terça-feira, 31 de julho de 2012

Bairros de Fortaleza: Mucuripe


Enseada do Mucuripe

Localizado na zona leste de Fortaleza, o bairro do Mucuripe limita-se ao Norte com o Oceano Atlântico; ao Sul com a Varjota; a Leste com os bairros Serviluz e Vicente Pinzon e a Oeste, com o Meireles.  Sua origem remonta aos tempos  das grandes navegações e do descobrimento do Brasil, quando no ano de 1500, antes mesmo da expedição de Pedro Álvares Cabral, o local teria sido visitado pelo navegador espanhol Vicente Pinzon, que supostamente desembarcou na enseada do Mucuripe e batizou o local de Cabo de Santa Maria de La Consolacion. Por muitas razões acredita-se que o Santa Maria de La Consolacion é a chamada ponta do Mucuripe, e que Pinzon descobriu o Brasil tocando as praias do Ceará.

 Morro de Santa Teresinha

Até por volta do ano de 1930, havia no Mucuripe, não longe do farol e para o Poente, os restos de uma construção muito antiga. Acredita-se que essas ruínas fossem os últimos vestígios das três baterias que ali existiam em 1802, ( Baterias da Princesa Carlota,  de São João Príncipe e  de São Pedro Príncipe) citadas pelo Dr. Carlos Studart Filho, em uma matéria publicada na Revista do Instituto do Ceará.
Segundo historiadores,  foram construídos os seguintes fortes na ponta do Mucuripe:  Fortim de São Bartolomeu, Fortim de São Bernardo do Governador (Fortim de São Luis), Fortim da Bandeira, além das  três  baterias citadas, que foram erguidas para complemento da defesa da enseada de Mucuripe e seu ancoradouro. Provavelmente são contemporâneas,  erguidas a partir de 1802 por determinação do governador da Capitania do Ceará, Bernardo de Manoel de Vasconcelos.


Durante muitos anos o Mucuripe foi um bairro de pescadores, mas com a expansão da cidade, e a valorização dos terrenos do litoral a partir da abertura da Avenida Beira Mar, a orla marítima do bairro tornou-se uma das áreas de maior especulação imobiliária de Fortaleza.  

  Igreja de Nossa Senhora da Saúde

A Igreja Nossa Senhora da Saúde foi fundada pela própria comunidade de pescadores do Mucuripe. O padre José Nilson marcou a história do bairro por causa da relação próxima com a comunidade e da luta pelas melhorias do local.
Conforme conta o padre Alderi, responsável atual pela igreja, antes da chegada do antigo pároco, a comunidade do Mucuripe era esquecida e nenhum religioso ficava mais de dois anos no comando da paróquia. Em maio de 1950, padre Zé Nilson foi enviado ao Mucuripe por Dom Antônio de Almeida Lustosa, com a previsão de ficar somente dois anos, como seus antecessores. No entanto, o religioso acabou ficando por 50 anos na defesa da comunidade. “Ele estava sempre junto aos pescadores. Pescava com eles e escutava suas histórias”, revela o padre Alderi.


A Imagem de N. Senhora da Saúde, na praça da matriz,  é um trabalho do escultor Deoclécio Diniz, conhecido por "mestre Bibi" ou "Bibi Santeiro". Morador de Canindé, mestre Bibi ganhou fama produzindo imagens sacras de grandes dimensões. 


O Farol do Mucuripe foi construído entre 1840 e 1846, sendo desativado em 1957, por ter se tornado obsoleto. Foi restaurado pela primeira vez em 1982, para sediar o Museu de Fortaleza. Tombado como Patrimônio Histórico o antigo farol está localizado na Esplanada do Mucuripe próximo ao Cais do Porto.

Cemitério São Vicente de Paulo. Construído em 1912, foi  o segundo cemitério público de Fortaleza. É o menor cemitério da cidade ,e segundo dizem, encontra-se superlotado desde os anos 1970.

Praça Amigos da Marinha


O busto do Almirante Tamandaré ficou por longo tempo na Praça de Otávio Bonfim, até ser substituído pela estátua de Farias Brito, inaugurada em 1963.

