sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Os Pracinhas da FEB em Campanha na Itália


A 2ª. Guerra Mundial começou em 1939, quando a Alemanha nazista liderada por Adolf Hitler invadiu a Polônia. Para os Estados Unidos o início do conflito foi a 7 de dezembro de 1941, quando a Marinha Imperial Japonesa atacou a base americana de Pearl Harbor, localizada no Havaí.

antes de embarcarem, os pracinhas desfilaram na Rua Barão do Rio Branco, no centro de Fortaleza

Para o Brasil começou no dia 31 de agosto de 1942, quando Getúlio Vargas declarou guerra ao Eixo (formado por Alemanha, Itália e Japão), depois que submarinos alemães, objetivando acabar com as rotas comerciais marítimas que ligavam Brasil e Estados Unidos, atacaram e levaram a pique, diversos navios mercantes brasileiros. A partir de então o Brasil passou a fazer parte da guerra, mas antes de ir à luta, precisaria formar um exército, treiná-lo, armá-lo e mandá-lo para um front.

antes de embarcar para o front, os brasileiros precisaram passar por um treinamento militar nos moldes dos soldados norte-americanos. Em Fortaleza o treinamento foi no 23 BC

Ficou acertado que o Brasil enviaria três divisões de soldados, e tudo que envolvesse uniforme, armamento, treinamento, além do envio das tropas para o campo de batalha, seria de responsabilidade dos americanos já que eles estariam comandando as tropas brasileiras.

E começou o alistamento: sorteados e voluntários passariam por uma inspeção médica para avaliação das condições de saúde dos futuros combatentes. Dos 200 mil convocados, cerca de 60 mil deveriam estar aptos. Das exigências básicas para seleção estavam: pesar mais de 60 kg, altura mínima de 1,60 m e ter no mínimo 26 dentes.

A Força Expedicionária Brasileira e a divisão da força aérea, combateram na Itália sobre os Apeninos Tosco-Emilianos. Os sucessos mais significativos foram a conquista de Monte Castello, no território Bolonhês de Gaggio Montano, a libertação de Montese e a captura entre Solecchio e Fornovo na província de Parma, da 148ª divisão alemã.

O maior número de perdas aconteceu em Montese e Monte Castello. A FEB era comandada pelo general João Batista Mascarenhas de Moraes e foi agregada ao 5º exército americano comandado pelo general Mark W. Clark. Contava com 25.334 homens, dos quais 15.069 participaram ativamente dos combates. Chegaram à Itália, no dia 16 de julho de 1944.

Depois de ocuparem algumas localidades na zona de Camaiore, os brasileiros que começaram como força auxiliar ou de apoio, foram designados, em novembro do mesmo ano, para um novo setor de guerra, o vale do Rio Reno, encontrando-se na linha de frente. Monte Castello que se encontrava sob domínio alemão, resistiu a quatro ataques das forças aliadas e foi conquistado pelos brasileiros, no dia 21 de fevereiro de 1945. No dia anterior, os homens da 10ª divisão de montanha haviam expulsado os alemães do vizinho e mais importante monte, o Belvedere. Tomada a encosta, os aliados pararam o avanço.

Do alto daquelas montanhas controlavam parte do vale do rio Reno e parte do vale do rio Panaro. A vizinha Montese cuja montanha Montello ao norte declinava velozmente de encontro à planície com as cidades de Modena e Bologna estavam nas mãos dos alemães. O ataque a este centro, que era mais uma “cidade fantasma” porque a população fora deslocada para outros locais, aconteceu no dia 14 de abril. Na madrugada daquele dia iniciaram intensos bombardeios. Era o prelúdio de um ataque que se iniciou as 13:30hs. Com pouco menos de duas horas do início da batalha, os soldados brasileiros entraram na cidade de Montese.

Naquele momento o principal objetivo era a conquista das vizinhas elevações ao norte, montes Buffone e Montello. Passaram outros três dias de luta, com dezenas de mortos de ambas as partes. Na noite entre os dias 18 e 19, os alemães se retiraram. O cume do Monte Buffone tornou-se terra de ninguém e Montello nunca foi conquistado pelos aliados.

Na Itália, o comandante da tropa, general Mark Clark e o comandante da FEB, general Mascarenhas de Moraes

Em 21 de abril, os soldados da FEB conquistaram Zocca e prosseguiram para Vignola, Maranello, Sassuolo, Scandiano, e Montecchio. Chegaram às colinas da região de Parma antes da Planície do rio Pó. De 26 a 30 de abril, entre Colecchio e Fornovo, bloquearam a estrada onde se encontravam unidades alemãs pertencentes a 148° divisão, que foram atacados pelos flancos, pela resistência que descia os montes rumo ao norte.

