segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Terço do Cruzeiro

O Cruzeiro da Sé era considerado um dos mais belos do País

Uma velha e tradicional devoção do povo de Fortaleza era observada nas noites de segunda-feira, quando populares acendiam velas votivas e rezavam em silêncio, em frente ao Cruzeiro da Sé. O costume provavelmente começou em 1847, quando Frei Serafim ergueu o Cruzeiro e o rodeou de cancelas de ferro. Inicialmente era muito frequentado, notando-se inclusive a presença de muitas pessoas importantes da cidade, que se juntavam aos populares na oração.
Ainda depois de 1867 os arredores da Sé não eram iluminados ou frequentados: o lugar durante a noite, tinha qualquer coisa de soturno. Os instrumentos da paixão, as frases latinas inscritas no pedestal - Et cancelleis ferreis circumscripsit - a lembrança de Frei Serafim, as almas do longínquo purgatório, a melopéia lúgubre das rezas e a majestade do Cruzeiro, enchiam o espírito simples e devoto dos que ali se reuniam desse pavor secreto e indefinível, que sempre despertam as coisas que as prendem ao mistério e à morte.

Grandiosa e imponente com suas duas torres, altares de talha dourada, imagens trazidas de Portugal, a Sé de Fortaleza foi demolida para que no local fosse erguida a atual catedral (arquivo Marciano Lopes)

Aquele monumento não era somente uma espécie de altar onde se pedia descanso para os mortos e favores para os vivos: também se faziam promessas que não eram dirigidas a nenhum santo, que tinham relação direta com o Cruzeiro.
Certa dama da sociedade, em momento de aflição, fez a promessa de partir de sua casa  de joelhos, rodear o cruzeiro e voltar do mesmo modo, até sua casa, que aliás, não ficava distante.
Atendidas suas preces, a mulher cumpriu religiosamente o prometido.
Apesar do caráter de religiosidade com que se ia ao Terço do Cruzeiro, mais de uma vez serviu para jovens apaixonados, iludirem a vigilância dos pais. Foi assim que certa moça de boa família fugiu dali com o namorado, enquanto os outros rezavam.
Em 1922 era o preto velho André quem tirava o terço das almas, o ofício e a ladainha, cantando com voz forte, de modo a ser ouvido por toda a Praça da Sé, pela Rua das Flores, até além da Rua da Boa Vista. 

Praça da Sé - em primeiro plano os sobrados que contemplavam a matriz. As casinhas vistas na foto eram de taipa, e até serem demolidas há poucas décadas, eram as casas mais antigas de Fortaleza (arquivo Marciano Lopes)

Mas já nesse tempo o Terço havia pedido muito da gravidade e do respeito primitivo. Ali raramente se viam pessoas de melhor condição social, e ainda que várias pessoas do povo  fossem até lá por devoção, muitos o faziam por vadiagem.
Estragavam e perturbavam aquela reunião com chistes e piadas, provocando risadas, para espanto e indignação dos devotos.
Foi em vista do desrespeito que ali reinava que a autoridade competente, resolveu, naquele ano de 1922, acabar com a devoção do Terço do Cruzeiro, restando apenas as velas acesas e a reza silenciosa. Ao tempo em que o velho André ainda cantava, havia contornando o adro da Sé, pequenos muros com assentos de alvenaria, voltados para a igreja.
Pelo mesmo motivo de desrespeito ao lugar, também foram demolidos os muros e um assento que havia por detrás da Matriz.
Pela supressão do terço do Cruzeiro, os tradicionalistas não se queixem do automóvel nem de certas novidades de que está cheia a Fortaleza, mas do “Ceará moleque”, que tudo acanalha e desrespeita.