  Porto do Mucuripe


O primeiro projeto relativo a instalação do porto do Mucuripe foi apresentado em 1870, por um engenheiro inglês, que recomendava o inicio das obras na enseada ali existente. Mas somente em 1886 os trabalhos foram iniciados. Apesar do conhecimento das condições do ancoradouro na ponta do Mucuripe, a quase ausência de arrecifes era apontada como um ponto desfavorável à instalação do porto naquele local.
Em pouco tempo a intensidade das ondas destruiu o que já havia de obras inclusive o próprio ancoradouro, o que foi determinante para o abandono do projeto. E as mercadorias continuaram sendo levadas em embarcações pequenas para os navios que ficavam a 500 metros da praia. Conta-se que as mercadorias chegavam molhadas e quem desembarcava não deixava de tomar um banho salgado.
Em 1908 foram feitos novos estudos e a construção do porto foi contratada e iniciada, Mas as obras federais em andamento no Nordeste foram suspensas ao final do governo do Presidente Epitácio Pessoa (1919-1922), quando somente 250 metros de viaduto haviam sido construídos, de um total de 800 metros projetados.
A morosidade da obra passou a fazer parte do anedotário popular, segundo o qual havia três sinfonias inacabadas em Fortaleza: a catedral, o cine São Luis e o porto do Mucuripe.
O porto foi sendo inaugurado por partes, e com grande espaço de tempo entre a finalização de cada etapa. 


Entre o inicio do segundo projeto e o final das obras, a construção do porto do Mucuripe durou mais de setenta anos, num monumental atestado de incompetência, passado por diversos governos estaduais, consumiu recursos incalculáveis e de quebra, destruiu a Praia de Iracema.
O Porto tornou-se um obstáculo para o fluxo de areias do litoral leste para o oeste, causando a drástica diminuição da faixa de praia na região da Praia de Iracema e o progressivo abandono das atividades portuárias e comerciais na área.

fotos de julho/2012
por Rodrigo Paiva e Raquel Vianna 

Pesquisa
Fortaleza Velha, de João Nogueira
Geografia Estética de Fortaleza, de Raimundo Girão
Verso e Reverso do Perfil Urbano de Fortaleza, de Gisafran Nazareno Mota Jucá
Wikipédia

domingo, 29 de julho de 2012

A Presença Britânica no Ceará

Rua Floriano peixoto, trecho Praça do Ferreira

Nas primeiras décadas do século XIX a Província do Ceará se mantém integrada à Corte, às demais províncias brasileiras e aos países estrangeiros mais importantes, por contínuo fluxo de embarcações que ainda enfrentavam corsários e riscos de naufrágio na costa nordestina. Alguns ilustres visitantes aqui estiveram motivados por objetivos de ordem científica, comercial, religiosa, artística, e militar, a exemplo de Lord Thomas Cochrane, que em 1824, em dezesseis dias de permanência, assegurou a conformação da Província ao Imperador D. Pedro II e assistiu ao juramento de obediência e fidelidade prestada pelos habitantes de Fortaleza.
Súditos ingleses já ocupavam espaços de comércio em Fortaleza, estabelecendo as primeiras organizações que atuariam voltadas para o mercado internacional. O pioneiro foi o irlandês William Wara, em 1811, seguido de Robert Singlehurst, John William Studart, Henry Ellery, Alfred Harvey, Richard P. Hugges, John Foster, Charley Hardy e outros.
Na segunda metade do século XIX acentua-se a tendência da província pelas relações com as potências europeias, com claro predomínio da Grã-Bretanha que estabelece relações comerciais e viabiliza o suprimento de capitais e competência tecnológica. De um lado, há a facilitação dos processos através de súditos europeus já migrados para a província, e de outro, a disponibilidade de recursos para investimento do capitalismo internacional se expande a partir de 1850. Em 1862, de 277 estabelecimentos comerciais existentes em Fortaleza, 76 eram de estrangeiros.
Por essa época, a Grã-Bretanha já estabelecera o domínio da navegação comercial com a província do Ceará, através de linhas ligando o Porto de Liverpool e outros portos ingleses à cidade de Fortaleza, com rotas que seguiam ao norte até New Orleans e New York. Empresas como a Liverpool Northern Brazil Steamers (depois Booth Company) e a Red Cross Line of Mail Steamers consolidaram essa rota que transportava o algodão e outros produtos primários cearenses e abasteciam o mercado local de produtos britânicos. A aceitação dessa presença é verificável  na denominação de lojas locais da época com Casa Manchester, Túnel de Londres, Ship Chandler, Casa Reeckelk.


