Café Java, local de nascimento da Padaria Espiritual (Arquivo Marciano Lopes)
Era preciso acontecer alguma coisa que se chocasse com a mesmice provinciana. E para isto se fundou uma sociedade de letras e artes, tendo sua sede no número 105 da Rua Formosa (atual Barão do Rio Branco).
A Padaria Espiritual forneceria aos sócios em particular e ao povo em geral o pão do espírito. A reunião de instalação aconteceu no ano de 1892, no Café Java, um dos quatro quiosques da Praça do Ferreira.
da esquerda para a direita: os Padeiros Adolfo Caminha, José Maria Brígido, Teófilo de Moura, Álvaro Martins (em pé) Carlos Vitor, Antonio Sales, Sabino Batista.
(foto: Revista Fortaleza)
(foto: Revista Fortaleza)
E foi criado um estatuto onde ficava registrado o caráter irreverente da sociedade, representante do traço moleque da personalidade cearense. Entre as proibições, estavam a referências a animais ou plantas estranhos à fauna e flora brasileiros, ao uso de palavras ou expressões estrangeiras, ao tom oratório, ao atentado ao bom senso e ao bom gosto.
Entre as decisões, a de recolher o cancioneiro cearense, de registrar em livro a vida do Padre Verdeixa e de publicar um almanaque ilustrado do Ceará, contendo informações úteis e também inúteis, primores literários e anúncios de bacalhau.
Alguns tópicos do Estatuto da Padaria Espiritual:
Bandeira da Padaria Espiritual: sobre um fundo vermelho uma pena cruzada por uma haste e trigo. Abaixo deste o lema do movimento literário: Amor e Trabalho
(acervo do Museu do Ceará)
1 – fica organizada nesta cidade de Fortaleza, capital da Terra da Luz, antigo Siará Grande, uma sociedade de rapazes, letras e Artes, denominada Padaria Espiritual, cujo fim é fornecer pão de espírito aos sócios em particular, e aos povos em geral.
6 – todos os Padeiros terão um nome de guerra único, pelo qual serão tratados e do qual poderão usar no exercício de suas árduas e humanitárias funções.
16 – aquele que durante uma semana não disser uma pilhéria de espírito, pelo menos, fica obrigado a pagar no Sábado, café para todos os colegas. Quem disser uma pilhéria superiormente fina pode ser dispensado da multa da semana.
21 – será julgada indigna de publicidade qualquer peça literária em que se falar de animais ou plantas estranhas à fauna e flora brasileiras, tais como : cotovia, olmeiro, rouxinol, carvalho, etc.
26 – serão considerados, desde já, inimigos naturais dos Padeiros: o Clero, os alfaiates e a polícia. Nenhum padeiro deve perder ocasião de patentear seu desagrado a essa gente.
28 – será punido com expulsão imediata e sem apelo o Padeiro que recitar ao piano.
39 – as mulheres, como entes frágeis que são, merecerão todo o nosso apoio, excetuadas: as fumistas, as freiras e as professoras ignorantes.
46 – o Padeiro que, por infelicidade, tiver um vizinho que aprenda clarineta, pistom ou qualquer outro instrumento irritante, dará parte disto à Padaria, que trabalhará para por termo a semelhante suplicio.
Rodolfo Teófilo (1853-1932) Um dos Padeiros Mores da Padaria Espiritual, pseudônimo Marcos Serrano. Publicou entre outros romances e ensaios, A Fome, O Paroara, História da Seca do Ceará e Sedição de Juazeiro.
(Retrato de autoria de Otacílio de Azevedo, acervo do Museu do Ceará)
Da primeira Ata, ficou o registro de Rodolfo Teófilo:
Depois de retirarem-se os cidadãos ignaros, serviu-se cerveja aos Padeiros que fizeram espírito até às 10 da noite. Todos saíram então à rua acompanhados de violinos, flauta e violão, e dirigiram-se em serenata ao Café Tristão, onde tomaram café.
Percorreram ruas e chegaram afinal à Avenida Ferreira, onde cada qual tomou seu rumo. E foi assim que se realizou a primeira fornada da Padaria espiritual.
Eu, Frivolino Catavento, 1° forneiro interino, que o digo, é porque o vi.
O Empório Estrella do Oriente, na Rua Major Facundo era um dos anunciantes do Jornal O Pão (arquivo Nirez)
Apesar da ironia, o Pão, jornal oficial da Padraria, não abriu mão dos anúncios. Saiu sem eles em sua primeira fase que durou seis números, mas passou a lhes dedicar duas páginas em sua segunda fase, nos números que circularam em 1° de janeiro a 1° de julho de 1895, passando a ocupar apenas a última página das edições de 15 de julho a 15 de dezembro do mesmo ano. Nova interrupção, retomada em agosto de 1896, para mais seis números, sem anúncios.
Fontes:
Gilmar de Carvalho
Revista Fortaleza – Nossa Cultura – Fascículo 12
Juarez Leitão
Um comentário:
que merda não ajudou em nada
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