Extraído da Crônica O Terço do Cruzeiro, de 26 de outubro de 1935, de João Nogueira

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Os Clubes Suburbanos

O Baile da Marinha era um dos eventos mais elegantes da cidade na década de 1950
(foto de dezembro de 1953 - acervo Blanchard Girão)

A elite e a classe média dividiam espaço no recesso dos clubes elegantes da Fortaleza durante  décadas, até por volta dos anos 60/70:  Ideal, Náutico, Iracema, Diários, Maguary, Comercial e Massapeense. Os grandes eventos e os encontros de amigos aconteciam no ambiente distinto e seguro das maiores agremiações. 

um carnaval de luxo e distinção - este era o bloco oficial do Náutico em 1954
(acervo Blanchard Girão)


Fortaleza, porém, não era feita apenas do mundo elegante. Outros segmentos tinham seu espaço próprio e participavam ativamente de animadas reuniões festivas, especialmente nos finais de semana. 
Em muitos bairros existiam clubes, a maioria pequenos, mas não menos movimentados. Alguns típicos de classe média, outros, de classes menos favorecidas, mas, todos vivendo uma fase de grande efervescência.
Os militares de patentes mais baixas, suboficiais e sargentos, freqüentavam suas próprias agremiações: o Clube General Sampaio congregava o pessoal do exército. Tinha sede no Benfica, com bar e restaurante organizados, sempre com boa freqüência.
Os sargentos da Aeronáutica tinham seu ambiente especial no Ícaro, na Avenida Visconde do Rio Branco, bairro de Joaquim Távora, com festas de grande prestígio aos sábados e domingos. 
No mesmo bairro Joaquim Távora, bem próximo ao Ícaro, ficava o Suerdieck, que viveu uma fase de grande esplendor, promovendo bailes monumentais , inclusive patrocinando concursos para a escolha da Miss Suburbana, uma espécie de miss Ceará alternativa. 
Ainda na Visconde do Rio Branco já próximo ao centro, estava o 24 de Maio, que aliava sua condição de time de futebol de muita força na Segunda Divisão, a uma intensa atividade social em sua sede, onde às festas costumavam comparecer centenas de jovens.
Havia o Santa Cruz, que teve como presidente Francisco Dutra, um dos primeiros sócios do Ferroviário e antigo árbitro de futebol da Primeira Divisão do futebol cearense. Apesar da proximidade com o Cemitério São João Batista, promovia grandes bailes de carnaval e festas nos finais de semana, com muitos freqüentadores. 

Sede social do Gentilândia Futebol Clube (arquivo Nirez)

Não menos animados eram os bailes do Jabaquara, onde a presença mais notada era a de Valfrido Coelho, o “Pimpolho” ex-jogador de futebol, folião de primeira hora, e um dos criadores do famoso Cordão das Coca-Cola. O Jabaquara teve seus tempos áureos quando mantinha sede na Avenida Carapinima, no Benfica. 
Também no Benfica ficava o Gentilândia Futebol Clube, onde a freqüência, notadamente a masculina era predominantemente de alunos da Universidade, daí o apelido de dado pela imprensa de time dos acadêmicos. 

O Vila União no bairro do mesmo nome é um dos clubes que ainda resistem 


Na Fortaleza provinciana também havia festas animadas nos salões do Terra e Mar, no Mucuripe, do Rio Branco, no Antonio Bezerra, do Trilho, na Volta da Jurema e em inúmeros outros pequenos e médios clubes suburbanos, que agitavam fins de semana e períodos carnavalescos, hoje desaparecidos em sua quase totalidade.

Fonte:
Sessão das quatro, cenas e atores de um tempo mais feliz, de Blanchard Girão 

sábado, 26 de fevereiro de 2011

CUCA Che Guevara



Inaugurado em 10 de setembro de 2009 pelo então presidente Lula, o Cuca Che Guevara – Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte de Fortaleza, surge como o primeiro Espaço Mais Cultura do país. 
O Centro cultural foi instalado na Barra do Ceará, na área ocupada pelo antigo Clube de Regatas. Com mais de 14 mil metros quadrados e capacidade para atender 3500 jovens por dia, o espaço já é considerado o maior equipamento cultural público da América Latina. 

