sábado, 31 de março de 2012

Águas de março transbordam no Oeste da Cidade

As águas de março que caem em Fortaleza em 2012, procuram seus leitos, seu solo, suas lagoas, açudes, rios e riachos e encontram asfalto, canais de cimento, lixos, esgotos e uma selva de pedra sem mais verdes e belezas naturais. 

imagem: prefeitura municipal

As consequências disso já podem ser sentidas com a primeira chuva prolongada que aconteceu na cidade dia 27 de março, causando transtorno no transito da Avenida Perimetral a altura do bairro Antônio Bezerra, local onde acontece o mesmo problema ao longo dos anos. Podemos ver também a represa das águas que invadem casas onde já foi leito de uma lagoa entre os bairros Autran Nunes e Antônio Bezerra à altura da Ponte do Pau da Veia.
 Os Meios de comunicação estão mostrando o alto volume d’água no sangradouro do açude da UFC no Campus do Pici invadindo os laboratórios da piscicultura e isso acontece devido os seus afluentes terem sofrido aterramento, virado canais com cimento, construções de casas onde já foi leito de riachos e agora são ruas asfaltadas dos bairros: Parque Universitário, Pan Americano e Bela Vista. 


Há uma situação curiosa também no lado Oeste relacionada com a convivência urbana de dois órgãos federais, UFC – Campus do Pici e CHESF pelo fato de serem um tanto quanto  descompromissados com a questão urbanística da cidade nos espaços que ocupam. Pois, estas duas instituições públicas federais, são responsáveis por alagamentos e aterro de mananciais hídricos, a princípio o linhão da CHESF que contribuiu para o aterramento da Lagoa do Autran Nunes e podemos ver isso nas imagens de televisão (Barra Pesada) onde os postes estavam no centro das águas represadas.  

foto: jangadeiro online

Enquanto isso, na área verde que fica em terreno da UFC – Campus do Pici entre a Av. Mister Hul e a Perimetral está instalada Estação da CHESF que aterrou parte do espaço verde e é também nesse trecho onde as águas do Riacho Alagadiço e o Sangradouro do Açude da Universidade se encontram e ao chegar na av. Perimetral e Rua Rui Monte transborda por cima da pista impedindo o tráfego de veículos e grandes engarrafamentos como fica visível nas matérias da TV Diário. Esse trecho já sofreu muitos aterramentos de particulares sem nenhuma intervenção dos órgãos fiscalizadores, mesmo com denuncias de moradores e matérias de jornais e televisivas.

foto jangadeiro on line
Isso tudo simboliza uma cidade sem planejamento, sem poderes constituídos, onde o público, o privado e o indivíduo determinam “leis” conforme os interesses da propriedade, do capital e da própria. Essa é a cidade em que vereadores, executivo e população cometem os maiores crimes ambientais quando trocam voto por asfalto em becos e ruas causando maior aquecimento e grandes enchentes. 
Mas afirmo que não é por falta de projeto para estes espaços, porque é exatamente neles onde lutamos pela elaboração do Projeto Parque Rachel de Queiroz e desde 1995 está no papel sem nenhum planejamento orçamentário para sua execução, o que impediria os crimes ambientais nas margens e leitos do Riacho Alagadiço e Riacho Cachoeirinha e beneficiaria a população de 21 bairros do lado Oeste da Cidade.  


Leonardo Sampaio: É escritor, poeta e educador popular. Militante do movimento sócio - cultural - ambiental de Fortaleza.

transcrito do site: http://www.parqueracheldequeiroz.org/


As águas de março em Fortaleza não podem ser cantadas em versos  nem são promessas de vida no coração dos moradores, como na bela canção do Tom Jobim. Pelo contrário, trazem prejuízos, desesperos e deixam muitos desabrigados. E o problema não se restringe a Zona Oeste da cidade, sim porque se estivesse restrito a um local poderíamos nos dar ao luxo de ter esperanças.  Mas como podemos ver, toda a cidade foi afetada. E vem sendo afetada todas as vezes que cai um toró. Cadê as providências, cadê os consertos, cadê as autoridades que ganham fortunas para administrar a cidade?
... É pau, é pedra, é o fim do caminho.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Os Nomes Religiosos e Santos das Ruas


A Atual Praça dos Mártires (Passeio Público) já foi chamado de Largo da Misericórdia (foto Fátima Garcia 

