terça-feira, 19 de setembro de 2017

O Legado da Oligarquia comandada pelo Governo Accioly


A partir de 1896, com a posse do Comendador Antônio Pinto Nogueira Accioly na presidência do Ceará, recrudesceram os investimentos na normatização urbano-social de Fortaleza. Guilherme César da Rocha, Intendente de Fortaleza desde 1892, permaneceria no cargo até 1912, sendo a sua a mais longa administração de Fortaleza.
Durante este período, o intendente embelezou a cidade copiando modelos franceses. Sua primeira grande obra foi a conclusão do Mercado de Ferro, em 1897. Fabricado na França por Guillon Pelletier, de Orleans, de acordo com projeto do arquiteto Lefevre. O novo mercado iniciava uma série de melhoramentos na cidade, sob influência da cultura francesa, com seu espírito de progresso e civilização apoiado no senso de solidez e elegância.


Depois do mercado, vieram as remodelações das três principais praças da cidade: a do Ferreira, em 1902, a Marquês de Herval em 1903, e a Caio Prado, em frente à Igreja da Sé, todas inauguradas com grandes festejos populares.

Nestes logradouros foram introduzidos canteiros de flores, avenidas, réplicas de estátuas gregas, vasos importados, chafarizes e largos pavilhões para ocorrência de retretas, patinação e ginástica. A regeneração das praças, portanto, vai muito além do mero aformoseamento: facilitava a circulação e determinava novas regras de convivência e utilização do espaço público, além de estimular a prática de exercícios físicos nos jovens e estudantes, tidos como saudáveis aos costumes e à saúde.

Praça do Ferreira 
Praça José de Alencar
Praça Caio Pado (Praça da Sé)

Atento e vigilante ao embelezamento da cidade, Guilherme Rocha também procurou fazer cumprir o Código de Posturas de 1893, que prescrevia a adoção de uma padronização formal nas platibandas, obrigatórias nas fachadas de frente, bem como nos vãos de portas e janelas externas. Para manter a harmonia do conjunto urbano, tentou impedir as construções que não obedecessem às linhas gerais definidas pelo Código. Com base no artigo 12 do Código, o intendente exigiu que as esquinas fossem cortadas em dois ângulos obtusos, o que provocou reação da oposição.

Outra importante iniciativa desse período, foi a criação da Faculdade Livre de Direito do Ceará, instalada oficialmente em 1° de março de 1903.  O curso passou a funcionar no primeiro andar do prédio da Assembleia Legislativa (atualmente ocupado pelo Museu do Ceará), sendo aclamado primeiro Diretor o Dr. Antônio Pinto Nogueira Accioly, que nessa época, embora não ocupasse o cargo de presidente do Estado, interferia direta e decisivamente em todas as decisões políticas.


No período entre 1900 a 1904, o Estado foi governado por Pedro Borges. A administração Pedro Borges nasceu sob o signo da oligarquia comandada por Accioly. O vínculo político que o mantinha ligado ao Dr. Nogueira Accioly fez de sua administração um elo partidário ligado a corrente que governou o Ceará por longo período, uma continuação da administração de Accioly. Quase nada ficou registrado em termos de realização.

Nogueira Accioly voltou ao posto de presidente, num segundo mandato, em 1904, administrando os conflitos registrados no interior, principalmente com relação às desavenças entre os coronéis. Não se interessou pelos problemas sociais, nem investiu no progresso do Estado, limitando-se aos interesses políticos.

Accioly foi novamente eleito, para um terceiro mandato iniciado em 1908. Nesse mesmo ano foi iniciada a construção do que seria a maior realização do longo governo Accioly: o Teatro José de Alencar. Inaugurado oficialmente no dia 17 de junho de 1910, a casa de espetáculos foi entregue ao público da província pelo Presidente do Estado, com direito a longo discurso proferido por Júlio César da Fonseca, e um concerto pela Banda de Música do Corpo de Segurança do Estado, sob as batutas dos maestros Luis Maris Smido e Henrique Jorge.