O Cuca conta com um cineteatro, ginásio de esportes, campo de futebol, piscina olímpica, rádio escola, dentre outros espaços, construídos especialmente para o atendimento de jovens e adolescentes. 



Ao todo, o Ministério da Cultura investirá R$ 8,1 milhões para a implantação de dois espaços Mais Cultura na capital cearense (a prefeita havia prometido que seriam seis), o Cuca Che Guevara e outra unidade a ser construída em área de intervenção do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 
Os Cucas são projetos da prefeitura de Fortaleza que interagem com os objetivos do Programa Mais Cultura de democratizar o acesso da população a equipamentos e serviços culturais.



Os Espaços Mais Cultura são uma ação do Programa Mais Cultura, do governo federal, criados para melhorar a qualidade de vida em periferias e centros urbanos com baixos indicadores sociais e marcados pela exclusão cultural.

O nome dado à unidade da Barra do Ceará, é uma homenagem tardia, fora de moda e fora de contexto, ao ativista político e guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara, um dos líderes da revolução Cubana que, ao lado de Fidel Castro, levou Cuba a um novo regime político.  
Guevara foi morto pela forças do Exército boliviano em 1967.





O Cuca é uma promessa de campanha da atual prefeita que acenou com a construção de seis unidades desse tipo de equipamento até o final do seu mandado, um em cada regional da cidade. O segundo está em fase de construção, às margens da Lagoa do Mondubim, onde antes funcionava o Clube Brisa do Lago, na Vila Manoel Sátiro. 

fotos de fevereiro de 2011
fontes:
Ministério das Cidades
Prefeitura de Fortaleza
www.cucacheguevara.blogspot.com    

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Imóveis Tombados pela Prefeitura de Fortaleza

Está em vigor, desde o dia 1º de abril de 2008, a Lei 9.347/2008 que normatiza os mecanismos de proteção ao patrimônio histórico-cultural e natural da cidade de Fortaleza, constituído pelos bens de natureza material e imaterial, móveis e imóveis, públicos e privados. Sancionada pela prefeita Luizianne Lins, a nova lei traz consigo um entendimento: sem a adesão da sociedade não é possível proteger o patrimônio. 
Através de procedimentos normatizados na publicação, o pedido de tombamento poderá ser feito por qualquer cidadão. 
Pela lei, também compete a todo cidadão preservar o patrimônio histórico-cultural e natural de Fortaleza, que atualmente conta com 15 bens tombados em caráter definitivo e outros 13 provisoriamente
Bens tombados pela Prefeitura 
Riacho Papicú e suas Margens. Papicu
Feira de Artesanatos da Beira Mar. Beira Mar
Escola Jesus Maria José, Av Coronel Ferraz, s/n° - centro
Casa do Barão de Camocim, Rua General Sampaio, n° 1632, Centro
Estação Ferroviária da Parangaba
 Mercado dos Pinhões, Praça Marquês de Pelotas, Praia de Iracema
 Igreja do Senhor do Bom Jesus dos Aflitos Praça da Matriz s/n, Parangaba 
 
Mercado da Aerolândia, BR 116, n:5431, Aerolandia 

Espelhos de Água das Lagoas de Messejana e Parangaba 
Lagoa de Messejana
Lagoa da Parangaba
Ponte dos Ingleses - Praia de Iracema