A tradicional religiosidade da gente cearense motivou, desde tempos remotos, bairros, avenidas, praças e ruas com nomes de santos ou de algo relacionado à religião, às vezes, leves referências. Exemplos: o antigo bairro Alagadiço mudou para São Gerardo; o popular Pirambu, embora muita gente o chame assim, oficialmente é Nossa Senhora das Graças. Piedade, sempre foi assim, da mesma forma que o bairro de Fátima. Santa Terezinha situa-se no antigo Arraial Moura Brasil. E têm os bairros São João do Tauape, Pio XII e João XXIII. Monsenhor Quinderé, figura das mais simpáticas do mundo religioso de nossa terra, tem seu nome perpetuado em rua da Aldeota.

Avenida Monsenhor Tabosa, a antiga Rua do Seminário (arquivo Nirez) 
A Praça Dom Pedro II, popularmente chamada Praça da Sé, era, no passado, o Largo da Matriz; a Praça dos Mártires, mais conhecida como Passeio Público, era o Largo da Misericórdia. E têm as praças do Carmo, São Sebastião e Cristo Redentor. Onde foi o Boulevard da Conceição hoje é a Avenida Dom Manuel; a Avenida Duque de Caxias era o Boulevard do Livramento. A antiga Rua do Seminário agora é Avenida Monsenhor Tabosa. E têm as avenidas Monsenhor Salazar, 13 de Maio e Padre Ibiapina.

Antiga Rua Santa Isabel (arquivo Nirez)  
A atual Rua Pedro Pereira era Travessa de São Bernardo, a Rua Meton de Alencar era Travessa de São Sebastião. A Rua São José era Beco das Almas, a Rua Conde D´Eu era Rua da Matriz, a Rua 24 de Maio era Rua do Patrocínio, a Rua Tereza Cristina era Rua Santa Tereza, a Rua Princesa Isabel era Santa Isabel, a Rua Rodrigues Júnior era Rua da Glória, a Rua Dr. João Moreira era Travessa da Misericórdia, e a Rua Conselheiro Tristão era a antiga Rua da Cruz. E têm as ruas Santo Antônio, São Francisco, São José, Nossa Senhora dos Remédios, Nossa Senhora de Lourdes.

 Rua Castro e Silva, que um dia foi a Rua da Matriz (arquivo Nirez) 

Padres que foram homenageados nominando ruas de Fortaleza: Guerra, Valdevino, Anchieta, Mororó, Roma, Frota, Antonino, Quinderé, Francisco Pinto, Luiz Figueiras, Cícero, Monsenhor Catão, Cônego Rosa, Frei Mansueto. No passado, a atual Rua Pereira Filgueiras era Rua do Paço, alusão ao Palácio do Bispo. A antiga Travessa das Belas é a atual Rua São Paulo. 

Rua Padre Mororó (Arquivo Nirez) 

E tem a Rua Assunção, homenagem a padroeira de nossa Capital. A Rua Rufino de Alencar, aquela via estreita que liga a Praça da Sé à Praça Cristo Redentor, era o Corredor do Bispo.

fontes:
Marciano Lopes
João Nogueira

segunda-feira, 26 de março de 2012

Praça Castro Carrera (Praça da Estação)


Praça da Estação em foto de 1900, dia da inauguração da estátua em homenagem ao General Sampaio. Ao fundo, Fábrica de Sabão Proença (arquivo Nirez)

No dia 2 de agosto de 1829, o imperador Dom Pedro I, então com 31 anos,  após ficar viúvo de  sua primeira esposa, a arquiduquesa da  Áustria,  Maria Leopoldina, casa-se com a princesa Amélia de Leuchtemberg, de 17 anos. No ano seguinte, o espaço entre as ruas General Sampaio, 24 de Maio, Dr. João Moreira e Castro e Silva, recebe o nome de Campo da Amélia, em homenagem à nova imperatriz.

Sede da Estação Ferroviária (arquivo Nirez)

Naquele local aconteciam os treinamentos das tropas imperiais e das milícias provincianas. O espaço aberto também era usado pelos fortalezenses para a prática esportiva de cavalhadas e torneios hípicos da argolinha, uma verdadeira febre, na época.
Dos dois lados do Campo da Amélia estavam situados os antigos cemitérios de Fortaleza, do lado Oeste ficava o Cemitério de São Casemiro, utilizado pelos católicos, e do lado Leste o cemitério dos protestantes europeus e anglicanos.