Trabalho de perfuração de poços, para obtenção de água potável, no bairro do Benfica(imagem do blog ibamendes)

Os investimentos britânicos eram voltados para os setores de produção, comércio e intermediação financeira, mas também com forte interesse na infraestrutura de serviços públicos. A essas áreas agrega-se a partir da última década do século XIX, a geração e distribuição de energia elétrica, com investimentos diretos ou por associação aos grupos financeiros do Canadá e dos Estados Unidos da América, nos mercados onde esses países já mantinham controle.
A presença britânica no Ceará, no campo dos serviços públicos, tem início em 1862, quando era concedido ao cidadão  José Paulino Hoonholtz o privilégio de explorar o abastecimento e a comercialização de água em Fortaleza por um período de 50 anos. O texto legal assegurava o direito de exclusividade, obrigando-se o contratante a canalizar a água do sítio no Benfica para a cidade, e a construir quatro chafarizes. O governo por sua vez, fecharia todas as cacimbas públicas de água potável existentes na cidade. 


água potável de maior aceitação pela população era proveniente da fonte de Zuca Acioli, retirada de um grande poço localizado na Rua marechal Deodoro, antiga Rua da Cachorra Magra  

Logo depois, em 1863, Hoonholtz propõe a transferência dos seus direitos para uma firma constituída e sediada em Londres para esse fim – a Ceará Water Company Limited. Mas a ideia não se materializa facilmente. As obras somente são iniciadas em janeiro de 1865, enquanto novos decretos são publicados, prorrogando o prazo por mais 10 anos; isentando de impostos a importação de equipamentos    necessários à execução da obra, e autorizando o funcionamento da companhia inglesa no Ceará. O tempo de vida da empresa seria encurtado pela seca que se abateu sobre o Estado em 1877, causa do desaparecimento da água nos reservatórios de Benfica e ainda dos problemas financeiros dos investidores ingleses. Ausentes do país os seus dirigentes, sem nenhum representante oficial na província, infrutíferos seriam os esforços do vice-cônsul inglês John William Chambly Studart para salvar a Ceará Water da decisão governamental  de sequestrar as propriedades e bens da empresa como forma de obter recursos para pagamento de dívidas acumuladas.


A Ponte dos Ingleses foi construída para servir de porto em substituição a Ponte Metálica, mas as obras foram suspensas no governo do presidente Artur Bernardes. A Ponte dos Ingleses nunca funcionou como porto de Fortaleza.   

Outros empreendimentos britânicos ocorrem em Fortaleza priorizando os serviços públicos essenciais. Em 1865, a empresa Ceará Gas Company Limited, com sede em Londres, assume, por 59 anos, os serviços de iluminação pública a gás carbônico. Também foi entregue aos ingleses a construção do porto de Fortaleza. No ano de 1886 é contratada a firma Ceará Harbour Corporation Limited, associação de capitalistas de Londres, a qual fora concedido pelo governo imperial a missão de construir o porto e o direito de usufruir as rendas de sua operacionalização pelo prazo de 33 anos. Depois, em 1892, o prazo de conclusão é prorrogado e concedidas garantias de juros por 25 anos.
Em 1910 é autorizado o arrendamento da Estrada de ferro Baturité pela South América Railway Construction Company Ltd, sociedade inglesa que teve a concessão rescindida por descumprimento de termos contratuais. Nessa época vem ao Ceará o engenheiro Francis Reginald Hull, exemplo dentre os estrangeiros que se integraram à vida Local. 


Casa de Mr. Hull na Avenida Monsenhor Tabosa, antigo bairro da Prainha

Quatro vezes Mr. Hull desenvolveu atividades profissionais no Brasil: de 1892 a 1893, na São Paulo Railway; novamente na ferrovia paulista, de 1895 a 1900; em 1913, como superintendente geral da Brasil North Eastern Railway, no Ceará; em 1921 como superintendente da The State of Bahia South Western Railway Co. Ltd e a partir de 1933, em Fortaleza, como vice-cônsul da Inglaterra e diretor local da The Ceará Tramway Light and Power Co. Ltd.


Usina da Ceará Light no Passeio Público, à esquerda, o Gasômetro

Finalmente na série de investidas de grupos ingleses no Ceará, em 1911, mais uma empresa é constituída em Londres para  explorar serviços públicos. A Ceará Tramway Light and Power Co. Ltd, que começou a atuar em Fortaleza em 1913, com o fornecimento de energia elétrica para consumo residencial, suprimento para fins comerciais e industriais e o serviço de transporte urbano, com bondes elétricos.  Em 1934, com o fechamento da concorrente Ceará Gas, assume os serviços de iluminação pública. Esta seria a mais importante e a última das empresas oriundas da Grã-Bretanha, concessionárias de serviços públicos na capital cearense.


fotos do Arquivo Nirez 
Extraído do livro de Ary Bezerra Leite
História da Energia no Ceará
         

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Os Frequentadores do Café Riche


Sobrado do Comendador Machado, demolido para a construção do Excelsior Hotel. No andar térreo funcionava o Café Riche. Nos andares superiores, o Hotel Central.