Tombamento Municipal de 1986
Localização: Praia de Iracema
A construção foi iniciada em 1923, pela empresa inglesa Nestor Grifts, para ser o Porto de Fortaleza, substituindo a antiga Ponte Metálica. 
No entanto, nunca funcionou como porto. Hoje é um dos principais pontos turísticos da capital.
Capela de Santa Teresinha. Av. Presidente Castelo Branco (Avenida Leste-Oeste)
Tombamento Municipal de 1986
Localização: Avenida Presidente Castelo Branco (Leste-oeste)
A edificação está situada no Bairro Moura Brasil. A igreja foi preservada da demolição e posteriormente tombada após um intenso movimento popular local. Teve sua construção iniciada em 1926 por pescadores e moradores. Foi inaugurada em 1928.
Estoril. Praia de Iracema
Tombamento Municipal de 1986
Localização: Praia de Iracema
Construído entre 1915 e 1920 pelo coronel Guimarães Porto para sua família, recebeu o nome de Vila Morena em homenagem a sua esposa. 
Em 1945 foi sede de um cassino para soldados americanos. Depois passou a ser um bar freqüentado por boêmios e intelectuais.
 Teatro São José
Foto de Mauricio Cals 
Tombamento Municipal de 1988
Localização: Rua Rufino de Alencar, 323
Foi criado em 1914, como alternativa de lazer cultural para trabalhadores que não tinham acesso ao luxuoso Teatro José de Alencar. Num terreno baldio, ao lado da Igreja da Prainha, o padre alemão Guilherme Wassen deu inicio a obra, com a ajuda de voluntária de operários. Foi concluído em 1915.
Parque da Liberdade (Cidade da Criança) - Centro
Tombamento Municipal de 1991
Localização: Ruas General Bezerril, Pedro I, Pedro Pereira e Avenida Visconde do Rio Branco. Construído em 1890, com nome alusivo a abolição da escravatura. 
Em 1923-24 passou por uma grande remodelação e a antiga Lagoa do Garrote, que servia de repasto e descanso dos animais ganhou discreta amurada, assumindo as feições de lago artificial. 
Em 1936 o nome foi mudado para Cidade da Criança, quando uma escola infantil passou a funcionar no local. 
Palácio do Bispo e Bosque do Pajeú que o circunda.  
foto de Maurício Cals
Tombamento Municipal de 2005
Localização: Rua São José - Centro 
Pertenceu a Antonio Francisco da Silva (sargento-mor). Em 1982 passou a ser propriedade do Bispado do Ceará. Em 1973 a Prefeitura de Fortaleza adquiriu o imóvel e nele instalou sua sede. Hoje abriga alguns setores da Prefeitura.
Tombamentos realizados em caráter provisório
 Casa Rachel de Queiroz, Rua Antonio Ivo, nº 290, Joquei Clube;
 Bar do Avião, Rua 15 de novembro, n° 09,  Parangaba
 Colégio Dorotéias, Av. Visconde do Rio Branco,n° 2078, Joaquim Távora
 
Edifício São Pedro, situado á Rua Ararius , n° 09 Praia Iracema

 Escola de Música Luís Assunção, localizado a Rua Solon Pinheiro n° 60,Centro
 
Ideal Club, localizado á Av. Monsenhor tabosa, nº 1331, Meireles
 
IMPARH, localizado á Av. João Pessoa, n° 5609, Damas
 
Lord Hotel,Rua Liberato Barroso n° 555, Centro
 
Náutico Atlético Cearense, Avenida da Abolição n° 2727, Meireles
 
Prédio do Português, Avenida João Pessoa nº 5094, Damas
 
Santa Casa de Misericórida, Rua Barão do Rio Branco n° 20, Centro
 Casa da Câmara da Villa de Arronches
 e Intendência Municipal da Villa de   Parangaba


fontes:
SECULTFor
O Povo online 
Guia de Informações do Ceará 

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Bairros de Fortaleza: Pirambu


A área original do que era Pirambu foi dividida em pequenos bairros pela Prefeitura de Fortaleza: Tirol, Nossa Senhora das Graças, Quatro Varas e Cristo Redentor . Como ninguém consegue definir onde termina um e começa o outro, para efeito desse post, consideramos o Pirambu como a área que fica entre a os Bairro Moura Brasil e o Cristo Redentor, limitada pela Avenida Leste-Oeste e o Oceano.  
   