No ano de 1871 teve início a construção da Estação Ferroviária, decisão tomada pelo governo no ano anterior. O empreendimento chamava-se Estrada de Ferro de Baturité. No mesmo ano  chega a primeira locomotiva da estrada de ferro, batizada de Fortaleza. Em 1873 acontece a inauguração da Estação Central. Sete anos mais tarde é construído o Chalé da Diretoria e Oficinas.
No ano de 1882 o Campo da Amélia passa a chamar-se oficialmente de Praça Senador Carreira. A denominação vai perdurar oito anos e com o advento da proclamação da república passa a chamar-se Praça da Via Férrea.
Hoje a Praça Castro Carreira, nome oficializado em 1932, continua a ser chamada pelos fortalezenses de Praça da Estação. Ela tem 11.517 metros quadrados e funciona como um terminal de ônibus de linhas regulares para a zona metropolitana de Fortaleza. 
A Praça da Estação não dispõe de atrativos visuais. O velho casario contíguo à estação, que se espalhava pela Rua Castro e Silva, foi demolido para dar espaço ao alargamento da rua como saída do terminal de ônibus que funciona na praça.

Estátua do General Sampaio, que hoje se encontra na 10a. região Militar (arquivo Nirez) 

No dia 24 de maio de 1900, foi inaugurada no centro da praça a estátua do General Sampaio, assentada sobre  um pedestal de mármore. Em 1966 a estátua foi retirada e levada para a Avenida Bezerra de Menezes sem o pedestal que foi destruído, e juntado a ela os restos mortais do homenageado.   Em 1996, por iniciativa do Instituto do Ceará, a estátua foi transferida para a Avenida Alberto Nepomuceno, em frente da 10ª Região Militar.


Aspecto atual da Praça da Estação (fotos Fátima Garcia)

Além da estação ferroviária, do chalé da diretoria e dos antigos armazéns, a Praça da Estação abriga também o prédio da antiga cadeia. Atualmente a praça abriga os ambulantes que ocupavam as Praças José de Alencar e Capistrano de Abreu (Praça da Lagoinha), segundo dizem, em caráter provisório. 

fonte:
Cronologia Ilustrada de Fortaleza
Jornal O Povo 

sábado, 24 de março de 2012

O Plano Nestor de Figueiredo

vista aérea de Fortaleza em 1930 (arquivo Nirez)

Desde a planta urbanística de Adolf Herbster, de 1875, Fortaleza não teve outro projeto global para controlar sua expansão na República velha. Os prefeitos faziam suas obras sem obedecer a nenhum projeto sistematizado, projetos isolados, sem considerar a cidade como um todo.  
Diante do problema, em 1931, o então prefeito Tibúrcio Cavalcante (1931-1933) mandou levantar uma planta da cidade e no ano seguinte, elaborou um novo Código de Posturas da Capital – o anterior era de 1911 – cujas normas ratificavam a preocupação de se criar uma cidade aformoseada, disciplinada e progressista, onde todos pudessem viver bem.


Avenida Beira Mar, então Rua da Frente,  na década de 1930 (arquivo Nirez)  
A mesma via nos anos 1960 (arquivo Nirez) 
...e nos dias atuais (foto Fátima Garcia)

No Código, o município foi dividido em quatro zonas (central, urbana, suburbana e rural) e havia regras sobre a construção de imóveis.  As casas deveriam ser isoladas uma das outras, para garantir a saúde pública, havia normas sobre higiene, e multas para quem se comportassede maneira obscena, em público ou dentro de casa.


As ruas e construções mais antigas seguiam a planta urbanística de Adolfo Herbster . Rua Guilherme Rocha (foto acervo particular)

O prefeito seguinte, o historiador Raimundo Girão (1933-1934), se propôs a fazer um plano de remodelação da cidade. Em 1933 contratou o engenheiro paraibano Nestor de Figueiredo, urbanista com larga experiência, com trabalhos nas cidades de Recife e João Pessoa. 
O Plano de Remodelação e Extensão de Fortaleza, iniciado por Figueiredo era baseado no que havia de mais elaborado em termos urbanísticos e previa o zoneamento urbano, ou seja, determinar as áreas para localizar as diferentes atividades da cidade – residências, comércio, indústria, educação etc;  o aumento da população, a solução dos problemas de circulação de pedestres e veículos.
Se implantado teria começado a resolver há quase oitenta anos, alguns dos problemas de circulação que dia a dia se agravam em Fortaleza. O Conselho Consultivo do Estado do Ceará, no entanto, posicionou-se contra o projeto, sob a alegação de que Fortaleza tinha outras prioridades – no caso foi dito que a cidade precisava urgentemente, de um instituto para cuidar de menores abandonados e delinquentes. 