O Teatro José de Alencar, raro espécime de arquitetura eclética foi erguido entre dois outros edifícios, uma escola (Escola Normal) e um quartel de polícia (Batalhão de Segurança). Além da sala de espetáculos, em ferro fundido e madeira importada da Europa, compunham o teatro um primeiro prédio que o guardava do contato da praça, e uma caixa de cena em tijolo e madeira, com inovações técnicas até então inusitadas para o teatro local.

Nogueira Accioly e o Intendente Guilherme Rocha encerraram suas carreiras políticas e seus longos mandatos a frente do Estado e da Prefeitura no ano de 1912, quando uma grande revolta popular transformou Fortaleza num campo de batalha. Deposto, o ex-presidente embarcou para o Rio de Janeiro, onde fixou residência, até seu falecimento em 14 de janeiro de 1921.Decorridos 105 anos do fim da Oligarquia comandada por Nogueira Accioly, algumas de suas realizações ainda marcam presença na cidade.  

mercado dos Pinhões e da Aerolândia (foto Fortaleza em Fotos e G1)

O Mercado de Ferro era constituído de dois pavilhões idênticos, com uma “avenida” coberta unindo-os. A partir do início dos anos 30 começou a perder sua função de centro de abastecimento de produtos frescos, e foi desmontado em 1938, na gestão do Dr. Raimundo de Alencar Araripe. Um dos pavilhões foi transferido para a Praça Visconde Pelotas, e é conhecido por “Mercado dos Pinhões”. A outra metade foi montada na Praça São Sebastião, e posteriormente, novamente desmontado e levado para a Aerolândia, às margens da BR-116, onde permanece até hoje. Foi recuperado recentemente e encontra-se em pleno funcionamento.  


a Faculdade de Direito foi federalizada em 9 de abril de 1934, sem nenhum ônus para os cofres da União. Em 12 de maio de 1938, o Curso foi oficialmente reconhecido pelo Governo Federal através do Decreto-Lei Nº 421. Em 8 de dezembro de 1935 foi assentada a pedra fundamental do prédio da Faculdade de Direito, na então Praça de Pelotas, depois Praça da Bandeira, atual Praça Clóvis Beviláqua.  A inauguração ocorreu quase três anos depois, no dia 12 de março de 1938.

portaria do Teatro José de Alencar (foto Fortaleza em Fotos)
Teatro José de Alencar (imagem portal G1 - agência Diário)

O Teatro já foi restaurado diversas vezes desde a sua inauguração em 1910. Jardim do Paisagista Burle Marx, que conta com palco ao ar livre, foi inaugurado em 1975 e reinaugurado em 1991. Com plantas nativas, tem a cara da terra de Iracema: cajueiros, jucás, juazeiros, oitizeiros, palmeiras e pau brasil. Tem a maior cascata verde do Ceará, com mais de 10 metros de altura. É até hoje, um dos mais belos teatros do Brasil.

fotos: Arquivo Nirez e Ah, Fortaleza!


sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Os Clubes de Subúrbios

A elite e a classe média dividiam espaço no recesso dos clubes elegantes da Fortaleza durante  décadas, até por volta dos anos 60/70:  Ideal, Náutico, Iracema, Diários, Maguary, Comercial e Massapeense. Os grandes eventos e os encontros de amigos aconteciam no ambiente distinto e seguro das maiores agremiações.

Ideal Clube 

Fortaleza, porém, não era feita apenas do mundo elegante. Outros segmentos tinham seu espaço próprio e participavam ativamente de animadas reuniões festivas, especialmente nos finais de semana. Em muitos bairros existiam clubes, a maioria pequenos, mas não menos movimentados. Alguns típicos de classe média, outros, de classes menos favorecidas, mas, todos vivendo uma fase de grande efervescência. Eram os chamados "suburbanos", clubes localizados nos bairros, fora do circuito dos clubes elegantes (Aldeota, Meireles, Praia de Iracema).  

O Clube de Regatas, localizado na Barra do Ceará, imediações da foz do Rio Ceará, era o maior deles. Iniciou suas atividades nos anos 60. No lançamento, os proprietários fizeram uma ação de marketing para a venda de ações, com a planta do clube e seus diversos atrativos. Assim, o Regatas tinha associados na Capital e no Interior.