O bairro é cortado por uma das principais avenidas de Fortaleza, a Leste-Oeste

O Pirambu está localizado no litoral oeste de Fortaleza. Sua origem remonta ao final do Séc. XIX,  quando a capital recebeu levas de flagelados que fugiam das secas que assolavam o interior do estado. 
A população indigente foi se alojando em barracos,  em terrenos próximos à ferrovia, às indústrias, à zona de praia, e às margens dos rios, áreas desprezadas pelos grupos sociais de maior poder aquisitivo. 

 As ruas sem alinhamento denunciam o caráter informal/ilegal da ocupação da área

 o desnível do terreno é um indício de que em tempos passados esta pode ter sido uma área 
de dunas


Apesar de pequenos, esses aglomerados começaram a se tornar visíveis a partir da década de 1930, quando começaram a ser apontados como locais de extrema pobreza, moradias precárias, alta insalubridade e altos índices de violência.
Em meados da década de 1940 os dois bairros mais pobres eram o Arraial Moura Brasil, na parte baixa da cidade, localizado entre a linha férrea e a região de praia, e o Pirambu localizado na praia a noroeste do centro. 

 o emaranhado de fios de alta tensão transmitem uma impressão de precariedade e risco à segurança dos moradores

com vistas para o mar 

O Pirambu era considerado um prolongamento do Arraial Moura Brasil, tanto na base territorial quanto no sofrimento do povo.  Mas o Pirambu foi à luta. Desde 1948 possuía uma sociedade feminina constituída para lutar contra a ameaça de expulsão dos moradores do bairro e a favor de melhorias urbanas. A maioria dos moradores não pagava aluguel, porque seus casebres estavam em terrenos de marinha. 
O ônibus que fazia a linha do bairro tinha o seu ponto final na Rua Braga Torres, logo depois de passar pelo Moura Brasil. Ali começava o Pirambu. Na continuação dessa rua ficava um trecho muito habitado, dos dois lados, formando uma longa rua. 
Num riacho situado entre o Pirambu e o Moura Brasil havia uma ponte estreita, chamada de pinguela, que só dava passagem a uma pessoa de cada vez e no inverno o povo tinha que caminhar dentro d’água. 


A Sociedade Feminina do bairro solicitava o calçamento das ruas, reivindicava remédios, empregos e alimentos. Nas décadas de 1940/50, O Pirambu ainda era um subúrbio, onde se misturavam casebres e palhoças ocupadas por operários, pescadores, lavadeiras, e empregados domésticos. 

Em uma carta ao Jornal o Povo, um leitor faz um comentário sobre o Pirambu: “estão sendo construídos casebres, e mais casebres em propriedade privada, sem plano, sem licença, sem nenhuma norma legal... até casas edificadas no espaço reservado às ruas... criando sério e insolúvel problema para a higiene e estéticas locais, com uma favela a mais e uma praia a menos...”  

Unidade hospitalar na rua Nossa Sra. das Graças
A situação no bairro só começou a melhorar com a construção da Avenida Leste-Oeste na década de 1970 e a implantação do saneamento básico nos anos 90, gerando perspectivas de melhorias para seus moradores. 

 Fortaleza dos contrastes: uma das áreas mais pobres da capital  emoldurada pelo metro quadrado mais caro da cidade: o Meireles

lixão na beira do mar

Mas o desenvolvimento local, não foi do tamanho esperado pela população: O Pirambu é o bairro mais populoso de Fortaleza e apresenta maior densidade populacional do Brasil, com 40 mil habitantes por km2. 
A comunidade tem baixos indicadores sociais, com um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal de apenas 0,391, classificando-se entre os 10 piores da Capital cearense.