Avenida do Imperador, uma das vias de trânsito mais caótico da cidade (foto Fátima Garcia)

Discutiu-se ainda a necessidade do projeto, já que a capital estava muito longe de se equiparar ao tráfego de cidades com milhões de habitantes. Travou-se a seguir uma verdadeira guerra de bastidores entre o prefeito Raimundo Girão e os conselheiros. Na verdade havia interesses econômicos privados envolvidos na recusa ao Plano de Nestor de Figueiredo.
Apesar disso, e em virtude das relações cordiais entre Raimundo Girão e o interventor Carneiro de Mendonça, os estudos para elaboração do plano foram iniciadas, mas não concluídos. Em 1934 Girão deixou a prefeitura e seus sucessores, a exemplo de Álvaro Weine (1935-1936), não se preocuparam em dar continuidade ao projeto.
Weine rescindiu o contrato com Nestor de Figueiredo e deixou de lado até mesmo as ideias ali elaboradas.


Por causa da falta de planos de urbanização, a cidade cresceu de forma desordenada. Ruas sem alinhamento, calçadas e traçado irregulares. (Foto Fátima Garcia, numa rua da Parangaba)

De acordo com o historiador Liberal de Castro, é provável que nenhuma decisão municipal tenha proporcionado efeito mais danoso sobre Fortaleza do que a rescisão do contrato de Figueiredo, não apenas pelo fato em si, cuja aplicação teria começado a resolver, há muito tempo, alguns dos sérios problemas que afligem a cidade atual, mas também pelo momento histórico, caracterizado pela total reformulação política, social e até econômica do País, portanto, inteiramente favorável a uma intervenção ordenadora da cidade.
A falta de vontade política, o desinteresse das camadas dominantes e das autoridades, as oposições e pressões econômicas vindas de vários setores, ocorridas nesse episódio de recusa ao Plano de Nestor de Figueiredo, se repetiriam em outros momentos da história da cidade no século XX, contribuindo para o agravamento de problemas que ainda hoje se fazem presentes.
            
extraído do livro 
Fortaleza, uma breve história de Aírton de Farias e Artur Bruno

sexta-feira, 23 de março de 2012

Igreja do Pequeno Grande


 Conjunto arquitetônico formado pela Igreja do Pequeno Grande e o Colégio da Imaculada Conceição, construído pelas freiras francesas da Ordem de São Vicente de Paulo (arquivo Nirez)

A Igreja do Pequeno Grande é um dos mais belos templos católicos de Fortaleza. Destaca-se pelas suas linhas diferentes, de estilo neogótico, denunciador de forte influência europeia em terras cearenses.
Na verdade a Igreja cujo nome “Pequeno Grande” foi buscado na Boêmia, onde existe uma imagem milagrosa do Menino Jesus, foi construída pelas irmãs francesas que aportaram em Fortaleza na segunda metade do século passado. Vinham, na condição de Filhas de Caridade de São Vicente de Paulo, a convite do primeiro bispo cearense, Dom Antônio Luís dos Santos, para aqui cuidarem de um colégio de órfãs a ser fundado, que mais tarde se transformou no Colégio da Imaculada Conceição.

Assim a história da Igreja está intimamente ligada à história do Colégio da Imaculada Conceição.  A pedra fundamental da nova igreja foi lançada em 1898, pelo padre Chevalier, reitor do Seminário e capelão do Colégio da Imaculada. 
As obras, mal iniciadas, sofreram paralização no ano seguinte, sendo retomadas em 1898 até a sua conclusão em 1903, quando se verificou a benção do templo. Para que o templo ficasse concluído, a Irmã Chambeaudrie doou à igreja uma herança de família. Por sua vez, os membros de diversas associações – Filhas de Maria, Senhoras de Caridade e as próprias freiras se dedicaram a missão de angariar recursos para a obra.  