Juntamente com as tropas entregaram-se o general Otto Fretter Pico, comandante da 148° Divisão e o general Mario Carloni, comandante da divisão da República Social Italiana. Em rápida marcha, a FEB prosseguiu rumo a Placenza e Alessandria. Alguns grupos chegaram à fronteira com a França.

Ao final de 239 dias de campanha na Itália, as tropas brasileiras registraram 465 mortos, 2.722 feridos, 35 prisioneiros e 16 desaparecidos; capturaram 20.573 homens. Montese foi um dos municípios pertencentes a província de Modena, a mais devastada durante a guerra, com 833 casas destruídas das 1.121 existentes, 189 civis mortos, além de 700 feridos ou mutilados em explosões de minas e outros tipos de armas bélicas.

pracinha Sebastião Alves do Prado, em seu uniforme da FEB, na Itália em 1945. Participou ativamente da Batalha do Montese. Retornou ao Brasil logo depois do fim do conflito.

De volta ao Brasil, os combatentes foram recebidos com honras e homenagens. Passada a euforia pela volta, os agora ex-soldados queriam retomar suas vidas, seguir em seus empregos de antes, voltar às suas rotinas. Porém, participar de uma guerra não é um fardo leve para muitos homens, e logo surgiram problemas como dificuldades de relacionamento não só no seio da família, mas também em sociedade.

Ao contrário de outras nações aliadas, as autoridades brasileiras não se planejaram para dar assistência e trabalho aos ex-combatentes. Os que eram militares de carreira sofreram algumas dificuldades de adaptação, mas retomaram seus cargos e patentes, com todos os direitos e benefícios que a carreira militar assegurava.

Quanto aos expedicionários civis o tratamento dispensado foi outro: apenas promoveram a dissolução e desmobilização das unidades, e deixaram os homens sem trabalho, sem assistência médica ou psicológica, com as famílias desestruturadas. Foram abandonados pelo governo. Muitos anos após a volta para casa é que conseguiram direito a uma pensão que pode ser estendida aos herdeiros. 


De acordo com dados fornecidos pela Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira – ANVFEB – Regional de Fortaleza, o efetivo da FEB foi de 25.334 homens do Exército e da Aeronáutica. Desse total morreram 465 entre oficiais e praças, dentre estes seis cearenses: 

Hermínio Aurélio Sampaio, 2° sargento do Exército, natural de Crateús. Faleceu no dia 12 de dezembro de 1944, na batalha de Monte Castello. 

Francisco Firmino Pinho, 2º sargento do Exército, natural de Quixeramobim. Faleceu no dia 11 de novembro de 1944, na localidade de Valdidura. 

Edson Sales de Oliveira, 3° sargento do exército, natural de Jaguaruana. Faleceu no dia 14 de abril de 1945, na batalha de Montese. 

Francisco de Castro, 3º sargento do Exército natural do antigo Distrito de São Bento, hoje município de Amontada. Faleceu no dia 22 de abril de 1945 em ação de combate no povoado de Zocca. 

João Custódio Sampaio, soldado do Exército, natural de Caucaia. Faleceu no dia 22 de maio de 1945, em Parola, 20 dias depois do término da guerra para os brasileiros na Itália. 

Cloves da Cunha Pais de Castro, soldado do exército, natural de Assaré. Faleceu em ação de combate, no dia 24 de janeiro de 1945, próximo a Vastelnuovo quando participava de uma patrulha de reconhecimento de posições nazistas. Foi enterrado em cova rasa pelos alemães, junto a outros dois companheiros.  



Fontes:
Ximenes, Raimundo Nonato. De Pirocaia a Montese: fragmentos históricos. Fortaleza: 2004. 388p.
Soldados do Vale: a história de homens do interior do Ceará que lutaram na Segunda Guerra Mundial. Autor Antônio Marloves Gomes Vieira Júnior. Disponível em >http://uece.br/eventos/eehce2014/anais/trabalhos_completos/103-9148-30072014-205757.pdf< consulta em 06/11/2019
fotos do livro "De Pirocaia a Montese e sites da Internet 


sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Histórias não Contadas dos Americanos no Ceará


Decorridos 74 anos do fim da segunda Guerra Mundial (1939-1945) ainda permanecem em segredo alguns aspectos do conflito, embora a grande maioria de suas causas e efeitos sejam do conhecimento público, uma vez que os prazos para manutenção do sigilo estejam vencidos, mas nem tudo foi suficientemente esclarecido,  como por exemplo, a presença de uma guarnição americana em Fortaleza.

