sexta-feira, 30 de julho de 2010

A Vida em Fortaleza na visão de Moreira Campos

Um dos mais belos conjuntos arquitetônicos da Praça do Ferreira era formado pela Casa Almeida, o Majestic Palace e a Farmácia Pasteur. (foto Arquivo Nirez) 
Prédio da Farmácia e Drogaria Pasteur, na Rua Major Facundo, 538 - Praça do Ferreira (foto Arquivo NIREZ) 

Quando o escritor Moreira Campos veio morar em Fortaleza, em 1930 já existiam pelo menos três cinemas importantes: o Polyteama, o Majestic e o Moderno. O Polyteama era o mais poeira, era o cinema da plebe, com a entrada mais barata. Havia duas entradas, uma pela Barão do Rio Branco e a outra pela Major Facundo.  
O  Majestic teve sua importância. Mas o cinema da classe alta, dos abonados, era o Moderno – pertencia a Plácido Carvalho, o dono do castelo. Nas ruas centrais – Barão do Rio Branco, Major Facundo, Floriano Peixoto – Senador Pompeu – que marcam pelo alinhamento, o tabuleiro de xadrez, só havia de casas de famílias, casas comerciais, só na praça. 
As atividades do povo do Ceará estavam todas em volta da Praça do Ferreira: farmácias, lojas, restaurantes, cinemas, lanchonetes, tudo. A Praça do Ferreira era o cartão postal da cidade. Havia inicialmente quatro cafés: Café Java, Café do Comércio, Café Iracema, Café Elegante. No Café Java foi onde surgiu um dos movimentos literários mais importantes do Ceará: a padaria Espiritual, de que era presidente Antonio Sales. A praça era ponto de encontro das personalidades do Ceará, na Política, na Literatura, na Advocacia, nas Artes, no Comércio. A opinião popular tinha até um banco, de costas para a farmácia Pasteur, com a inscrição “O Banco” em um azulejo no chão. 
Banco da Opinião Pública era uma instituição na cidade (foto Arquivo Nirez)
Havia o coreto, onde a banda de musica municipal se apresentava. Depois o Prefeito Raimundo Girão mandou destruir o coreto e construiu a Coluna da Hora. Crimes bárbaros ocorreram na Praça do Ferreira, por motivos políticos, passionais, ou discussões tolas. Certa feita um oficial de policia matou friamente um outro colega, no Bar da Brahma. Dizem que matou, sangrou com o punhal, limpou o punhal no culote, meteu na bainha, olhou para a Coluna da Hora e acertou o relógio. Friamente. 
Foi também pela Praça do Ferreira que passaram os mártires da Confederação do Equador em direção à Igreja do Rosário, para receberem a encomendação, e daí serem encaminhados para o Passeio Público onde seriam fuzilados. 
Naquela época havia ainda as cadeiras na calçada, onde conversavam homens e mulheres. Praticamente não existiam carros, só os muito ricos possuíam um automóvel em 1930, e à tardinha arriavam as capotas dos carros e passeavam. As cadeiras nas calçadas eram uma coisa natural, porque naquele tempo as casas eram conjugadas, uma perto da outra, e relativamente pequenas. 
Havia os sobrados, as casas grandes, mas na maioria não havia espaço interno para conversas. Na calçada havia o vento, sobretudo se era na Barão do Rio Branco, na Major Facundo. O vento vinha do Passeio Público, vinha do mar.Os homens vestiam-se com paletós de linho branco, e usavam chapéus, tudo compatível com o clima; as mulheres vestiam-se com elegância, mas com muito pudor.
Moreira Campos fez um soneto em que sintetiza sua primeira impressão, o impacto que sentiu com a vinda para Fortaleza.
“Cheguei aqui em 30, Fortaleza 
Era então provinciana, era menina,
Cadeiras nas calçadas e tristezas
 
Dos lampiões a gás em cada esquina"

Fonte:
Roteiro Sentimental de Fortaleza/ Depoimentos de História Oral de Moreira Campos, Antonio Girão Barroso e José barros Maia/ Coordenadores: Simone de Souza e Sebastião Rogério Ponte. Prefácio de José Carlos Sebe B. Meihy; transcriadores: Oswald Barroso, Caterina de Saboya Oliveira e Sebastião R. Ponte. Fortaleza: UFC-NUDOC/SECULT-CE, 1996.

 

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