13 de março de 1925 foi a vez da Fábrica de Redes Iracema, essa situada fora do centro comercial, na Avenida da Universidade, de propriedade de Casimiro de Melo e Benjamin Nogueira. Duas pessoas perderam a vida nesse sinistro.


17 de julho de 1925 a Farmácia Fênix, localizada na Rua Floriano Peixoto, foi destruída por um incêndio;


O mesmo ocorreu no 5 de fevereiro de 1926, na mercearia Cabo Velho, de Frutuoso Afonso de Lima, na Avenida Visconde do Rio Branco, esquina com a Pedro I. 

  

A 24 de agosto de 1926 o fogo destruiu um armazém de algodão, de propriedade de Isaac Telles de Menezes, localizado na Rua Floriano Peixoto.


No dia 17 de novembro de 1927, incendiou-se a Farmácia Globo, na Rua Major Facundo, esquina com a Rua São Paulo.


Em 20 de fevereiro de 1928, o fogo atingiu três estabelecimentos comerciais, localizados na Rua Floriano Peixoto, trecho Praça do Ferreira: as lojas A Capital, de Braga e Irmão; Estiva e Miudezas, de j. Leopoldino da Silva; e Germânia, de José Cabral Ribeiro.


A 13 de outubro de 1929, o prejudicado foi o coronel Plácido de Carvalho, que viu o prédio de sua propriedade, situado na Praça Capistrano de Abreu, onde funcionava a empresa Torrefação Iracema, ser totalmente queimado.


Outro incêndio de grandes proporções, que causou prejuízos incalculáveis, foi o que ocorreu numa madrugada de setembro de 1929, e teve início no Hotel Avenida, prédio de três andares localizado na esquina das ruas Barão do Rio Branco com Guilherme Rocha. O fogo irrompeu a partir do térreo, e rapidamente tomou conta de todo o prédio.


Era por volta de 1 hora da madrugada, todos dormiam e o proprietário, um certo “Seu” Abílio, saiu batendo de porta em porta, acordando os hóspedes, alertando-os para que abandonassem o local rapidamente. Além do Hotel Avenida, o incêndio consumiu o Café Poty, que ficava bem ao lado, a Casa Primor, A Fascinadora, a Alfaiataria Job, e a Relojoaria Cancão, deixando ainda grandes prejuízos na Casa Zenith e na Samaritana. Não houve vítimas por conta da pronta intervenção do proprietário, mas os hóspedes perderam tudo, até as roupas. Hoje no local está a loja Esmeralda.


Hotel Avenida, antes e depois


Incêndios devastadores, como o do Hotel Avenida, convenceram de vez as autoridades da necessidade da criação de uma corporação pública, destinada ao combate de incêndios na cidade. Assim, atendendo a reivindicações de comerciantes e de autoridades, o governador José Moreira da Rocha determinou a criação do pelotão de Bombeiros de Fortaleza, em 8 de gosto de 1925, subordinado ao Regimento Policial do Ceará. Desaparelhado e sem autonomia, o pelotão de bombeiros tinha uma atuação discreta e ineficiente.


No dia 28 de dezembro de 1931, um grande incêndio consumiu a Casa Maranguape, de Agapito Sales e a Casa Simpatia, de Elias Áfora, ambas localizadas na Rua Major Facundo, Praça do Ferreira.


A 3 de janeiro de 1932, outro incêndio que atingiu a loja Para Todos de Vicente Alves Monteiro e o Foto Sales, de Tertuliano Sales, na Praça do Ferreira.


Em 20 de janeiro de 1933, também em estabelecimentos localizados na Praça do Ferreira um incêndio consumiu o Café Art-Nouveau, e o Restaurante Chic, e causou danos a Casa Mário Campos, A Gávea, a Casa Parente, a Sorveteria Nice e ao restaurante A Gruta. 

   

quartel do Corpo de Bombeiros

Em 1º de janeiro de 1934, a corporação começou a funcionar de fato, sob o nome de Corpo de Bombeiros de Segurança Pública do Estado. Tendo como comandante o primeiro-tenente Francisco das Chagas Nogueira Caminha e com um efetivo de 30 homens, advindos do Corpo de Segurança Pública (hoje Polícia Militar do Ceará) e da extinta Guarda Civil. O prédio que viria a abrigar o quartel do Pelotão de Bombeiros foi inaugurado no dia 7 de setembro de 1934, na então Praça Fernandes Vieira, atual Praça Gustavo Barroso, no bairro Jacarecanga.   

  

Café Java


Quando havia qualquer incêndio na cidade, Mané Coco, o folclórico proprietário do Café Java, localizado na Praça do Ferreira, era chamado, com urgência, para apagar os incêndios, e aparecia sempre sozinho, munido unicamente de dois baldes de madeira e uma machadinha. Desse modo, Mané Coco, comerciante, admirador das letras e das artes, acumulava também as funções de bombeiro.


Fontes:

Cronologia Ilustrada de Fortaleza: roteiro para um turismo histórico e cultural/ Miguel Ângelo de Azevedo(Nirez)-Fortaleza, Banco do Nordeste, 2001

Um Certo Contato com a Lua, depoimento de Antônio Girão Barroso em Roteiro Sentimental de Fortaleza, Coordenação de Simone de Souza e Sebastião Rogério Ponte. Fortaleza: UFC-NUDOC/SECULT-CE, 1996.