Fossem  nas grandes capitais ou em pequenas cidades, os cafés e bares eram pontos de encontro e muita conversa fiada em torno dos mais variados assuntos, alguns de grande outros de nenhuma importância. Por outro lado as constantes modificações nos hábitos urbanos contribuíram para o desaparecimento dos cafés, espaços de alta expressão na vida das cidades, como foco de debates de ideias, de comentários políticos e às vezes de mexericos sociais.


Café Iracema, na Praça do Ferreira, um dos muitos cafés existentes no centro de Fortaleza naquela época. 

E a exemplo do que ocorria em outros capitais, Fortaleza também teve os seus cafés. Um dos mais famosos foi o Café Riche, situado na esquina mais famosa da cidade, em plena Praça do Ferreira, na Rua Guilherme Rocha, no sobradão  quase centenário  que fora do Comendador José Antônio Machado e servira por muito tempo de sede á firma G. Gradvohl & Fils, exportadores.


Cruzamento das Ruas Guilherme Rocha com a Major Facundo, onde no térreo do sobrado, funcionava o Café Riche.

Inaugurado em 1913, pertencia a uma sociedade constituída por Luis Severiano Ribeiro e Alfredo Salgado. Arrendado a terceiros, o Café Riche tinha restaurante contíguo que pertencia à firma Ramon e Jucá. Ramon era um garçom espanhol que  fixara residência em Fortaleza. Conhecedor do ramo e homem de iniciativa, depois se tornaria bastante conhecido por outros empreendimentos, como os restaurantes à beira-mar de que foi o precursor. Seu sócio era José de Castro Jucá, que por muitos anos foi o gestor da parte comercial da companhia de bondes, depois Light and Power.


Rua Floriano Peixoto. O centro de Fortaleza mudou bastante ao longo do tempo

O restaurante do Riche era bem frequentado, principalmente na hora do almoço. Tinha apreciável cozinha, e no centro comercial era o preferido dos moços mais abastados do comércio e de comerciantes. Claro que a grande maioria da gente do comércio residia nas ruas centrais e quem morasse mesmo nos bairros como Benfica e Fernandes Vieira, tinha tempo de sobra para almoçar em casa e pegar a parte de bar ou café do Riche e do Art-Nouveau.  


Quarteirão da Rua Major Facundo na Praça do Ferreira, na esquina ficava o "Maison Art-Nouveau", inaugurada em 1907. 

O caso é que a parte de bar ou café do Riche devia dar grande prejuízo.  Os papos ruidosos e animados eram mantidos  diariamente na meia hora que sobrava do almoço. Então o Riche se enchia de fregueses, que nada consumiam, e iam até ali para discutir assunto de clubes, diversões, cinema, politica, e novidades. Era o fino  da mocidade do comércio ou estudantes que ali se sentavam diante das mesas oitavadas, de mármore cinza. Os estudantes, literatos e doutores eram mais do horário da tarde.
Gloriosas eram as tardes do Café pela frequência de literatos. A fidalguia, a hospitalidade do Café Riche chegava ao ponto de existir numa espécie de puxada do salão que se estendia por toda a calçada larga invadindo a coxia coberta de madeira. Cheia de mesas,   quando o sol caía e a brisa vinda das bandas do passeio  público soprava, a calçada se transformava num verdadeiro conclave de literatos.


No cruzamento da Guilherme Rocha com Floriano Peixoto, nos baixos do Sobrado do Pastor, funcionou o Café Globo

Comerciantes e empresários de destaque, de vem em quando se agrupavam no salão do Café Riche, também pelo cair da tarde. Um grupo de estrangeiros e descendentes radicados na terra, no inicio da Primeira Guerra, fundou o Clube dos Aliados. Numa tarde vários integrantes do clube bebericavam seus uísques e gins, quando entra Quintino Cunha, que sem os avistar dirige-se à Tabacaria que ficava no centro do salão. Quintino com seu vozeirão pede:  – me dá uma carteira de Aliados.
O grupo estrangeiro, conhecendo as convicções germanistas do poeta, aproveita a deixa:
Quintino, você aderiu! Fumando Aliados!
E o poeta sem titubear:  – são os mais fracos!
O café Riche encerou as atividades no dia 31 de dezembro de 1923. O Diário do Ceará, de 3 de janeiro de 1924, deu uma nota bem circunstanciada a respeito da ocorrência, uma nota escrita com tons literários sob o título: : “cerrou as portas o Café Riche”. O café famoso durara menos de dez anos.