A área que cresceu muito nos últimos anos, é ainda conhecida por ser uma das mais perigosas; a falta de moradia e o desemprego são, ainda, graves problemas sociais.E conta com famílias que ocupam a faixa de praia, onde estão expostas a riscos como avanço da maré, deslizamentos de encostas, insalubridade, doenças e total insegurança.
Vários projetos, associações e ONG's atuam na área do Pirambu, na busca de melhorar a qualidade de vida dos moradores, equacionar problemas estruturais e dessa forma, mudar a história do bairro, contada por anos e anos de pobreza, preconceito e exclusão social.  


fotos: Raquel Vianna
(fevereiro de 2011)
fontes:
Jucá. Gisafran Nazareno Mota. Verso e Reverso do Perfil Urbano de Fortaleza (1945-1960). São Paulo: Annablume; Fortaleza: SECULT, 2000
Costa, MCL. Fortaleza: expansão urbana e organização do espaço. In_____Silva, José Borzacchielo da; Cavalcante, Tércia C; Dantas, Eustógio W.C (org). Ceará: um novo olhar geográfico. Fortaleza: Demócrito Rocha, 2005. 
WIKIPÉDIA

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

150 Anos da Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza

Quando surgiu o prédio do Hospital da Caridade ou Santa Casa de Misericórdia tinha apenas um andar (Arquivo Nirez)
O Local para instalação do Hospital da Caridade – o primeiro hospital de Fortaleza –  foi escolhido em 1847, na gestão do presidente da província Inácio Correa de Vasconcelos (1844-1847). Foi concluído em 1857 e posto em funcionamento com alguns índios enfermos, mas por falta de condições foi fechado pelo então presidente Dr. João Silveira de Sousa (1857-1859). Em 1860 foi criada a irmandade da Misericórdia para administrar o hospital, que a partir de sua instalação em 1861, passou a ser chamado de Santa Casa de Misericórdia.
O segundo andar só foi construído no início da década de 1920
Em 1922 foram iniciadas as obras de reformas do prédio que passou a contar com dois pavimentos.  
Sob a responsabilidade da Irmandade da Misericórdia, o Hospital que começou apenas com 80 leitos, hoje atende mais de 13 mil pessoas todos os meses. A maioria dos pacientes vindos do interior e bastante carentes.
Passados 150 anos de sua inauguração o hospital filantrópico e sem fins lucrativos tem sobrevivido com muitas dificuldades e com a ajuda da sociedade através de várias tipos de campanha.
A Santa Casa de Misericórdia fica no cruzamento das Ruas Barão do Rio Branco com Dr. João Moreira, centro de Fortaleza

Francisco José do Nascimento - O Dragão do Mar

José Luis Napoleão fora um ex-escravo que comprara a própria alforria e, com economias juntadas, ainda libertara quatro irmãs. Chefe de capatazia da firma Bóris Frères no Porto de Fortaleza, gozando de muita popularidade, recebeu com entusiasmo a proposta de greve dos abolicionistas. 
Mobilizou os trabalhadores da praia e destacou-se nos eventos de 1881. Mas foi esquecido pela história oficial talvez por que Napoleão, homem humilde e negro, tenha apontado uma outra pessoa para liderar o movimento, uma pessoa de melhor aparência, com mais instrução.  
Francisco José do Nascimento

Por indicação de Luis Napoleão, a liderança do movimento coube ao mulato Francisco José do Nascimento, conhecido por Chico da Matilde, o lendário Dragão do Mar. Chico da Matilde – devido a mãe Matilde da Conceição – nasceu em Canoa Quebrada, Aracati, em 1839. 
Órfão aos 8 anos – o pai Manoel do Nascimento morreu na Amazônia, num frustrado sonho de melhorar de vida trabalhando como seringueiro – cabendo à mãe criar o menino sozinha. Em meio a pobreza absoluta, dona Matilde viu-se obrigada a entregá-lo aos cuidados do comendador português José Raimundo de Carvalho.
Até os 20 anos Francisco José trabalhou no veleiro do comendador, “O Tubarão” como embarcadiço, depois como comandante, percorrendo portos do Norte e Nordeste. Por essa época aprendeu a ler e a escrever, e casou-se com Joaquina Francisca, erguendo uma casinha próxima ao atual Seminário da Prainha, em Fortaleza. 