Vídeo do interior e dos arredores da Igreja do Pequeno Grande, realizado pela Sensor. Aproveitem o passeio. 

texto sobre a Igreja do Pequeno Grande extraído do livro
As pouco lembradas igrejas de Fortaleza, de Eduardo Fontes 

quinta-feira, 22 de março de 2012

Fortaleza, década de 1930 e a busca (ainda) de Modernidade

No início dos anos 1930, com mais de 100 mil habitantes, os problemas de  Fortaleza e  suas contradições só se agravaram. Os discursos dos governantes continuavam enfatizando a necessidade de modernizar e embelezar a cidade – sonhava-se com uma modernidade que nunca foi alcançada. Na verdade o discurso da modernidade visava dotar a cidade de equipamentos que beneficiassem os setores econômicos mais influentes, disciplinasse a expansão urbana e controlasse a crescente população pobre e a tensão social decorrente desse crescimento.

Fortaleza antiga: jardins e coreto (arquivo Nirez)
Fortaleza "moderna": Coluna da Hora no lugar do coreto (arquivo Nirez)

Praças e jardins foram construídos, enquanto outros eram remodelados. Na Praça do Ferreira, o coreto foi demolido e substituído pela Coluna da Hora, em 1933, monumento bem mais adequado para uma cidade que vivia em ritmo cada vez mais intenso, veloz, e moderno. Ruas foram ampliadas a exemplo da Liberato Barroso, ou interligadas, como a Avenida Visconde do Rio Branco à Sena Madureira, com o objetivo de facilitar o tráfego urbano. 
 Rua 25 de março (arquivo Nirez)

Ainda visando melhorar o trânsito de veículos, as ruas centrais foram pavimentadas com paralelepípedos ou concreto (as mais  movimentadas), e criada a Inspetoria de tráfego. Em 1934 a antiga e deficiente iluminação pública a gás, foi trocada pela iluminação elétrica, em mais um feito de modernidade exaltado pelos jornais da época.

Excelsior Hotel, ainda em construção (foto genealogy) 

A cidade entrou na era dos arranha-céus, quebrando sua horizontalidade com a inauguração do Excelsior Hotel, em 1931, na Praça do Ferreira, suntuoso prédio com impressionantes sete andares para a época, tido como o melhor hotel do Norte e Nordeste.

No discurso da modernidade, a construção de novos edificios, como o da Faculdade de Direito (Arquivo Nirez)
e o prédio da Telefônica (ainda em construção) foto do Arquivo Nirez

Também foram erguidos prédios suntuosos, a exemplo do novo Mercado Municipal, do prédio da Faculdade de Direito e da Empresa telefônica. No final da década de 1930 foram iniciadas as obras do Porto do Mucuripe, apontado como fundamental para a cidade sair do atraso. 

fonte:
Fortaleza, uma breve história, de Aírton de Farias e Artur Bruno

segunda-feira, 19 de março de 2012

Fortaleza de Outrora Parte 2/2 - Final

Rescaldo – O que sobrou da Guerra do Progresso (por Marciano Lopes)
continuação ...


Cadê a querida PRE-9 e a sua sobriedade de grande estação de rádio, com seus excelentes locutores, seu “regional”, seu radio teatro e suas novelas tão palpitantes? Cadê Tânia Maria, Vera Lúcia, Terezinha Holanda, as irmãs Sousa Moura? O que foi feito de Tereza Moura e do Magalhães que selecionavam os discos de cera para as programações musicais? Parece que tudo virou silêncio.


Discoteca da Ceará Rádio Clube, no Edifício Diogo. Milhares de discos de cera, cuidadosamente guardados em estantes envidraçadas. Parecia um santuário, sob os cuidados de Gerardo Barbosa e Tereza Moura (foto Marciano Lopes)
  
Não se escuta mais o vozeirão de Cabral de Araújo, nem a sonoríssima voz de Manuelito Eduardo, nem a notícia na voz de Aderson Brás, nem a voz pautada de Mozart Marinho. Por que João Ramos não voltará a “amar” Laura Santos? Talvez porque José Limaverde passou a fazer parte das “Coisas que o Tempo Levou”...
Por que retiraram das portas das casas as tabuletas anunciando que ali se faziam “ponto a jour”, “passa-se ponto cairel”, “cobrem-se botões” porque as roupinhas das crianças não tem mais “ponto picot”?