Base Aérea do Cocorote

Dados não oficiais indicam que passaram em operação pelo aeroporto do Cocorote durante a guerra, cerca de 50 mil aviões dos mais variados tipos e tamanhos e aproximadamente 250 mil soldados americanos. Os vestígios da passagem desse contingente são mínimos, quase nenhum, estando apenas na memória daqueles que de uma forma ou de outra, estiveram próximos das ações.

As provas documentais sobre o que faziam, o que fizeram, quando chegaram, quantos eram, quando saíram e o que deixaram, são igualmente desconhecidas. Não se sabe quem era seu comandante (ou comandantes), permitindo por isso, eventuais deslizes, versões deturpadas ou fantasiosas. Não se tem notícias, por mais breves que sejam, de documentação norte-americana. O pouco que sobrou como fontes primárias faz parte apenas da presença brasileira no conflito.

Festa dos soldados americanos no Estoril/USO - dançando com as Coca-Colas

De certeza, sabe-se apenas que os primeiros americanos que chegaram ao Ceará desembarcaram na pista da Base Aérea construída na década de 1930, entre março e abril de 1940, com o objetivo de encontrar uma área que lhes permitissem construir uma pista para pousos e decolagens.

Nos arquivos da antiga Rede de Viação Cearense existem registros indicando que o ramal Mucuripe-Parangaba foi construído entre fins de 1940, início de 1941 e inaugurado às 17 horas do dia 28 de janeiro de 1941, pelo interventor Menezes Pimentel, em plena guerra.

De concreto sobre a presença americana em Fortaleza no tempo da guerra sabe-se apenas que eles construíram duas bases aéreas, uma no Pici, e outra no Cocorote, para dar sustentação ao seu plano de vigilância e proteção aos navios civis e militares brasileiros e aos aliados nesta parte do Atlântico, uma vez que as forças do Eixo estavam posicionadas nesta direção.

Vista áerea do bairro do Pici em 1972 - imagem Prefeitura de Fortaleza

A base do Pici, construída no segundo semestre de 1941, em 45 dias, foi usada por pouco tempo porque era difícil a chegada de combustível para seus aviões e para os seus tanques. Do ponto de vista aeronáutico, não oferecia boas condições para pousos e decolagens. Foi transformada então, em base de estacionamento dos Blimps.

Para o funcionamento dessas duas bases, existiu uma terceira, uma base naval, uma área de apoio para recebimento de combustível e um cais, localizado no interior da enseada do Mucuripe. Contam os mais velhos que, além dos depósitos para acumular combustíveis, havia edificações administrativas para guardar armamentos e munições. Das duas bases existem alguns poucos resquícios, mas nem tudo que veio dos Estados Unidos para movimentá-las, retornou.

Há informações de centenas de máquinas de escrever e de aparelhos de comunicação (precursores do telex) enterrados até hoje, em fossas localizadas no interior da Base Aérea de Fortaleza. Do pacote enterrado, também faziam parte armamentos, motores e peças de reposição para aviões.  Em face da ausência de documentos comprobatórios, tais notícias ficam na conta das especulações, dos boatos não comprovados. Mas há quem assegure tais informações com extrema convicção.


Porto do Mucuripe no início dos anos 40 - Na área assinalada ficavam os galpões e os tanques de combustível para abastecer os veículos americanos 

Porto do Mucuripe anos 40/50 imagem IBGE

Em fins de 1940 o Porto do Mucuripe já contabilizava a presença sempre crescente de navios em seu cais comercial. Ao seu lado, apenas meia dúzia de casas de palhas e dunas de areias alvíssimas, muitos coqueiros e cajueiros. Seus poucos moradores, sobreviviam exclusivamente da pesca, que era farta e diversificada. Na atual avenida Beira-Mar já existiam algumas casas de pescadores, a igrejinha de São Pedro e uma grande quantidade de pedras na sua frente, onde os moradores se encontravam e se divertiam.