cartão postal colorizado a mão do quebra mar no Porto do Ceará (Ah, Fortaleza!)
Ao contrário do que se afirma, Chico da Matilde não era jangadeiro (embora dominasse as labutas do mar), mas sim prático de navegação, ou seja, orientava a atracação de navios no porto da capital, além de alugar algumas poucas jangadas de sua propriedade para transportar pessoas e mercadorias. 
Não participou pessoalmente da greve de janeiro de 1881, quando o movimento abolicionista fechou o porto de Fortaleza ao embarque de escravos (estava trabalhando num navio por ocasião da paralisação), mas devido a movimentação de agosto do mesmo ano, foi demitido do posto de prático.
Francisco José do Nascimento transformou-se no símbolo da luta cearense contra a escravidão. Foi conduzido de navio em 1884 ao Rio de Janeiro, onde foi alvo de várias festas e honrarias. 
Foi carregado nos braços pela Rua do Ouvidor, sob uma chuva de pétalas de rosas jogadas do alto dos prédios. Teve um encontro de alguns minutos com o próprio imperador D. Pedro II, e foi retratado na capa da famosa Revista Ilustrada. 
Doou uma jangada – Liberdade – ao Museu Nacional. Por pressão dos escravocatas, o diretor do Museu foi demitido e a jangada recolhida a um depósito da marinha, onde desapareceu. Em 1889, por ordem de D. Pedro II, Chico reassumiu o emprego de prático, do qual havia sido demitido. 

Cartão postal com a jangada do Dragão do Mar (Ah, Fortaleza!)

Viúvo, em 1902 casou-se com a sobrinha do jornalista João Brígido, Ernesta Brígido. Chico da Matilde participou de outros episódios históricos importantes, participações internacionalmente omitidas pelas elites, afinal ele chegou a contestar o poder dominante também. 
Em 1904, o Dragão do Mar já com 65 anos e cabelos brancos articulou um protesto contra um tal de sorteio militar – os escolhidos eram todos pobres, negros, mulatos, caboclos, pais de família. Nenhum branco, nenhum rico. A conseqüência foi um confronto com a polícia acciolina, no qual morreram alguns populares. 
Chico da Matilde socorreu pessoalmente os feridos, recolhidos à Santa Casa. No enterro das vítimas, a polícia foi chamada para “dispersar a canalha”. O velho Chico colocou-se à frente do povo e com o peso moral do seu passado, clamou por justiça.
 As tropas voltaram ao quartel.

estátua de Francisco José do Nascimento, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza

Chico da Matilde, nos últimos anos foi esquecido por quase todos. A classe média e as elites o usaram na campanha abolicionista para abandoná-lo em seguida. 
Chico da Matilde faleceu no dia 06 de março de 1914, durante o cerco à Fortaleza pelas tropas de Floro Bartolomeu e Padre Cícero na Sedição de Juazeiro.

Fontes:
Cronologia Ilustrada de Fortaleza, de Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez)
História do Ceará, de Airton de Farias

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Ceará Moleque: apelidos e vaias como forma de protesto

 Praça do Ferreira em 1930  - ainda podiam ser vistos o coreto (demolido em 1932) o prédio da Intendência (demolido no início da década de 1940),  o Sobrado do Pastor e o Palacete Ceará que ainda resistem. (Arquivo Nirez)

Um povo sofrido como o cearense haveria de encontrar uma maneira de se vingar dos seus detratores. E uma das maneiras encontradas foi através dos apelidos, usados como uma maneira de expor o apelidado ao ridículo. A outra seria através das vaias. 
De uma forma ou de outra, o fato é que nenhuma autoridade detestada pelo povo escapou de um apelido. Nem mesmo os representantes do alto clero, a exemplo dos arcebispos Dom Manuel da Silva Gomes, apelidado de bolo confeitado e Dom Antonio de Almeida Lustosa, de envelope aéreo.
O Comendador Nogueira Accioly, costumava se referir ao povo como a arraia miúda, em troca era chamado pelo mesmo povo de babaquara, pelo fato de Accioly, diziam, viver se babando. 
Outro governante o Presidente João Tomé de Sabóia e Silva (1916-1920), que era engenheiro e inventor de uma máquina de fazer chover, ganharia o apelido de manda-chuva
Pé-de-valsa e as maravilhas era o apelido do Presidente Matos Peixoto (1928-1930) e seus assessores.
Faustino de Albuquerque (1947-1951), foi mais um governador a ganhar apelido: Chiquita Bacana. Ficavam a salvo dos apelidos, os governantes benquistos, porque os apelidos constituíam-se uma vingança do povo contra os que os ofendiam. 



