quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Abrigo Central, o mais democrático Parlamento do Ceará


Os deputados costumavam deixar o Palácio Senador Alencar, situado a poucos passos e vinham tomar um cafezinho no Abrigo Central.  No caso trocavam um parlamento formal, onde imperava a voz do coronelismo, pelo mais democrático parlamento do Ceará.  O abrigo oferecia muito mais do que o cafezinho:  bem perto achava-se o Pedão da Bananada com suas especialidades: os refrescos de cajá, graviola, murici, caju, tamarindo, as bananadas e abacatadas.

Para os notívagos havia o Tetéu, um frege onde nunca faltavam comidas e bebidas típicas do Ceará, ou seja, panelada, mão de vaca, sarrabulho, caldos e pirões, além de uma boa cachaça velha. Contudo, não era o Abrigo Central apenas uma casa de pasto. O prato principal destinado aos frequentadores era o lazer, o entretenimento, o debate. 

Ali  era permitido conversar, debater livremente, sem qualquer distinção de classe.  O abrigo que o Prefeito Acrísio Moreira da Rocha (1948-1951//1955-1959) mandara construir para os passageiros de ônibus logo se transformara em local de encontros e debates preferidos de todos. 

Palácio Senador Alencar, antiga Assembléia, hoje Museu do Ceará (Arquivo Nirez)

Era frequente encontrar deputados esquecidos de que estavam no Abrigo, não no Palácio Senador Alencar, a se tratarem em seus apartes por “vossa excelência”, enquanto ao lado, na roda em que se discutia futebol, os torcedores usavam expressões chulas.

O Prefeito Acrísio Moreira da Rocha era frequentador habitual do Abrigo Central
imagem: http://historiaenoticiasce.wordpress.com/page/2/


O abrigo aproximava as pessoas. Cercado de populares, a distribuir sorrisos e apertos de mão, podia ser visto o Prefeito Acrisio Moreira da Rocha. Ao mesmo tempo, na outra lateral, um senhor baixo, moreno, vestido de branco, conversava reservadamente com o Deputado Paulo Sarasate. O homem de branco era o Comandante da 10ª Região Militar, o General Humberto de Alencar Castelo Branco, que mais tarde chegaria de forma antidemocrática à presidência  da República.

Estas liberalidades únicas no Abrigo Central chocavam os elitistas e reacionários, que não cansavam de fazer campanha contra o espaço. Reclamavam das linhas arquitetônicas, da suposta sujeira, da frequência. Por fim, clamavam pela destruição do Abrigo Central. 



Por sua vez o Prefeito Acrísio Moreira da Rocha, que fazia uma administração progressista e popular, era mal visto pelos referidos setores, que não perdoavam, entre outras coisas, o ato de encampação da Ceará Light
A concessão feita pelo estado à companhia estava vencida fazia mais de dez anos. De acordo com os termos do contrato, vencido o prazo, os gringos deveriam entregar à prefeitura todo o patrimônio da Ceará Light and Power no Estado, incluindo a usina de iluminação e força, os bondes e demais pertences. 

Todavia os ingleses estavam sempre se esquivando de cumprir os termos do acordo. Havia também um desinteresse por parte das autoridades em fazer cumprir o contrato,  já que o secretário do Interior e Justiça de Menezes Pimentel era também advogado da Ceará Light. 

Foi preciso que o Estado Novo chegasse ao fim e a chegada de Acrísio ao poder para que se desse a encampação de direito e de fato. Acrísio Moreira da Rocha gozava de grande popularidade, tendo sido  eleito para a prefeitura de Fortaleza em duas legislaturas. Entre suas realizações, a criação das feiras livres, abertura de ruas, a ligação da Aldeota com a orla marítima, arborização e calçamento de ruas.  

Sobre o Abrigo Central

Inaugurado em 15 de novembro de 1949, na Praça do Ferreira, com o nome oficial de Abrigo 3 de setembro, destinado a parada de ônibus e instalação de pontos comerciais. A construção se deu através de concorrência pública ganha por Edson Queirós. 


A Praça do Ferreira em dois momentos: com o abrigo central
e sem o abrigo, na década de 1960

No dia 2 de maio de 1966 foi iniciada a sua demolição, sob a alegação de que ameaçava ruir. A empresa que ganhou a concorrência para executar a obra, usou até dinamite na demolição.  

Fontes:
Alberto S. Galeno e Nirez

2 comentários:

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Do Acrísio Moreira da Rocha, lembro- de seus comícios, que tinha até Luiz Gonzaga, para o povão...era mesmo populista, o homi...Do Abrigo Central, tenho saudades das bananadas e das abacatadas...tinham sabores diferentes das feitas em casa. Já dos debates políticos, não me lembro, ainda não me ligava, neles...

Valeu, Fátima

Fátima Garcia disse...

Populista e popular. Nossos governantes atuais são tão impopulares, que é impensável qualquer um deles frequentar lugares públicos se não estiverem cercados por um exército de seguranças. Mudaram os governantes ou o eleitorado caiu na real?