quinta-feira, 3 de novembro de 2011

As Lutas partidárias na Praça do Ferreira


Praça do Ferreira, anos 30. A coluna da Hora foi inaugurada em 1933 (arquivo Nirez)

No decorrer da década de 1930, todos os dias, ao entardecer surgiam na Praça do Ferreira os ativistas políticos, empenhados em conseguir simpatizantes. De um lado, os integralistas; do outro os partidários da Aliança Nacional Libertadora. Os primeiros ficavam nos bancos ou formando rodas, procurando atrair os circunstantes, com suas camisas verdes e os seus anauês, o que era motivo de apupos dos contrários. Eram chamados de Galinhas Verdes, os adeptos de Plinio Salgado. 

Certa vez alguns estudantes prepararam uma brincadeira de consequências funestas:  levaram para a Praça do Ferreira uma galinha de verdade, pintada de verde, soltando a ave em frente a um banco onde se achavam, os integralistas. Anauê, Anauê, eram os gritos que partiam de todos os lados, seguidos de grande arruaça.

Prédio da Ação Integralista Brasileira, fundada em Fortaleza no ano de 1932. Ocupava o edifício Vitória, na esquina das Ruas Barão do Rio Branco com Guilherme Rocha (arquivo Nirez)

Os alvos da gozação procuraram a polícia reclamando providências, solicitando que os autores da brincadeira fossem detidos. Mas os guardas responderam que nada poderiam fazer em razão do grande número de manifestantes, que vaiavam os integralistas: não era um nem dois, mas uma multidão. A recusa deixou os galinhas verdes indignados, motivando a ódio dos integralistas contra os guardas civis. 

Já os aliancistas apelavam para os comícios-relâmpagos. Reuniam-se ao redor da Coluna da Hora, indicavam os oradores que subiam as escadas e começavam a falação. Palavras até então desconhecidas do povo como imperialismo, latifúndio, oligarquia, eram repetidas a todo instante. A massa começava a se politizar.

Alunos do Liceu em passeata de protesto. Os estudantes tinham uma forte participação política. (foto do livro de Blanchard Girão)

Havia um grupo de alunos do Liceu que Ceará, que nunca faltava a esses comícios, realizados inesperadamente, que sempre surpreendia a polícia. Eles chegavam dando vivas e morras, cantarolando refrãos revolucionários, tendo a frente um grande tribuno chamado Amorim Pargas, um jovem maranhense, acadêmico de Direito, que arrebatava as multidões com seus discursos inflamados.  Ativista político de primeira linha, ele atraía sobre si as iras da reação. 

Logo após a decretação do estado de Sítio de 1935, Pargas seria preso na Praça do Ferreira, levado para a Polícia Marítima e deportado para o sul do país, isso depois de cumprir vários meses de cadeia.
O episódio seria recordado 25 anos depois, numa solenidade do Partido Comunista Brasileiro, em Fortaleza, pelo próprio Amorim Pargas, que recordava que havia 25 anos atrás ele fora deportado pelo Capitão Cordeiro Neto, na época Secretário de Polícia. Anos depois, retornara a Fortaleza e encontrara Cordeiro Neto não mais como Secretário de Polícia, mas feito prefeito da cidade. E nesta posição, lhe reservara hospedagem num hotel de primeira ordem. Jornalista e empresário, diretor de uma agência de noticias, Pargas viera à Fortaleza escrever uma série de reportagens sobre a cidade.

O Massacre no Carnaval

No ano de 1935 o Carnaval de Fortaleza alcançou um sucesso nunca visto. Ainda não havia os maracatus, vindos de Recife e aqui chegados dez anos depois. No entanto, não eram poucos os blocos que se improvisavam, alguns dos quais perdurariam por muitos anos, como o das Baianas e o Prova de Fogo.  

O sucesso era atribuído em grande parte ao clima de liberdade reinante no Ceará, o povo aproveitava a oportunidade para brincar e ao mesmo tempo criticar entidades e personalidades que não gozavam de sua simpatia.

Às mulheres das pensões alegres, antes proibidas de sair à rua durante o período de carnaval, foi-lhes permitido que largassem suas moradias e viessem cantar e se divertir como os demais. Toda essa situação incomodava aos setores mais conservadores, defensores dos velhos costumes, para quem o povo não deveria ter tanta liberdade, que deveria viver no regime do chicote e da mordaça. 

Esses conservadores eram adversários políticos e críticos ferozes do interventor Felipe Moreira Lima (5 de setembro de 1934/10 de maio de 1935), a quem atribuíam esses “excessos” verificados no Carnaval.  Moreira Lima, ao contrário dos governantes anteriores, assegurou ao povo cearense liberdades jamais experimentadas.  Permitiu a liberdade de opinião e de crítica, a liberdade de reunião e – o que era inadmissível na época – o direito de greve. Foi arquitetado então um plano sinistro visando, principalmente, desestabilizar a interventoria de Moreira Lima. 

Era grande a animação na Praça, com o local repleto de foliões quando de repente, começou um tiroteio, ao que se dizia, iniciado por soldados e praças do 23°  BC, tendo à frente Cincinato Furtado Leite, que viria a ser eleito deputado em sucessivas legislaturas.  Três guardas civis tombaram sem vida, um dos quais ao pé da Coluna da Hora. Houve corre-corre e  muitos feridos em consequência das quedas e encontrões.  A Praça do Ferreira esvaziou-se dentro de dois tempos.

cartão postal do então Quartel do 23° BC - Loja Chrysanthemo (foto: Ah, Fortaleza!)

Chega então uma viatura do Exército, comandada por um tenente, não para prender os militares assassinos, mas para prender os guardas civis que escaparam do massacre. Momentos depois chegava também ao local, vestido com o uniforme de oficial do Exército, o Coronel Felipe Moreira Lima, que ordenou ao subordinado que soltasse os presos e se recolhesse imediatamente ao quartel da corporação, no que foi prontamente obedecido.

O comandante do 2° BC, coronel Drácon Barreto, teria ordenado a abertura de inquérito policial-militar destinado a apurar responsabilidades, o qual deveria ser remetido à 7ª Região Militar, no Recife. Obviamente o inquérito não apresentou nenhum resultado, nem apontou culpados, porque o comandante da 7ª. RM era um dos constituintes dos 40, órgão máximo da Ação Integralista, o general Newton Cavalcanti.

Fonte Alberto S. Galeno 

2 comentários:

Anônimo disse...

Incrível como os prédios e as praças antigas tranmitem a idéia cuidado,de bom gosto.Sempre observo a arborização vasta,podada e a arquitetura de muito bom gosto.

Fátima Garcia disse...

menos corrupção, mais trabalho, mais seriedade, mais responsabilidade no trato com a coisa pública. É tudo que está faltando nos dias atuais.