  
A Praça do Ferreira é desde sempre o quartel-general do ceará moleque. As fotos mostram o cruzamento das Ruas Major Facundo com a Guilherme Rocha em datas distintas. Em comum, o prédio do Excelsior Hotel. (Arquivo Nirez)

As vaias surgiam sempre que o povão entrava em discordância contra fatos muitas vezes banais, mas que eram considerados chocantes. Contra as extravagâncias no modo de vestir ou se portar em público. Contra afirmações, ditos ou juízos que iam de encontro ao senso comum. Contra, principalmente, as presenças indesejadas.
A balbúrdia – gritos, assovios, apupos, risadas – surgia inesperadamente, de todos os lados, despertando a atenção da polícia, que procurava a todo custo, conter os manifestantes. Sempre que isso acontecia, a própria policia também era vaiada. 
As manifestações do Ceará-moleque não livravam ninguém nem faziam concessões.  

Uma das vítimas da irreverência popular foi o Barão de Studart, que ao atravessar a Praça do Ferreira, trajando fraque, cartola e com um guarda-chuva a tiracolo, foi recebido aos gritos de Cobrão!  Jararaca! E sob estrondosa vaia.
A polícia entrou em ação distribuindo bordoadas, realizando prisões, salvando o barão da massa ignara, que parecia desconhecer o representante máximo da historiografia cearense. 

No entanto, a maior de todas as manifestações de desagrado estaria reservada a Manoel Sátiro, um político do tempo do império, por ocasião da campanha eleitoral de 1937. Partidário ardoroso da candidatura Armando Salles de Oliveira, o político compareceu à recepção prestada no aeroporto ao candidato dos banqueiros paulistas à presidência da república. 
Em frente ao Excelsior Hotel, onde ficaria hospedado o político bandeirante, juntara-se uma multidão que se estendia até a Rua Barão do Rio Branco, composta em sua maioria de curiosos, já que a preferência do eleitorado cearense recaía sobre o Ministro José Américo de Almeida.
Questão de identidade, de afinidade, de relacionamento, de regionalismo. Armando, além de sulista era representante dos banqueiros de São Paulo, enquanto José Américo era nordestino, com serviços relevantes prestados na assistência aos flagelados da seca de 1932. 
Daí a preferência pelo Ministro de Viação e Obras Públicas.

Em frente ao hotel iam descendo dos automóveis um a um os convidados para a recepção. 
A multidão chiava baixinho, manifestando dessa forma sua desaprovação. Então Manoel Sátiro desce de um dos veículos, apoiado em uma bengala. Olha com desprezo para a aglomeração e acenando a cartola no ar, exclama a plenos pulmões:

- Viva o Brasil, canalhas!
O povão que até então protestava baixinho, explodiu aos gritos e assovios na maior vaia já presenciada nas redondezas. 
O candidato Armando Sales e sua comitiva, curiosos sobre o que estaria acontecendo na rua, assomaram às janelas do Excelsior, sendo vaiados também. 


Praça do Ferreira foto de dezembro de 2010

Pois nem o sol, apelidado de astro-rei pela nobreza literária do Café Art-Nouveau, escapou de ser vaiado pelo povaréu da Praça do Ferreira, quando surgiu sobre a Coluna da Hora, depois de uma semana sem aparecer.

extraído do livro
A Praça e o Povo (homens e acontecimentos que fizeram história na Praça do Ferreira), de Alberto S. Galeno.