fotos do Arquivo Nirez
Extraído do livro
Fortaleza de Ontem e de Anteontem, de Edigar de Alencar     


quinta-feira, 19 de julho de 2012

Os Bairros dos Ricos e os Impasses Urbanos

No inicio dos anos 1950 a Aldeota começava a se consolidar como espaço da burguesia, que exercia a sua hegemonia nos diferentes setores da vida urbana. A cidade passou a se guiar pelo modo de vida oriundo da cultura das elites, que exerciam um controle sobre a vida urbana.
Os bairros elegantes ainda eram Jacarecanga e Benfica. O primeiro, até os anos quarenta era conhecido como o mais aristocrático. O palacete de José Gentil no Benfica rivalizava em ostentação com o da família de Pedro Philomeno Gomes, no Jacarecanga, onde havia casas copiadas de modelos europeus.


Residência de José Gentil, no Benfica. Ampliado, atualmente o prédio é ocupado pela Reitoria da Universidade Federal do Ceará.

Foi nesse período que a Aldeota começou a crescer, mas limitava-se ao final da linha dos bondes, entre as ruas Silva Paulet e Jose Vilar. Havia o castelo do Plácido de Carvalho, comerciante que, para homenagear a mulher de origem italiana, mandara construir a residência nos moldes de um castelo florentino.  Em 1954 o edifício chegou a ser objeto de debates na Câmara Municipal, em razão de um requerimento do vereador Pedro Paulo, que solicitava ao Governo do Estado que adquirisse o palacete da viúva de Plácido de Carvalho, a fim de transformá-lo em residência governamental com a denominação de Palacete Verdes Mares. O requerimento foi rejeitado pela câmara.


Palácio do Plácido, que foi objeto de um projeto para a compra pelo Governo do Estado, quando receberia a denominação de Palacete Verdes Mares. O projeto foi recusado, e o palácio acabou demolido alguns anos mais tarde, em 1974. 

O bairro mais distante era São Gerardo, antigo Alagadiço, Messejana, Parangaba e Antônio Bezerra ainda se apresentavam com aspectos de cidades interioranas. O plano de Fortaleza, de 1952, de autoria do engenheiro Saboia Ribeiro, lesava o interesse dominante relativo à preservação dos prédios localizados no centro da cidade, que seriam atingidos pelo projeto. Por isso seus partidários eram poucos, sendo a polemica sobre o plano orientada por uma comissão presidida pelo prefeito e composto, em sua maioria, por componentes de várias entidades públicas e particulares.
Aprovado pela Câmara Municipal em 1952, juntamente com o Código de Obras da Prefeitura, não constava do projeto a regulamentação relativa aos recursos que seriam utilizados para alargar algumas ruas do centro, pois ficariam a cargo de uma comissão responsável. Desse modo, o plano foi alterado com a aprovação do novo código. Os recuos previstos nas ruas centrais foram rejeitados para não contrariar interesses dos proprietários da zona comercial. O argumento usado pelos defensores da preservação da área central foi a precária condição financeira do município, que impediu a concretização do projeto. Consequentemente, a Rua General Sampaio não foi alargada, o que facilitaria o fluxo urbano. O alargamento só foi permitido no sentido norte-sul. As ruas que corriam de leste a oeste, como Liberato Barroso, Senador Alencar e João Moreira poderiam ser alargadas. 


Cruzamento da Rua Liberato Barroso com a Rua Barão do Rio Branco (década de 50)

O acesso à Praça do Ferreira continuou a ser feito por meio de ruas estreitas, para não onerar o município, menos beneficiado do que os interesses imobiliários privados. O plano fora considerado inviável porque indicava o alargamento de diversas avenidas, como a Dom Manuel, a Duque de Caxias e a Avenida Imperador. Edifícios como o Jangada e o Sul América seriam atingidos, além da área dos cines São Luiz, Diogo e do próprio Hotel Excelsior que seriam destruídos. 


cruzamento da Rua Barão do Rio Branco com a Guilherme Rocha

Ante a pressão da elite, o próprio Dr. Saboia Ribeiro concordou que as ruas centrais permanecessem em seu estado original, mas que o número de andares dos edifícios ficasse limitado a dois. Apesar do predomínio de edifícios comerciais, ainda havia residências no centro, ocupadas por pessoas de classe média, a maior parte, imóveis recebidos por meio de heranças. Em sua maioria eram casas conjugadas, com instalações nem sempre atualizadas.  A escritora Rachel de Queiroz certa feita impressionou-se coma má administração e o desleixo na recuperação dos prédios em Fortaleza. Até mesmo alguns  que tinham sido atingidos por incêndios, apesar de localizados na área central, não eram reconstruídos de imediato. Só na Rua Major Facundo havia três, na Floriano Peixoto também tinha uma casa, incendiada desde a 2ª. Guerra. Na própria Praça do Ferreira o espaço outrora ocupado pelo armazém Pan-America, permanecia interditado.