Projetado pelo arquiteto Ivan Bezerra, em modernas instalações, contava com piscina, quadra de tênis, garagem para embarcações, e salão nobre com um imenso lustre de cristal comprado em São Paulo. O Clube de Regatas não foi pensado nem se destinava ao lazer das pessoas mais humildes da região que já começava a se proletarizar. Em sua origem era frequentado por pessoas que vinham de outras regiões. Os sócios do clube que moravam em áreas mais distantes, enfrentavam areal, piçarra e areia frouxa para chegar ao Regatas. 

Clube de Regatas Barra do Ceará
O Clube de Regatas foi palco para shows de artistas de renome nacional, bailes de formatura e festas de confraternização de empresas, empresários ou políticos. Outro atrativo interessante do Regatas eram os bingos com prêmios que iam de automóveis a passagens aéreas passando por eletrodomésticos. O Regatas entrou em declínio já no final da década de 60, quando os clubes sociais começaram a competir com outras formas de lazer.

Os militares de patentes mais baixas, suboficiais e sargentos, frequentavam suas próprias agremiações: o Clube General Sampaio congregava o pessoal do exército. Tinha sede no Benfica, com bar e restaurante organizados, sempre com boa freqüência. Encerrou as atividades em 1964; Os sargentos da Aeronáutica tinham seu ambiente especial no Ícaro, na Avenida Visconde do Rio Branco, bairro de Joaquim Távora, com festas de grande prestígio aos sábados e domingos.

No mesmo bairro Joaquim Távora, bem próximo ao Ícaro, ficava o Suerdieck, que viveu uma fase de grande esplendor, promovendo bailes monumentais, inclusive patrocinando concursos para a escolha da "Miss Suburbana", uma espécie de miss Ceará alternativa.

Ainda na Visconde do Rio Branco já próximo ao centro, estava o 24 de Maio, que aliava sua condição de time de futebol de muita força na Segunda Divisão, a uma intensa atividade social em sua sede, onde às festas costumavam comparecer centenas de jovens.

Clube Santa Cruz na Rua Padre Mororó (google)

Havia o Santa Cruz, que teve como presidente Francisco Dutra, um dos primeiros sócios do Ferroviário e antigo árbitro de futebol da Primeira Divisão do futebol cearense. Apesar da proximidade com o Cemitério São João Batista, promovia grandes bailes de carnaval e festas nos finais de semana, com muitos frequentadores.

Não menos animados eram os bailes do Jabaquara, onde a presença mais notada era a de Valfrido Coelho, o “Pimpolho” ex-jogador de futebol, folião de primeira hora, e um dos criadores do famoso Cordão das Coca-Cola. O Jabaquara teve seus tempos áureos quando mantinha sede na Avenida Carapinima, no Benfica.

Clube Secai, no Pirambu - imagem: Antônio Viana

Também no Benfica ficava o Gentilândia Futebol Clube, onde a freqüência, notadamente a masculina era predominantemente de alunos da Universidade, daí o apelido de dado pela imprensa de time dos acadêmicos.

Localizado no Bairro Nossa Senhora das Graças (grande Pirambu), o SECAI foi fundado em 14 de setembro de 1960 e destacou-se pela atuação na área de esportes, lazer, qualificação profissional, junto aos jovens moradores do bairro. 

Sede do Clube Vila União - (Fortaleza em Fotos)

Na Fortaleza provinciana também havia festas animadas nos salões do Terra e Mar, no Mucuripe, do Rio Branco, no Antônio Bezerra, do Trilho, na Volta da Jurema, no Romeu Martins no Montese, no Vila União, no bairro homônimo, no Tiro e Linha, no Mênfis Club, no Clube Recreativo Aerolândia, no Tiradentes, e em inúmeros outros pequenos e médios clubes suburbanos, que agitavam fins de semana e períodos carnavalescos, hoje, alguns em plena atividade e outros, há muito desaparecidos. 


Fontes:
Sessão das Quatro, cenas e atores de um tempo mais feliz
Blanchard Girão
Do Clube de Regatas Barra do Ceará ao Cuca Che Guevara
David Aragon disponível em 
 <http://www.ujsceara.org.br/2009/08/do-clube-de-regatas-barra-do-ceara-ao.html>