Igreja de São José antiga Catedral de Fortaleza, pouco antes da demolição
(foto arquivo Nirez)
Mandasse chamar logo o padre da Sé porque havia chegado a hora de encomendar a alma do agonizante. A Irmandade do Santíssimo Sacramento buscava as opas encarnadas para a procissão. Seguia-lhe o padre com o vinhático (a derradeira eucaristia) e o povo chorando um bendito.
O badalar pesaroso dos sinos da Matriz avisava a cidade do passamento. (Este costume foi abolido em 1878 porque a morte de alguém não afligia mais a cidade, à época torturada pelo grande número de vítimas das secas e das epidemias). A partir daí sabia-se da morte de algum morador por uma cortina preta, com uma cruz prateada no centro, posta na fachada da casa do falecido.
O velório era demorado - os vivos não tinham pressa de se livrar dos mortos - com muito chá e, às vezes, muito vinho para reanimar. O luto durava um mês, a família só saía de casa para assistir as missas do sétimo e do trigésimo dia. Só escrevia cartas tarjadas de preto e usavam luto fechado. Os desolados viúvos usavam luto pelo resto da vida.
O funeral se desdobrava na rua. O caixão era levado por parentes, amigos ou alguns gatos pingados – a pé. O padre, vestido a caráter, carregando uma cruz negra, coberta com veludo preto com franjas douradas, guiava o cortejo. O féretro passava pela catedral, onde se encomendava o corpo, e de lá seguia para o São João Batista.
Se o infortúnio dava-se à noite a cena ganhava as luzes das velas acesas, e a depender da importância do defunto, a procissão tinha a cadência da marcha fúnebre sugerida por uma banda de música.
Em contrapartida eram festivos e risonhos os enterros de anjinhos. Os sinos da Sé (os menores) repicavam alegremente e a família do anjinho convidava quantos meninos pudesse para acompanhar o cortejo. Não havia encomendação do corpo de crianças inocentes, as portas do céu estavam franqueadas para elas.
Enquanto os pequenos convidados esperavam pela hora da saída, recebiam de agrado, toda sorte de guloseimas. Depois lá se ia o alegre bando acompanhado, não raro, por músicos que tocavam polcas, quadrilhas e outras peças alegres.
Sobre os Gatos Pingados
Eram homens pagos para carregar o esquife, incorporavam o luto das casacas e cartolas pretas. Havia três categorias de gatos pingados, sendo que os de última classe apresentavam-se com uma indumentária mais simples, e, às vezes, apareciam descalços.
Iam a passos lentos – acentuados pelo efeito da pinga consumida antes do ofício. E não raras vezes aconteciam acidentes, como o que ocorreu no enterro do Comendador Luis Ribeiro da Cunha. Ao chegar ao canto da Rua das Flores (atual Rua Castro e Silva), o caixão escapou das mãos dos gatos pingados e espatifou-se nas pedras do calçamento.
Com o tempo, alguém se lembrou de explorar a indústria dos enterros em Fortaleza, procurando modernizá-los. Assim apareceram os carros funerários puxados por cavalos.
fonte:
Revista Fortaleza - Fasciculo 6
4 comentários:
vixe amiga fátima!!!!ainda bem que este tempo ai passou né? mto funebre!!!!ja pensou ser carregada por estes gatos pigados, cruz credo!!!!adorei o texto! parabéns!bjos.
se preocupe não amiga Lu, essas coisas há muito sumiram na poeira do tempo, agora apenas fazem parte da história da nossa urbe.
bjs
Ainda me lembro das cartas (envelopes) com tarja preta, recebidas e enviadas por meu pai.
Quanto ao luto, lembro que minha mãe vestiu preto(luto fechado)por 6 meses, qnd a mãe dela morreu, e mais 6 meses de luto"aliviado"(estampadinho de preto-e- branco). Meu pai usou "fumo"-pedaço de pano preto na lapela. Nós,os netos, usamos o luto "aliviado" por 6 meses..lembro do meu vestidinho preto e branco rsrs. Era 1947!!!!!
A cena era essa....fora as fotos que tiravam dos "defuntos" no caixão!!!!
Importante matéria!
Lúcia
Oi Lucia,
O uso de roupas pretas em sinal de luto caiu em completo desuso, nem no interior, o costume não sobreviveu nem nas cidades interioranas, onde as tradições são levadas mais a sério. Agora, fotografar os defuntos ainda hoje se usa, até a rede bobo, digo, rede globo, faz isso
bjs
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