sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

A Execução de Chesmann e a repercussão em Fortaleza

 

Uma execução na câmara de gás, ocorrida no dia 2 de maio de 1960, no estado americano da Califórnia, nos Estados Unidos, causou tremenda comoção em todo o Brasil, atingindo inclusive Fortaleza. O condenado à pena de morte chamava-se Caryl Chesmann, tinha 39 anos quando morreu e foi acusado de assaltos, furtos e estupros. Era chamado de “bandido da luz vermelha”, porque usava um automóvel de cor clara, e colocava uma luz vermelha no teto, simulando uma viatura da polícia, e assim abordava jovens casais, que não tinham tempo de fugir ou esboçar uma reação. O suspeito era dono de uma extensa ficha criminal, com registro de crimes e infrações cometidas desde a adolescência. Na vida adulta passou boa parte de seu tempo nas prisões de Los Angeles. Ficou em regime de liberdade condicional até ser novamente preso em janeiro de 1948, agora sob acusação de ser o bandido da luz vermelha, um temido estuprador que roubava e molestava suas vítimas.


Num julgamento considerado parcial e cheio de falhas, sem provas contundentes, baseado numa confissão em que o acusado alegava ter sido torturado, e no depoimento de duas testemunhas, Chesmann foi condenado à pena de morte. A polêmica já começou a partir desse ponto, porque Chesmann não era acusado de assassinato, portanto não era caso de pena de morte. Começou ali uma batalha jurídica que durou 12 anos, rendeu 10 apelos, inúmeras apelações à Suprema Corte, 16 recursos a tribunais secundários 9 decisões proferidas pelo Superior Tribunal da Califórnia.  Na prisão Chesmann dispensou advogados e fez sua própria defesa. Estudou direito, tornando-se um especialista na área penal e escreveu quatro livros: 2455 – Cela da Morte; A Lei Quer Que Eu Morra; A Face Cruel da Justiça; O Garoto era um Assassino (romance). Todos transformaram-se em best-sellers internacionais.



A sentença foi adiada por 7 vezes. Afinal tudo foi em vão. Caryl Chesmann foi executado na câmara de gás, no presídio de San Quentin, na Califórnia. A morte na câmara de gás era um método cruel e demorado. De acordo com reportagens da época, o condenado sobreviveu por longos 9 minutos, se contorcendo e gritando, desde o início do processo que começou com a colocação das pastilhas do gás letal, às 14:03 e terminou com a constatação de que o homem estava morto às 14:12 horas. A anunciada execução de Chesmann provocou um debate mundial em torno da pena de morte, dos critérios do julgamento e desencadeou um clamor pela clemência do presidente dos Estados Unidos, que nunca foi concedida.


Enquanto isso em Fortaleza...


O radialista Peixoto de Alencar, então em grande evidência nos microfones da Rádio Dragão do Mar, promoveu uma campanha popular em busca de assinaturas para um enorme abaixo-assinado que seria entregue ao presidente Dwigh Eisenhower, que estava com uma viagem agendada para o Brasil. Segundo se informava, o avião presidencial faria uma escala técnica em Fortaleza.


prédio da Assembleia Legislativa

A possível estadia do presidente, ainda que breve, animou os defensores da ideia. Peixoto e companheiros de imprensa, numa camionete da “Dragão do Mar” percorriam as ruas da cidade em todas as direções, coletando apoio da população ao movimento “Chesmann não deve morrer”.  A campanha foi um sucesso. Em poucos dias foram colhidas milhares de assinaturas, reunidas em numerosos volumes para o devido encaminhamento ao presidente norte-americano.

Tudo pronto para a solenidade, eis que chega a mais nova informação: o voo de Eisenhower não faria mais escala em Fortaleza. E chegou-se à conclusão que remeter todos aqueles pacotes à Casa Branca chegaria fora de tempo, ou seja, tarde demais para Chesmann, que vivia seus últimos momentos no corredor da morte em San Quentin.


prédio da Rádio Dragão do Mar (imagem Marciano Lopes)

Foi então que a coisa começou a se desenhar como mais uma página das histórias folclóricas, nascidas em nossa cidade: o vereador José Diogo da Silveira, apresentou uma mensagem na Câmara Municipal, que foi aprovada por unanimidade, através da qual o vereador se oferecia ao governo americano para morrer na câmara de gás no lugar de Chesmann. Argumentava que era um homem já alquebrado, podia ser sacrificado em favor da sobrevivência de um jovem que muito ainda poderia fazer, no Direito e pela humanidade.

Os jornais de Fortaleza abriram grandes reportagens – “Zé Diogo quer morrer no lugar de Chesmann”. O assunto virou destaque, formando-se grupos favoráveis e contrários à ideia de José Diogo. Como se não bastasse, despontou a figura de Edmundo de Castro – Dedé de Castro – jornalista irreverente, sarcástico, típico daquela imprensa de então. Dedé elaborou um manifesto, assinado por inúmeros jornalistas e intelectuais da terra, formalizando o apelo ao presidente Eisenhower no sentido de que fosse aceito o oferecimento de José Diogo.

O apelo publicado nos jornais da cidade, foi mais uma das artes praticadas pelo atuante “Ceará Moleque” naqueles anos finais dos anos 50/início dos anos 60.  

 

 

Fontes consultadas:

Paulo César Dutra - Caryl Chessman:O Bandido da Luz Vermelha. Disponível em <https://www.folhadiaria.com.br/materia/69/2413/paulo-cesar-dutra/caryl-chessman-o-bandido-da-luz-vermelha>

Luiz Roberto da Costa Júnior – Chesmann um inocente executado na Câmara de Gás. Disponível em <https://www.recantodasletras.com.br/artigos-de-politica/6934684>

https://memoria.bn.br/pdf/386030/per386030_1960_00345.pdf

Blanchard Girão – Sessão das Quatro cenas e atores de um tempo mais feliz. ABC Fortaleza – 1998.

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