Rua Gonçalves Ledo

Quando a Aldeota ainda não se tornara o bairro mais valorizado de Fortaleza, diversas famílias de melhores posses residiam na Praia de Iracema. Em decorrência do projeto de construção da futura avenida que ligava a Praia de Iracema ao Mucuripe, onde o porto estava sendo concluído, fora feito um levantamento topográfico da área litorânea em janeiro de 1945, partindo do entroncamento da igreja de São Pedro, até o porto. 


construção da avenida Beira-Mar

Previa-se no plano, o alargamento de terrenos situados a cem metros à direita da linha férrea. Pretendia-se assim, que a antiga sede do Náutico Atlético cearense, a conhecida Casa de Recreio do “Sr. Johnson” e outros edifícios residenciais importantes fossem desapropriados. Os proprietários de áreas valorizadas defendiam a instalação do porto, desde que não afetasse seus interesses.


casas residenciais na Praia de Iracema (foto do livro Ah, Fortaleza!)

Casas destruídas pela força das marés na Rua Pacajus. O hotel Pacajus , na mesma via, também foi afetado 

Muitas das residências da Praia de Iracema foram abandonadas ou destruídas, principalmente pelo avanço das marés, em decorrência das obras de construção do porto. O impulso das ondas passou a interromper o trânsito na Praia de Iracema. Estimava-se que uns duzentos metros de extensão de praia iam sendo atingidos pelas marés. As águas chegaram a atingir os trilhos dos bondes, avançando até as casa localizadas no outro lado da rua. O conhecido Hotel Pacajus, que abrigava até cinquenta hóspedes, ia perdendo a clientela ante a ameaça de desabamento do prédio.
A obra de implantação do porto e a consequente destruição da Praia de Iracema testemunhavam a contradição entre as medidas voltadas às melhorias urbanas, a cargo das autoridades locais, e os resultados concretos obtidos. A  viabilização de melhor escoamento da produção por via marítima traria benefícios à economia local, mas o preço pago pelo progresso foi a destruição da beleza natural da Praia de Iracema, inviabilizando a permanência dos que ali residiam. 


Avenida Santos Dumont cruzamento com a Avenida Barão de Studart

Compreende-se desse modo, o motivo da valorização da Aldeota como novo polo citadino. Contudo, a transferência para o futuro bairro da elite não se fez de forma súbita, pois apesar do avanço do mar em 1952, ainda surgiam novas casas na Praia de Iracema. Interessante é que o ano de seca, 1951, parece ter contribuído para o aumento do índice de edificações em Fortaleza. Com a mão-de-obra mais barata e o crescente aumento dos preços dos aluguéis incentivou a construção. Calcula-se em oitenta milhões de cruzeiros a quantia gasta em construções no ano de 1951. 
Dois anos depois já se dizia que a Praia de Iracema não mais existia. Restavam apenas alguns trechos do antigo local pitoresco da cidade.



fotos do Arquivo Nirez
Extraído do livro
Verso e reverso do perfil urbano de Fortaleza, de
Gisafran Nazareno Mota Jucá
    

segunda-feira, 16 de julho de 2012

O longo Caminho entre a Vila Nova de Arronches e o Bairro da Parangaba


Praça dos Caboclinhos

Imóvel antigo

A Parangaba foi formada a partir de um aldeamento, também chamado de missões, áreas em que se erguiam espécies de aldeias indígenas artificiais –  diferentes das aldeias originais dos nativos – para onde os jesuítas conduziam e mantinham os índios da região, no intuito de convertê-los ao catolicismo. A ideia era manter os nativos sob constante vigilância dos padres, os quais deveriam funcionar como guias, para que sua cultura ancestral fosse esquecida.  Quando os jesuítas foram expulsos do Brasil pelo Marquês de Pombal, já na segunda metade do século XVIII, alguns aldeamentos foram transformados vilas. Os jesuítas tiveram seus bens sequestrados e deixaram a administração das vilas indígenas, que ficaram a cargo de diretores. A Lei do chamado Diretório Pombalino era de 1758, mas foi implementada no Ceará no ano seguinte.  A partir desse fato surgiram as vilas de Viçosa do Ceará,  Vila Nova de Soures,  e Vila Nova de Arronches, em 1759. No ano seguinte – 1760 – foi criada a Vila Nova de Messejana, e em 1764, as Vilas de Monte-mor-Novo (Baturité) e Crato. Eram as chamadas “vilas de índios”. Três dessas vilas ficavam nos arredores de Fortaleza: Soures (Caucaia), Arronches (Parangaba) Messejana (Paupina).