 Irmas vocalistas Cleide e Adamir Sousa Moura, do cast da Ceará Rádio Clube (acervo Marciano Lopes) 
                                                                                                                                             
Por que as famílias não mais se visitam, como antigamente faziam? E era tão bonito, tão humano, tão família. Eram aquelas visitas de tantas saudades, os pontos de união entre as pessoas. Já se sabia: em determinado dia, melhor dizendo, em determinada noite da semana, era a vez de fulano e sua família. E todos eram bem recebidos, as mulheres formavam um grupo onde as conversas giravam sobre as amenidades do dia a dia no lar, os estudos das crianças, a moda, algum disse-que-disse. Os homens formavam outro grupo, falavam de política, da Constituição, do governo Vargas, da guerra e suas sequelas. As crianças brincavam, corriam, cantavam, formavam rodas de ciranda nas calçadas, as meninas mostravam as novas bonecas, “arrumavam a casa para receber as visitas”. Depois, todos em volta da mesa comiam bolos e sequilhos, tomavam café ou licores. 
A televisão e o crescimento da cidade aumentaram as distâncias e separaram as pessoas. Ninguém mais se visita, até mesmo entre familiares o isolamento aconteceu. Todos vivem suas próprias vidas. Cada casa é um gueto.
Por que não mais se escutam os “cantos” dos vendedores de ruas? Por que os supermercados acabaram com as mercearias e bodegas, pontos de aproximação das donas-de-casa, de aconchego entre as pessoas, de momentos de humor entre os merceeiros e os fregueses? Cadê o sorveteiro, o aguadeiro, o padeiro, o leiteiro, o gazeteiro, o figueiro, o verdureiro? Os pregões silenciaram e deixaram com seu silêncio uma lacuna e uma grande nostalgia. No balanço final, a gente constata entristecido que, pouco restou.
de todas as farmácias citadas, a única que permanece no centro é a Oswaldo Cruz (foto Fátima Garcia)

Das tantas farmácias, só ficaram a Pharmácia e Drogaria Oswaldo Cruz, a Farmácia Theodorico, a mais antiga de Fortaleza, a Farmácia Motta, a Farmácia Arthur de Carvalho, na esquina da Avenida Visconde de Cauípe com a Rua Padre Francisco Pinto, no Benfica, e a Farmácia e Drogaria Pasteur, esta última, ocupando prédio pequeno e sem “it”, bem diferente da bonita sede da Praça do Ferreira. 
Na Rua Liberato Barroso, entre as Ruas Barão do Rio Branco e Floriano Peixoto, pululavam os armarinhos. Restaram apenas “A Samaritana”, “A Rendeira” e a “Casa Osmar”.
Das tantas garapeiras do centro, só ficou a Leão do Sul e o Engenho Coração de Jesus. Das sapatarias, só restaram a “Sapataria Belém”, agora compreendendo uma cadeia de bonitas lojas. “Esquisita”, também com cadeia de lojas, inclusive em outras capitais do Nordeste; “Casa Pio”, também dinamizada com diversas lojas muito bem instaladas.


de todas as garapeiras do centro, a única que continua funcionando é a Leão do Sul (foto Fátima Garcia)

Das lojas de fazendas, só ficou a Casa Blanca, que cresceu e instalou outras unidades, construiu moderno shopping center e explora outras atividades comerciais. Das grandes lojas só a Casa Parente sobreviveu, com sua sede melhorada e ampliada, ocupando todo o edifício Parente e instalando lojas em shoppings. De tantas camisarias e lojas de moda masculina, apenas a Casa Bicho e a Casa Americana restaram...