Mucuripe final dos anos 30

Enquanto isso, os soldados e oficiais americanos trabalhavam freneticamente na Ponta do Mucuripe, dando suporte às duas bases aéreas de apoio, localizadas no Pici e no Cocorote. Exerciam uma função estratégica: eram responsáveis pelo recebimento, armazenamento e distribuição de combustível para seus veículos e aviões nas duas unidades, cujo transporte se fazia em tambores lacrados de 200 litros, colocados nas carrocerias dos caminhões ou nos vagões da RVC - Rede de Viação Cearense, para o Cocorote.

Até o desembarque do primeiro americano em Fortaleza, os trens da RVC corriam apenas em duas direções: da Praça Castro Carreira em direção a pedreira da Monguba, em Pacatuba fazendo paradas em Otávio Bonfim, Couto Fernandes, Parangaba, Mondubim, Pajuçara e Maracanaú, e do Mucuripe, pela beira da praia. Existia até uma locomotiva para as “obras do porto do Mucuripe”.

Os americanos construíram em tempo recorde um pequeno cais medindo entre 80 e 100 m de comprimento, para receber material e combustível para abastecimento dos aviões. Os navios de maior porte ficavam ancorados no meio da enseada, de onde através de uma operação precisa, colocavam os tambores em chatas motorizadas, que os levavam até o cais. Os menores, os petroleiros, atracavam sem problemas. Testemunhas relatam que eles trabalhavam dia e noite, retirando tambores de óleo e gasolina, transportando-os para os tanques instalados na base onde depois foi instalado a Lubnor.

Ramal Ferroviário Parangaba-Mucuripe - imagem IBGE

Desse cais que hoje está soterrado, bem como da pequena estrada de asfalto que dava acesso aos depósitos, não existe mais nem sinal. Ambos eram vigiados por homens armados de metralhadoras. Depois da guerra esses tanques passaram para a Esso e esta para a Petrobrás.  Centenas de tambores ainda com gasolina foram distribuídos entre as empresas americanas instaladas no Mucuripe, visto que não era negócio levá-los de volta, para os Estados Unidos.

Um antigo funcionário da Lubnor e professor de História, relatou que a gasolina azul, que chegava para os americanos, era procedente de uma base americana instalada em Aruba. Sobre os vestígios dessa unidade, ele lembra de tê-los visto “próximos da bacia de decantação do tanque F-201 para o lado da estação, onde se fazia a mistura de diluente com asfalto. Se não as derrubaram, ainda estão lá”. 

No período da 2ª Guerra, o Brasil se encontrava sob a ditadura de Getúlio Vargas (1937-1945). Com o golpe do Estado Novo, as Casas Legislativas foram fechadas; o Governo Federal escolhia os governadores do Estado, e estes, nomeavam os prefeitos. No Ceará estavam no comando o Interventor Menezes Pimentel (1935-1945), e o chefe da municipalidade era o prefeito Raimundo de Alencar Araripe (1936-1945). Ambos foram eleitos pelo voto popular, e após o golpe de 1937, foram mantidos nos cargos por Getúlio Vargas.
   
O governo de Menezes Pimentel, seguindo uma tendência (orientação) do que ocorria a nível nacional, foi marcado pelo autoritarismo, perseguição aos adversários políticos, destituição de prefeitos e funcionários públicos que não apoiassem o seu grupo político. Cerca de duas mil pessoas foram presas em Fortaleza neste período. E a transparência não fazia parte desse governo.

É possível que as autoridades norte-americanas tenham prestado todas as informações cabíveis, acerca de suas operações na cidade; é possível que os governantes locais soubessem quem estava no comando das ações americanas; é possível até que interagissem com os estrangeiros. Mas, devido a natureza singular da situação – guerra mundial – ditadura local – pode ser que essas autoridades tenham julgado conveniente manter-se calados com relação aos detalhes, mesmo depois de passado o prazo para guarda do sigilo. Ou talvez não tenha mesmo documentação alguma, eles vieram e se foram sem se reportar a ninguém; Seja como for, ainda há muitas respostas que não foram dadas e muitas perguntas que não foram feitas.

Fontes: 
Caravelas, Jangadas e Navios, uma história portuária de Rodolfo Espínola
História do Ceará, de Airton de Farias
O Povo
Fotos do livro Caravelas, Jangadas e Navios


quinta-feira, 20 de junho de 2019

O Primeiro Governador Republicano do Ceará


Os ideais republicanos já se manifestavam no Ceará desde os movimentos revolucionários de 1817 e 1824, quando figuras como Tristão Gonçalves, Padre Mororó, Pessoa Anta, Ibiapina, Carapinima e Azevedo Bolão deram a própria vida pela Confederação do Equador. Mas somente em 1889 o objetivo seria alcançado.