foto MIS

Paróquia de Bom Jesus dos Aflitos

A Vila Nova de Arronches foi incorporada a Fortaleza pela lei n° 2, de 13 de maio de 1835; depois foi restaurado município pela lei n° 2097, de 25 de novembro de 1885, com o nome de Porangaba;  uma nova lei, a de n° 1913, de 31 de outubro de 1921, incorpora novamente o município à capital. 
No século VVIII, o  Arronches  se destaca como ponto intermediário no transporte de gado, com a estrada do Barro Vermelho-Parangaba, estrada que ligava o bairro Antônio Bezerra a  Parangaba; e a Estrada da Paranjana,  que ligava a Messejana a Parangaba.


A estação ferroviária foi inaugurada em 1873 com o nome de Arronches. Na época, era um município, que acabou sendo anexado a Fortaleza nos anos 1920. Em janeiro de 1944 teve o nome alterado para Parangaba, por determinação do  Conselho Nacional de Geografia. Era este o nome de antigo aldeamento dos jesuítas.  (foto do site estações ferroviárias)

O trem metropolitano veio substituir a antiga composição ferroviária. O trecho Parangaba/Pacatuba foi inaugurado no final do primeiro semestre de 2012, depois de 13 anos de espera por parte da população.   

Com a inauguração da Estrada de Ferro de Baturité, em 1872, uma estação de trem é instalada no ano seguinte, a Estação de Arronches, e Parangaba estava ligada com a Capital. Em 1941, a malha ferroviária de Parangaba é expandida com direção ao Mucuripe e em 1944 o nome da estação é alterado para Parangaba. Esta estação é nos dias de hoje parte do metrô de Fortaleza.


A feira a céu aberto, é uma das marcas registradas do bairro, onde são comercializadas todo tipo de mercadorias, lícitas e ilicitas. A desorganização, a sujeira e a grande diversidade são caracteristicas do lugar, frequentado por multidões de compradores.

Nos anos 1960, de acordo com o Guia Turistico da Cidade, publicado pela Prefeitura de Fortaleza, a a cidade era dividida em Distritos, na conformidade da lei de divisão territorial do Estado, a saber: Distrito Central, de Messejana, de Parangaba e de Antônio Bezerra. 
o Distrito de Parangaba limitava-se ao Norte, pela Avenida Carneiro de Mendonça e Estrada do Pici; a Leste pelas Ruas Peru, Casimiro de Abreu, e Avenida Godofredo Maciel; ao sul pela Estrada Parangaba-Messejana e Ruas Nereu Ramos e Júlio Braga; e a Oeste, pela Rua Augusto dos Anjos e seu prolongamento ideal, estrada de Caucaia e Rua General Osório de Paiva.

 As garças e outros pássaros aquáticos estão de volta à lagoa da Parangaba
 com aproximadamente 41 hectares de área e profundidade máxima de 4,6 metros, a Lagoa da Parangaba é a principal referência do bairro. As margens estão repletas de lixo, principalmente nas proximidades da feira. Pertence à Bacia hidrográfica do Rio Maranguapinho

O distrito englobava os seguintes bairros: Parangaba (sede do Distrito), Taperi (e não Itaperi), Maraponga, Vila Peri, Bonsucesso, São Cristóvão, Marupiara, Pan-Americano, Bela Vista, Vila União, Dias Macedo e Alto da Balança.  
A expansão da cidade, e principalmente a atuação de vereadores da capital, desejosos de prestar homenagens, muitas vezes, a ilustrissimos desconhecidos, provocou a mudança de nome de muitos desses bairros e logradouros.    


fotos de julho/2012
por Rodrigo Paiva e Fátima Garcia
pesquisa:
História do Ceará, de Airton de Farias
Guia Turistico da Cidade - Prefeitura Municipal de Fortaleza, administração do General Manuel Cordeiro Neto, 1961.
wikipédia

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Conjunto Prefeito José Walter


Conjunto Prefeito José Walter em 1972 (Arquivo Nirez)

