No inicio dos anos 1950 a Aldeota começava a se consolidar
como espaço da burguesia, que exercia a sua hegemonia nos diferentes setores da
vida urbana. A cidade passou a se guiar pelo modo de vida oriundo da cultura
das elites, que exerciam um controle sobre a vida urbana.
Os bairros elegantes ainda eram Jacarecanga e Benfica. O
primeiro, até os anos quarenta era conhecido como o mais aristocrático. O
palacete de José Gentil no Benfica rivalizava em ostentação com o da família de
Pedro Philomeno Gomes, no Jacarecanga, onde havia casas copiadas de modelos
europeus.
Residência de José Gentil, no Benfica. Ampliado, atualmente o prédio é ocupado pela Reitoria da Universidade Federal do Ceará.
Foi nesse período que a Aldeota começou a crescer, mas
limitava-se ao final da linha dos bondes, entre as ruas Silva Paulet e Jose
Vilar. Havia o castelo do Plácido de Carvalho, comerciante que, para homenagear
a mulher de origem italiana, mandara construir a residência nos moldes de um
castelo florentino. Em 1954 o edifício
chegou a ser objeto de debates na Câmara Municipal, em razão de um requerimento
do vereador Pedro Paulo, que solicitava ao Governo do Estado que adquirisse o
palacete da viúva de Plácido de Carvalho, a fim de transformá-lo em residência
governamental com a denominação de Palacete Verdes Mares. O requerimento foi
rejeitado pela câmara.
Palácio do Plácido, que foi objeto de um projeto para a compra pelo Governo do Estado, quando receberia a denominação de Palacete Verdes Mares. O projeto foi recusado, e o palácio acabou demolido alguns anos mais tarde, em 1974.
O bairro mais distante era São Gerardo, antigo Alagadiço, Messejana, Parangaba e Antônio Bezerra ainda se apresentavam com aspectos de
cidades interioranas. O plano de Fortaleza, de 1952, de autoria do engenheiro
Saboia Ribeiro, lesava o interesse dominante relativo à preservação dos prédios
localizados no centro da cidade, que seriam atingidos pelo projeto. Por isso
seus partidários eram poucos, sendo a polemica sobre o plano orientada por uma
comissão presidida pelo prefeito e composto, em sua maioria, por componentes de
várias entidades públicas e particulares.
Aprovado pela Câmara Municipal em 1952, juntamente com o
Código de Obras da Prefeitura, não constava do projeto a regulamentação
relativa aos recursos que seriam utilizados para alargar algumas ruas do
centro, pois ficariam a cargo de uma comissão responsável. Desse modo, o plano
foi alterado com a aprovação do novo código. Os recuos previstos nas ruas
centrais foram rejeitados para não contrariar interesses dos proprietários da zona
comercial. O argumento usado pelos defensores da preservação da área central
foi a precária condição financeira do município, que impediu a concretização do
projeto. Consequentemente, a Rua General Sampaio não foi alargada, o que
facilitaria o fluxo urbano. O alargamento só foi permitido no sentido
norte-sul. As ruas que corriam de leste a oeste, como Liberato Barroso, Senador
Alencar e João Moreira poderiam ser alargadas.
O acesso à Praça do Ferreira continuou a ser feito por meio de ruas estreitas, para não onerar o município, menos beneficiado do que os interesses imobiliários privados. O plano fora considerado inviável porque indicava o alargamento de diversas avenidas, como a Dom Manuel, a Duque de Caxias e a Avenida Imperador. Edifícios como o Jangada e o Sul América seriam atingidos, além da área dos cines São Luiz, Diogo e do próprio Hotel Excelsior que seriam destruídos.
Ante a pressão da elite, o
próprio Dr. Saboia Ribeiro concordou que as ruas centrais permanecessem em seu
estado original, mas que o número de andares dos edifícios ficasse limitado a
dois. Apesar do predomínio de edifícios comerciais, ainda havia residências no
centro, ocupadas por pessoas de classe média, a maior parte, imóveis recebidos
por meio de heranças. Em sua maioria eram casas conjugadas, com instalações nem
sempre atualizadas. A escritora Rachel
de Queiroz certa feita impressionou-se coma má administração e o desleixo na
recuperação dos prédios em Fortaleza. Até mesmo alguns que tinham sido atingidos por incêndios,
apesar de localizados na área central, não eram reconstruídos de imediato. Só
na Rua Major Facundo havia três, na Floriano Peixoto também tinha uma casa,
incendiada desde a 2ª. Guerra. Na própria Praça do Ferreira o espaço outrora
ocupado pelo armazém Pan-America, permanecia interditado.