A casa Bicho e a casa Americana ainda estão do centro. A Casa Parente só existe em shoppings (foto da portaria do antigo Excelsior Hotel por Fátima Garcia)

Dos estabelecimentos fotográficos, só restou a sofisticada Aba-Film, que a gente se orgulhava de ser o maior estabelecimento fotográfico da América do sul. Também se desenvolveu e conta várias unidades em Fortaleza e outras cidades.

foto do arquivo Nirez
A Aba Film, o estabelecimento fotográfico que possuía filiais em várias cidades, também não resistiu e encerrou suas atividades. (foto de Fátima Garcia) 

De tantas alfaiatarias que tinham seu foco na Rua Guilherme Rocha, entre as Ruas Barão do Rio Branco e General Sampaio, só restou a Casa Belo Horizonte, que sempre manteve um aspecto diferente. De sua antiga sede, na Rua Floriano Peixoto, mudou-se para a Rua Major Facundo, com seus mostruários de tecidos finos e s o seu serviço impecável.
Das vidraçarias e casas de molduras, só tem agora, O Epitácio e a Moldura Elegante. Das tantas livrarias, pontos de intelectuais da cidade, nada restou.
Destruíram quase tudo. Nos espaços que ficaram vazios, uma grande e imorredoura saudade. Nos espaços ocupados pela irreverência, pelo desamor, pelo descaso, pelo atentado à estética, a minha revolta pelo desrespeito àqueles que, décadas atrás, tiveram visão para querer fazer de Fortaleza, uma cidade aristocrática e bela.
       
fontes:
Royal Briar - a Fortaleza dos anos 40, de Marciano Lopes
Cronologia lustrada de Fortaleza, de Miguel Ângelo de Azevedo
Wikipédia

sexta-feira, 16 de março de 2012

Fortaleza de Outrora Parte 1/2

O texto que se segue é de uma crônica do memorialista Marciano Lopes, na qual o autor compara a cidade que ele conheceu na década de 1940, com a Fortaleza em outra época – provavelmente meados da década de 1990, ano da publicação da 4a. edição (revisada e ampliada) do livro Royal Briar.  Aproveitemos essa viagem no tempo, iniciada pelo autor, para fazer uma pequena atualização (não tão rica, nem tão detalhista quanto a de Marciano Lopes), com a cidade atual.


Praça do Ferreira após a reforma da década de 1960 (foto de Nelson Bezerra)

Rescaldo – O que sobrou da Guerra do Progresso (por Marciano Lopes)

Sai pelas noites de Fortaleza para conferir o que restou da longa e sofrida guerra do progresso e fiquei sofrido com o  resultado do rescaldo: do grande cataclisma, pouco restou. Casas derrubadas, fachadas mutiladas ou adulteradas, palacetes transformados em terrenos baldios ou estacionamentos. Por quê? A gente se pergunta. E a resposta só pode ser uma: as pessoas sem cultura sentem vergonha de tudo o que é antigo, com o que tem ranços de tempo. Certamente, medo pela alusão à própria idade.
Quem se der ao exercício de andar no espaço compreendido entre o bairro de Jacarecanga e as proximidades da Praça do Colégio Militar e da Rua Domingos Olímpio e a orla marítima, constatará que não há exagero no que afirmo. 


Rua no bairro Jacarecanga (arquivo Nirez)
Rua no bairro Jacarecanga  (foto do arquivo do blog)

Quase todo o centro de Fortaleza foi destruído criminosamente. Nesse retângulo geográfico de nossa cidade tão amada, tudo foi desfigurado, descaracterizado e contam-se nos dedos das mãos os prédios que sobraram, assim mesmo com interferências modernosas que ferem a dignidade dos mesmos.  
Vi em outras cidades por onde andei prédios antigos, restaurados e ocupados por lojas de modas, bancos e agências de turismo, sem a necessidade de camuflar fachadas. Ao contrário, o rebuscado formado por platibandas, cornijas e outros relevos, dando dignidade ao estabelecimento comercial. 


Avenida Barão de Studart em 1938 (Arquivo Nirez) 
avenida Barão de Studart atual (arquivo do Blog) 

Aqui em Fortaleza, caso raro, todas as firmas que ocuparam construções das primeiras décadas deste século, precisaram esconder as belas fachadas com tapumes infames, feitos de materiais vagabundos e facilmente perecíveis, fazendo contrastes berrantes com a beleza dos prédios. Quem quiser, basta ir à Manaus, para aprender como ali se sabe dar nobreza a uma loja, deixando fachadas antigas no original, tão diferente daqui. Prova incontestável da incultura da nossa gente.
Ando pelas noites de Fortaleza e constato com profunda tristeza, o ocaso do romantismo de nossa outrora encantadora cidade. E faço a mim mesmo a pergunta: cadê as praças antigamente tão ajardinadas, tão arborizadas, tão limpas, tão bucólicas? Relembro a Praça do Coração de Jesus, agora transformada em favela imunda e fétida e sinto vergonha, sinto vontade de chorar, sinto vontade de ir embora para bem longe, quando recordo na minha juventude, a placidez do pequeno espelho d’água que emergia do relvado daquela praça tão linda. 


