A suntuosidade nas fachadas dos prédios, marcou as construções do inicio do século. Este pertenceu à Fênix Caixeiral (arquivo Nirez)
Com entrada do século XX, Fortaleza vivenciou várias modificações na sua estrutura urbana. Viu surgirem novas lojas, novos bancos, hotéis, clubes, mansões, como a nova sede da Fênix Caixeiral, inaugurada em 1905, num evidente sinal da prosperidade dos caixeiros (comerciários) ante à expansão do comércio local; da luxuosa sede da Associação Comercial – o Palácio Guarani , inaugurado em 1908, e do Palacete Carvalho Mota, de 1907, construído para a família do coronel Antônio Frederico de Carvalho Mota, e que mais tarde passou para o controle do DNOCS.
Palácio Guarani, inaugurado em 1908 (arquivo Nirez)
Para os setores dominantes, compostos por comerciantes, profissionais liberais, políticos e artistas, morar nas ruas principais do Centro da cidade e frequentar os locais da moda eram símbolo de status social, demonstrando seu poder econômico e o nível cultural superior. Havia uma prática entre as elites, de se deslocar para casas mais luxuosas, às vezes na mesma rua ou nas proximidades, como uma forma de demonstrar ascensão social dentro do grupo.
Fábrica Siqueira, Gurgel, Gomes & Cia Ltda foi constituída em outubro de 1924. Indústria de óleos vegetais e sabão, funcionava no antigo bairro do Matadouro, atual Otávio Bonfim.
Outro sinal de progresso da cidade foi o aparecimento das fábricas – pequenas e médias, de peso quase insignificante no contexto da economia cearense. No final do século XIX, havia duas fábricas de fiação e tecidos. A primeira começou a funcionar em 1883, com 215 empregados, de propriedade de Antônio Pompeu de Sousa Brasil, Thomas Pompeu de Sousa Brasil (filhos do Senador Pompeu) e do cunhado destes, o depois governador Nogueira Accioly. A outra foi fundada por Holanda Gurjão & Cia.
Ao longo das primeiras décadas do século XX foram aparecendo fábricas de sabão, bebidas, calçados, fogos de artificio, fundição de ferro, refino de açúcar, produtos farmacêuticos, tipografias e ateliês de artistas (marceneiros, alfaiates, sapateiros).
Muitas das fábricas se instalariam ao longo da via férrea, que cortava a zona oeste da cidade e no entorno da Estrada do Urubu (atual Avenida Francisco Sá), fazendo surgir ali um polo industrial que se estenderia até a Barra do Ceará e duraria até os anos 1970/80. Em 1928, a Rede de Viação Cearense instalaria naquela estrada suas oficinas, conhecida como Oficina do Urubu.
Fábrica Santo Antonio, de fiação e tecelagem de algodão, fundada em março de 1924.
Com isso, foi aos poucos se formando uma pequena classe operária, vista como potencialmente perigosa pelas autoridades e segmentos dominantes, começando daí o controle e a repressão dos trabalhadores e a fundação de sindicatos e associações assistencialistas. No inicio do século, as ideias socialistas, especialmente anarquistas, já circulavam entre os operários cearenses.
Em 1927, era fundado o Bloco Operário Camponês, a seção local do Partido Comunista Brasileiro, evidenciando a organização e movimentação dos trabalhadores em busca de melhores condições de vida e mesmo de superação do capitalismo. Várias greves aconteceram em Fortaleza no período da República Velha e as lideranças socialistas participavam de todos os movimentos populares que aconteciam.
O período que precedeu a Revolução de 1930 foi uma época de intensa mobilização de trabalhadores em todo o país. A liderança do movimento operário estava praticamente com o Partido Comunista Brasileiro (PCB). Em seus discursos, era comum o tema da revolução como condição de reformas sociais e políticas, para modificar as relações de trabalho, tanto na cidade quanto no campo.
Depois da Revolução de 30, assume como primeiro interventor do Ceará, Fernandes Távora, bastante criticado por manter práticas políticas identificadas com as oligarquias tradicionais. Também continuam as práticas da Velha República contra a organização de trabalhadores. As ações caminhavam no sentido de desmobilizar o movimento operário e sindical, utilizando os instrumentos de repressão.
Fernandes Távora, primeiro interventor do Ceará
Em Fortaleza o PCB se preparava para uma grande manifestação, chamada Passeata da Fome, para o dia 19 de janeiro de 1931. O objetivo era reunir os desempregados e denunciar os problemas sociais que afligiam a população. A miséria era o foco da manifestação. O ato vinha sendo preparado nacionalmente desde o final do ano anterior e estava previsto para acontecer em outras cidades brasileiras sob a coordenação do Partido.
A interventoria cearense toma conhecimento da organização da passeata, e se prepara para reprimir o movimento. O Interventor Fernandes Távora nomeia Faustino Nascimento como delegado especial para fazer diligências na capital e no Interior. A distribuição de panfletos de convocação é proibida e estes passam a circular preferencialmente nos bairros, onde o policiamento era menos ostensivo. São presos 56 operários, sendo 16 deportados para o Rio de janeiro.
Para a opinião pública, o governo apresentou sua versão como forma de justificar a repressão. Em 28 de fevereiro de 1931, o Jornal O Povo publicou o relatório do delegado Faustino Nascimento entregue ao interventor Fernandes Távora com o título O Comunismo no Ceará. Um dos tópicos era sobre a Passeata da Fome.
Os membros do Partido que deveriam tomar parte na Passeata, apresentar-se-iam armados até de dinamite, não só para resistirem eficazmente contra qualquer obstáculo policial, como também porque desejavam os comunistas aproveitar-se do ensejo para tentar um assalto ao poder, caso conseguisse realizar o seu plano, diz o texto publicado.
Em outro trecho, o delegado afirma que a Passeata da Fome seria o primeiro movimento de agitação comunista entre nós, após a revolução de Outubro (Revolução de 30). Depois, viriam outros levantes.
Ele justifica que para alguns, a passeata não se realizou porque a palavra de ordem foi presa no Ceará. Para outros, porque o Partido não estava forte o suficiente, e os desempregados convidados tiveram receio de participar do movimento.
Fontes:
Fortaleza, uma Breve História, de Artur Bruno e Airton de Farias
Revista Fortaleza, fascículo 4, de 30 de abril de 2006
Verso e Reverso do perfil urbano de Fortaleza, de Gisafran Nazareno Mota Jucá
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