Cruzamento da Rua Liberato Barroso com a Rua Barão do Rio Branco (década de 50)
O acesso à Praça do Ferreira continuou a ser feito por meio de ruas estreitas, para não onerar o município, menos beneficiado do que os interesses imobiliários privados. O plano fora considerado inviável porque indicava o alargamento de diversas avenidas, como a Dom Manuel, a Duque de Caxias e a Avenida Imperador. Edifícios como o Jangada e o Sul América seriam atingidos, além da área dos cines São Luiz, Diogo e do próprio Hotel Excelsior que seriam destruídos.
cruzamento da Rua Barão do Rio Branco com a Guilherme Rocha
Rua Gonçalves Ledo
Quando a Aldeota ainda não se tornara o bairro mais
valorizado de Fortaleza, diversas famílias de melhores posses residiam na Praia
de Iracema. Em decorrência do projeto de construção da futura avenida que
ligava a Praia de Iracema ao Mucuripe, onde o porto estava sendo concluído,
fora feito um levantamento topográfico da área litorânea em janeiro de 1945,
partindo do entroncamento da igreja de São Pedro, até o porto.
construção da avenida Beira-Mar
Previa-se no
plano, o alargamento de terrenos situados a cem metros à direita da linha férrea.
Pretendia-se assim, que a antiga sede do Náutico Atlético cearense, a conhecida
Casa de Recreio do “Sr. Johnson” e outros edifícios residenciais importantes
fossem desapropriados. Os proprietários de áreas valorizadas defendiam a
instalação do porto, desde que não afetasse seus interesses.
casas residenciais na Praia de Iracema (foto do livro Ah, Fortaleza!)
Casas destruídas pela força das marés na Rua Pacajus. O hotel Pacajus , na mesma via, também foi afetado
Muitas das
residências da Praia de Iracema foram abandonadas ou destruídas, principalmente
pelo avanço das marés, em decorrência das obras de construção do porto. O impulso
das ondas passou a interromper o trânsito na Praia de Iracema. Estimava-se que
uns duzentos metros de extensão de praia iam sendo atingidos pelas marés. As águas
chegaram a atingir os trilhos dos bondes, avançando até as casa localizadas no
outro lado da rua. O conhecido Hotel Pacajus, que abrigava até cinquenta
hóspedes, ia perdendo a clientela ante a ameaça de desabamento do prédio.
A obra de implantação do porto e a consequente destruição da
Praia de Iracema testemunhavam a contradição entre as medidas voltadas às
melhorias urbanas, a cargo das autoridades locais, e os resultados concretos
obtidos. A viabilização de melhor
escoamento da produção por via marítima traria benefícios à economia local, mas
o preço pago pelo progresso foi a destruição da beleza natural da Praia de
Iracema, inviabilizando a permanência dos que ali residiam.
Avenida Santos Dumont cruzamento com a Avenida Barão de Studart
Compreende-se desse
modo, o motivo da valorização da Aldeota como novo polo citadino. Contudo, a transferência
para o futuro bairro da elite não se fez de forma súbita, pois apesar do avanço
do mar em 1952, ainda surgiam novas casas na Praia de Iracema. Interessante é
que o ano de seca, 1951, parece ter contribuído para o aumento do índice de
edificações em Fortaleza. Com a mão-de-obra mais barata e o crescente aumento
dos preços dos aluguéis incentivou a construção. Calcula-se em oitenta milhões de
cruzeiros a quantia gasta em construções no ano de 1951.
Dois anos depois já se
dizia que a Praia de Iracema não mais existia. Restavam apenas alguns trechos
do antigo local pitoresco da cidade.
fotos do Arquivo Nirez
Extraído do
livro
Verso e
reverso do perfil urbano de Fortaleza, de
Gisafran
Nazareno Mota Jucá
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