Rua Floriano Peixoto (arquivo Nirez) 
Rua Floriano Peixoto, trecho Praça do Ferreira (arquivo do blog)

Cadê as ruas calmas, pavimentadas a paralelepípedos e a concreto, os fícus-benjamins podados com arte e esmero, os poucos carros passando sem pressa? Cadê os cafés das esquinas, os bondes barulhentos como a despertar a cidade da sua eterna modorra?
O que fizeram com o Palace Hotel, o Astória Hotel, o Fortaleza Hotel, o Internacional Hotel? Cadê a aconchegante Pensão Sobral, de Dona Mimosa Sá? Só restou o tradicional Excelsior, seriamente mutilado, com uma decoração duvidosa e o seu outrora afamado terraço com uma cobertura em estrutura de metal que fere a sua nobreza.


Grupo Escolar Juvenal Galeno, que já foi chamado Fernandes Vieira, teve sua construção iniciada em 1923, construído pelo arquiteto carioca Armando Oliveira (arquivo Nirez).  

O estabelecimento de ensino ainda funciona no mesmo local, com algumas alterações na fachada. Abriga a escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Juvenal Galeno (foto do arquivo do blog)

O que aconteceu aos saudosos grupos escolares e as suas mestras respeitáveis? Cadê o Grupo Escolar José de Alencar, ao lado do Teatro;  O Grupo Escolar Rodolfo Teófilo, onde agora funciona a Faculdade de Economia; o Grupo Escolar Visconde do Rio Branco, perto da antiga Estação dos Bondes; o Grupo Escolar Presidente Roosevelt, na Avenida Bezerra de Menezes; o Grupo Escolar Juvenal Galeno, com seus vitrais na fachada de influência normanda, na Praça do Liceu; cadê o Grupo Escolar Clóvis Beviláqua, na esquina das Avenidas Dom Manuel e Santos Dumont? 


Grupo Escolar do Benfica, inaugurado em 2 de janeiro de 1923, na Avenida Visconde Cauipe (atual Avenida da Universidade), depois passou a ser denominado Grupo Escolar Rodolfo Téofilo. Em 1956 o estabelecimento de ensino mudou-se para uma rua próxima, e o prédio passou a abrigar o Museu Antropológico (arquivo Nirez)

Hoje o edifício abriga a FEAAC - Faculdade de Economia, Administração, Atuária, Contabilidade e Secretariado Executivo, da Universidade Federal do Ceará. Apesar de algumas alterações na fachada, a edificação continua imponente. (foto panorâmio) 

Morreram os velhos grupos escolares quando morreu o respeito aos mestres, quando as sábias professoras desapareceram, quando os “professores” tem a mesma idade dos alunos e passou a imperar a promiscuidade.
O que fizeram aos velhos cinemas que tanto marcaram a minha juventude? Cadê o Moderno e os seus castelos emaranhados emoldurando a tela? E o Majestic, com seus seriados e “geral” tão popular e cheia de folclore? Cadê o Rex com suas manhãs de domingo e a criançada trocando figurinhas numa alegria, numa algazarra sem fim? Cadê o centro, ah, Cine Centro de tantas saudades, talvez um dos elos principais de ligação com a minha infância. Que fizeram com o Cine Luz, o Ventura, o Nazaré, o Familiar, o Santos Dumont, o Mucuripe, o Joaquim Távora, o América, o São José, o Excelsior, o Messejana? Só restou o Diogo, sujo, maltratado, maltrapilho de chinelas japonesas rotas e bermudas encardidas. O Diogo, tão sóbrio de paletó e sapatos engraxados... 


Portaria do Cine Diogo (arquivo Nirez)
O Cine Diogo encerrou suas atividades em 1997, hoje na parte do edifício que abrigou o cinema funciona um shopping center (foto arquivo do blog)

E o que fizeram aos seriados? Para onde migraram os heróis de todos os que foram adolescentes na década de quarenta? Onde está a Nioka, o Capitão Marvel, o Super-Homem? Nem o último dos Moicanos restou...

continua....