Coisas que o Tempo Levou: crônicas históricas da Fortaleza antiga/Raimundo de Menezes: introdução, Sebastião Rogério Ponte – Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2000.  

https://www.bombeiros.ce.gov.br/institucional/

fotos do Arquivo Nirez, Pinterest e postais antigos

     

sábado, 4 de dezembro de 2021

Irapuan Lima, O Chacrinha do Ceará, Rei do Carnaval e da Televisão Cearense

 


Para início de conversa, já que o assunto é o passado da TV, necessário em primeiro lugar, esclarecer quem é o Chacrinha original, o cidadão Abelardo Barbosa, o “velho guerreiro”, o apresentador escrachado que inventou as chacretes, oferecia (e jogava) bacalhau na e para a plateia, mandava um alô para a Teresinha e comandava a massa buzinando os calouros e lançando cantores que se tornaram ídolos nacionais. Chacrinha apresentava seu programa semanalmente, passou por todas as emissoras de TV existentes (uma por vez), entre o final da década de 50 até 1988, quando apresentou seu último programa. Chacrinha foi referência na TV e inspirou diversos apresentadores que seguiram sua linha de apresentação. Um desses artistas, era o Irapuan Lima.




O programa do Irapuan Lima, apresentado nas tardes de sábado, era muito mais modesto, tanto em termos de atrações, quanto ao montante de recursos empregados. A proposta era também de revelar novos talentos, os famosos calouros e mostrar shows de variedades. Irapuan veio do rádio, dos programas de auditório da Rádio Iracema. Mas foi na televisão que ele alcançou seu maior sucesso e ficou no ar por 17 anos, de 1975 a 1992, passando por três emissoras, TV Ceará, Cidade e Manchete. No palco do programa, um grupo de dançarinas, identificadas como “Irapuetes”e um júri que avaliava os candidatos. Os participantes do show de calouros levavam como prêmio um frango e um pacote de macarrão.




Era daqueles apresentadores que se impunha, “apesar de não ser bonito, de não ser charmoso, de não ter uma voz agradável (daquelas dos velhos locutores de rádio), de se  vestir de modo cafona", dizia o professor Gilmar de Carvalho. Irapuan tinha preferência por programas ao vivo, chegando a ter quatro horas e meia de duração; não seguia roteiros, tinha apenas um guia que lhe dava muita liberdade para improvisos. Ele mesmo era o produtor do programa, quem criava os quadros e decidia como tudo ia acontecer.


Versátil como era, Irapuan Lima, antes de se popularizar como apresentador de televisão, foi o Rei Momo do Carnaval Cearense nos anos 1959, 1960, 1961. Desistiu depois de ter presenciado (e quase participado) de um grave incidente ocorrido na segunda feira gorda, nas dependências do Country Clube, agremiação fundada por ingleses, localizada na Aldeota. Na segunda feira todos os clubes elegantes suspendiam seus respectivos bailes de carnaval, só havia o do Country. O clube recebia todos os foliões dos clubes chiques. Era o baile mais animado, mais famoso, o mais prestigiado, e a cidade não falava de outra coisa.




O Rei Momo e sua corte iniciaram a noite visitando os clubes de subúrbio que só paravam na quarta feita de cinzas. No percurso, o Santa Cruz – nas imediações do Cemitério São João Batista, o Ícaro – o clube da Base Aérea no Joaquim Távora, o Marajaique. Quando chegaram no Country Clube já era madrugada e a festa estava parada. Estava em curso uma fiscalização promovida pelo Juizado de Menores, acompanhados de policiais. Queriam que os menores de idade fossem retirados. Como autoridades e diretores não chegaram a um acordo, acabaram se formando dois grupos dentro do grande salão de baile; de um lado, os foliões; do outro, a polícia e os funcionários do juizado.


bloco de carnaval em um dos clubes da cidade

Do nada, alguém teve a ideia de jogar um copo na direção dos policiais. O que se seguiu foi uma chuva de copos, atirados de todos os lados, sobre as cabeças dos policiais, que reagiram com tiros de metralhadora. Para o alto, diga-se de passagem. Mas a correria foi grande. Irapuan Lima, vestido de Rei Momo, com cetro e coroa, não sabe como, conseguiu pular o muro do clube, e caiu na calçada, bem do lado de um carro da Rádio Patrulha. O sargento até que foi amistoso, e aceitou levar o rei Momo até sua casa. Mas, já dentro da viatura, Irapuan raciocinou que estava em um carro de polícia e corria perigo (por causa da confusão no clube). Alegou que ficaria ali mesmo, que estava perto da casa de uma parenta, e acabou indo para casa a pé, sozinho, de madrugada. No dia seguinte, na terça-feira, o Rei não desfilou mais. Mandou colocar uma faixa preta no carro alegórico, e encerrou seu reinado.


Irapuan Lima interrompeu suas atividades na televisão por conta de uma cirurgia na vesícula, que evoluiu para uma pancreatite. Depois disso, ele fez apenas aparições em comerciais na TV e faleceu, em 2002, por conta de uma embolia pulmonar. O programa que Irapuan comandava não era muito diferente dos outros da época, com auditório sempre cheio e apresentadores cativantes. Sua grande audiência decorria de ele se mostrar como uma pessoa comum, com quem o público se identificava. Ele era espontâneo, carismático e muito criativo. 


Fontes: 

A imaginação de uma criança e as lembranças de um vovô contam a história de um “reinado " Disponível emhttp://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/35236/1/1999_art_ilima.pdf

Irapuan Lima: o Chacrinha do Norte disponível emhttp://www.impressoesdigitais2ed.ufc.br/index.php?option=com_content&view=article&id=17

Jornal o Povo

Fotos da Internet