Nos anos 1970, vários conjuntos habitacionais foram construídos em Fortaleza com base na política do Banco Nacional de Habitação (BNH), que utilizava recursos do FGTS para financiar habitações populares. O primeiro deles, localizado na zona Oeste de Fortaleza, foi o Prefeito José Walter, construído  entre 1967 e 1970.
A maioria dos conjuntos foi implantada em áreas distantes, na direção do Distrito Industrial de Maracanaú e junto ao leito das vias férreas.
As propagandas referentes a esses Conjuntos Habitacionais se utilizavam do sonho, da maioria dos eventuais compradores,  de ter sua casa própria que seria construída em um local distante da cidade, porém com toda a infraestrutura necessária, como água encanada, fornecimento de energia, saneamento básico, escolas, igrejas, parques, posto de saúde, transporte. Propagandas em grande parte enganosas que fizeram com que muitos saíssem do aluguel e fossem morar num bairro isolado localizado no distrito de Mondubim. Na realidade, o conjunto foi entregue somente com as casas. 
Estes conjuntos foram fundamentais para a expansão da cidade. Os moradores, uma vez instalados, passaram a exigir infraestrutura e serviços, os quais favoreciam a valorização dos vazios urbanos. 

 Capela do Cristo Ressuscitado fica na Avenida João Araújo de Lima, 3ª Etapa

Igreja Matriz Santissima Trindade
A Paróquia da Santissima Trindade foi criada a 5 de fevereiro de 1971, por decreto do então Arcebispo de Fortaleza , Dom José de Medeiros Delgado, assinado por ele durante uma missa solene que recebeu o mesmo nome da paróquia. Antes de sua conclusão , as missas semanais eram na Capela da Casa dos Padres Sacramentinos, na Rua 65, n° 40, onde também funcionava a secretaria.

O Conjunto Prefeito José Walter começou a ser habitado em 1970, no bairro do Mondubim, no limite de Fortaleza com Maracanaú, numa área originalmente ocupada pelo antigo Núcleo Integrado Habitacional do Mondubim, que era habitada por inúmeras famílias pobres. Foi projetado pelo arquiteto Marrocos Aragão seguindo o modelo de cidade planejada. Possui 4 etapas tendo o modelo original projetado com 5500 casas. Em sua inauguração foi considerado o maior conjunto habitacional da América Latina.


Lagoa do Catão, uma das áreas de lazer mais procurada pelos moradores, está cercada de lixo e com mato crescido ao redor. Ainda assim, é um belo cenário.

O Conjunto está limitado ao Norte pelos bairros Passaré e Parque Dois Irmãos;Ao Sul, pelo Bairro Pajuçara (Maracanaú); a Leste pelo Conjunto Palmeiras; e a Oeste, pelos bairros Mondubim e Planalto Airton Sena.


Todas as avenidas do bairro possuem árvores antigas - figueiras, juazeiros, castanholas - o que termina causando uma sensação térmica muito agradável. Moradores do bairro dizem que a temperatura ali é mais amena, e que os termômetros chegam a marcar em média 2 graus abaixo da temperatura de outras regiões da cidade. 


Quando foi inaugurado, o Conjunto Prefeito José Walter contava com 5.500 casas. Hoje, já são mais de 26 mil pessoas residindo no local, de acordo com o último Censo Demográfico do IBGE. O bairro é arborizado, possui vários campos de futebol e lembra cidades tranquilas do Interior, com suas ruas estreitas e numeradas.




Em 1969 a primeira etapa do conjunto habitacional foi inaugurada e recebeu o nome do Prefeito de Fortaleza, José Walter. Pouco tempo depois, a segunda e terceira etapa foram construídas , enquanto a quarta etapa somente foi inaugurada na gestão do sucessor de José Walter na prefeitura, Vicente Fialho.
Hoje o conjunto Prefeito José Walter se constitui numa comunidade periférica de Fortaleza que teve suas conquistas sociais quanto à prestação de serviços,  educação e transportes, mas continua carente nas áreas de preservação e proteção das seus espaços públicos e áreas verdes, manutenção das vias e, principalmente,  de segurança pública, tantas vezes exposta pela ação violenta de meliantes e vândalos, que trazem o medo e a sensação de abandono por parte das autoridades competentes.

Fotos de julho/2012
por Rodrigo Paiva e Fátima Garcia 

pesquisa:
wikipédia
portal José Walter 
jornal Diário do Nordeste
artigo O Processo de Constituição do Conjunto Habitacional Prefeito José Walter, de Marise Magalhães Olímpio.