Praça Capistrano de Abreu atual Praça Waldemar Falcão. À esquerda, parte do prédio onde funcionava a Assembleia Legislativa do Ceará.

A Proclamação da República foi consequência de alguns acontecimentos que agitavam o quadro político da época, tais como a questão religiosa, que colocou o Clero contra o Imperador em face das prisões dos bispos D. Macedo Costa e Frei Vital Maria Gonçalves; a questão militar, o Exército ameaçado de dissolução pelo Ministério Liberal, em favor de milícias; a abolição da escravatura decretada pela Princesa Isabel anos antes, e com imensa repercussão na produção agropecuária, principal fonte de riqueza nacional; a falta de sucessor para o velho imperador D. Pedro II, vez que a princesa Isabel era casada com o Conde D’Eu, francês, o qual militarmente, saiu muito comprometido na Guerra do Paraguai; a propaganda republicana nos Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Pernambuco, que vinha desde os movimentos de 1817 e 1824.

Outros motivos que também influíram para um novo tempo republicano, foram o desprestígio em que haviam caído os partidos monárquicos, os ressentimentos oriundos do ato da abolição, o ascendente adquirido pelas forças depois da campanha do Paraguai, a inábil política dos ministérios – tais como os fatores do movimento revolucionário que teve seu desfecho na deposição de D. Pedro II e consequente proclamação da república pelo marechal Manoel Deodoro da Fonseca, a 15 de novembro de 1889.

Luiz Antônio Ferraz - primeiro governador republicano do Ceará

O escritor Eduardo Bezerra conta como o Ceará recebeu os acontecimentos: “O telégrafo trouxe para Fortaleza a notícia da queda da Monarquia e a Proclamação da República as 4 horas da tarde do dia 15 de novembro. Ao tomar conhecimento do fato, o coronel Jerônimo Rodrigues de Moraes Jardim, último presidente da província, reuniu os comandantes da Força Pública e os chefes políticos para dar ciência oficial do acontecimento e participar o teor do telegrama de pedido de esclarecimentos e motivos que enviou ao presidente do Conselho de Ministros no Rio de Janeiro. Não houve resposta”.

Nova reunião voltou a ocorrer as 11 horas do dia 16, desta vez para um público mais amplo, formado pelos comandantes das forças de terra e mar, a oficialidade da Escola Militar, os chefes políticos, os chefes das repartições públicas, comerciantes e outras lideranças locais. Expôs com franqueza os acontecimentos e a falta de comunicações oficiais. Pediu o auxílio de todos para a manutenção da ordem pública.

Passeio Público, onde foi proclamada a adesão do Ceará à República e aclamado o Coronel Ferraz como primeiro governador do Ceará

Às 2 horas da tarde realizou-se uma reunião de republicanos e populares no Passeio Público, onde se proclamou a adesão do Ceará à República, sendo aclamado Governador do Estado Livre do Ceará o tenente-coronel Luiz Antônio Ferraz, comandante do 11º Batalhão. Do Passeio Público, a multidão se dirigiu ao Palácio do Governo com o coronel Ferraz à frente. Recebidos pelo presidente da Província, o major Manuel Bezerra falou em nome de todos, comunicando a aclamação do coronel Ferraz. O coronel Jardim falou emocionado, relatando seu passado militar e referindo-se à crítica situação da província. Apelou em seguida para o patriotismo de todos, no sentido da manutenção da ordem pública. Em poucas horas deixou o palácio e foi acolhido na casa do Conselheiro Rodrigues Júnior.

Palácio do Governo do Estado, antiga residência oficial do governador

No dia 16 de novembro Ferraz tomou posse do governo provisório, nomeando para a comissão executiva João Cordeiro, encarregado dos negócios da Fazenda; major Manuel Bezerra de Albuquerque (Guerra); João Lopes Ferreira Filho (Interior); tenente Alexandre José Barbosa Lima (Justiça); capitão José Freire Bezerril Fontenele (Agricultura, Comércio e Obras Públicas); Joaquim Catunda (Exterior) e José Tomaz Lobato de Castro (Marinha). 

Na Praça do Ferreira, ficava o prédio do Cine-teatro Majestic Palace, seguido da Farmácia Pasteur, e na sequência, a mansão do Barão de Aquiraz, mais tarde adquirida por Luiz Severiano Ribeiro

No dia 17, às 3hs da tarde, reuniram-se em casa do Barão de Aquiraz os representantes dos partidos da província e deliberaram aguardar o restabelecimento das comunicações telegráficas com o Rio de Janeiro, a fim de agirem com pleno conhecimento das ocorrências havidas na capital do país. No dia seguinte, o governo provisório foi empossado com toda solenidade na Câmara Municipal. Somente no dia 1° de dezembro de 1889, o governador Ferraz foi reconhecido oficialmente pelo Governo Federal.

No seu governo diversos fatos marcaram a vida política local, entre eles a criação do Conselho de Intendência Municipal e do Partido Católico. Surge também o manifesto da “União Republicana Cearense”, de linha conservadora, mas de abrangência popular. Em 25 de agosto de 1890, divulga-se outro manifesto, o do Partido Operário.

Diante desse novo cenário, logo surgiram as desavenças e rivalidades políticas: em Maranguape, foram presos Guilherme Sombra e Antônio Ribeiro do Nascimento e Silva, tendo como pretexto conspirarem contra o governo Ferraz. Outros atos de força se sucedem: em setembro, sob o mesmo pretexto, foram levados a prisão as seguintes personalidades: conselheiro Antônio Rodrigues Junior, Francisco Barbosa de Paula Pessoa, tenente Miguel Augusto Ferreira Leite, Aderson Ferro, Dr. Miguel Fernandes Vieira, Joaquim Lino da Silveira, Felipe Nery da Costa, Manoel Ambrósio da Silva Portugal, tenente Juviniano Pio de Moraes.

Todos foram postos em liberdade no mesmo mês, mas com prejuízos eleitorais, por determinação do Presidente da República. O coronel Ferraz deixou o cargo no dia 9 de janeiro de 1891, por motivo de doença. Licenciado, viajou para o Recife, onde faleceu no dia 1° de fevereiro daquele ano.



A Proclamação da República

O Imperador Pedro II e o Marechal Deodoro

No dia 15 de Novembro de 1889, o marechal Deodoro da Fonseca, no Campo de Santana, no Rio, reúne 600 militares e uns poucos civis para destituir a Monarquia brasileira, sem derramar uma gota de sangue. Em cerimônia improvisada na Câmara Municipal carioca, a República é proclamada. Chegado o momento das comemorações, constata-se que não há símbolos para celebrar a mudança de regime. Canta-se “A Marselhesa”, hino da França, e é hasteada uma bandeira com desenho semelhante à americana nas cores verde e amarelo.

Como narram os jornais da época, a população mal entendia o que se passava. Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Benjamin Constant, Quintino Bocaiúva, Silva Jardim, protagonistas do movimento republicano, eram pouco conhecidos dos brasileiros. “Ninguém parecia muito entusiasmado”, anotou o correspondente do New York Times. “O povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que aquilo significava”, escreveu Aristides Lobo no Diário Popular. O povo, mais uma vez, assistiu sem fazer parte da transição do Brasil império para uma nação com poderes constituídos.

Dom Pedro II, nasceu no Brasil e assumiu o trono aos cinco anos, quando seu pai abdicou do cargo. Depois do período regencial, tornou-se imperador com apenas 15 anos. Uma de suas filhas, a Princesa Isabel, foi responsável por assinar as duas leias abolicionistas: a do Ventre Livre e a Lei Áurea. Com a proclamação da República, Dom Pedro vai para o exílio na Europa. Ele morre de pneumonia, em Paris, dois anos depois.



O Que mudou com a Proclamação da República


A primeira Constituição Republicana foi instituída no dia 24 de fevereiro de 1891. Algumas das principais mudanças:
– O Brasil passava a ser uma República Federativa Liberal, com a escolha de um Presidente, com votos diretores;
– Passavam a existir os três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário;
– Um novo código Penal extinguiu a Pena de Morte (exceto para crimes militares em tempos de guerra);
 Separação formal entre Igreja e Estado;
– Instituída a secularização dos cemitérios, que passaram a ser administrados pelos municípios;
– Determinada a instituição do ensino laico (desvinculado da educação religiosa) e institucionalizado o casamento civil.

A Constituição de 1891 foi alterada em 1926 e revogada quatro anos depois por causa da Revolução de 1930.  


Fontes:
Leite, Filho, Rogaciano. A História do Ceará passa por esta rua - Fortaleza, Fundação Demócrito Rocha, 1988. 
https://www.mundovestibular.com.br/articles/2802/1/A-PROCLAMACAO-DA-REPUBLICA/Paacutegina1.html
fotos: Pinterest, postais antigos e arquivo Nirez