A instauração da República no Ceará se processou entre os
dias 15 e 16 de novembro por intermédio de uma articulação envolvendo militares
da Escola Militar e do 11° Batalhão, e os integrantes do centro Republicano –
organizado poucos meses antes, em 26 de julho de 1889 – que depôs o governo
provincial de Morais Jardim (outubro de 1889-novembro de 1889).
Entre 1889 e 1896, o período crítico dos 3 governos militares cearenses, foram poucas as práticas dominantes voltadas para os anseios de modernizar Fortaleza e disciplinar a população via estratégias higienistas e comportamentais. A destacar, entretanto, a tentativa em 1891, de substituir os nomes das ruas por números, a exemplo de New York, medida que acabou revogada poucos meses depois; o surgimento da Academia Cearense (1894), que, ao lado do Instituto Histórico do Ceará (1887), veio a se tornar uma das principais instituições de saber da capital, reunindo os mais ilustres intelectuais e publicando uma revista anual, em formato de livro contendo não menos de 200 páginas; e a emergência de mais uma organização voltada para o controle assistencialista do contingente de miseráveis da cidade, o Dispensário dos Pobres, em 1895.
cadetes da Escola Militar de Fortaleza cercam o Palácio do Governo e derrubam o presidente Clarindo de Queirós
Ocupando provisoriamente o novo poder, o Coronel Luís Ferraz
faleceu pouco tempo depois (janeiro de 1891), sendo substituído pelo General
Clarindo de Queirós. Esse foi deposto quando Floriano Peixoto assumiu a
presidência da República, após a renúncia de Deodoro da Fonseca. Como Clarindo
de Queiroz demorou a atender o chamado do presidente para ir à capital federal,
uma revolta militar bombardeou por toda uma noite o Palácio do Governo e obteve
a deposição do General.
Foi nesse momento que principiou a ascensão do bacharel
Nogueira Accioly rumo à presidência do estado e à constituição de sua oligarquia,
uma das mais duradouras (1896-1912) das tantas que despontaram no Brasil na
Primeira República. Accioly não era um republicano histórico. Ainda no período
monárquico tornou-se presidente do Partido Liberal cearense após a morte do seu
sogro, Senador Pompeu. Protegido pelo ministro Sinimbu, ocupou a presidência da
província em 1878. Em outubro de 1889 foi nomeado Senador do Império, cargo que
não chegou a assumir por causa da Proclamação da República.
Em 1906 Nogueira Accioly (de pé) recebeu a visita do Presidente da República Afonso Pena
Nogueira Accioly logo aderiu ao novo regime e em 1890
fundava a União Republicana contando com a participação da antiga facção
liberal e de ex-conservadores. O prestigio político de Accioly não foi abalado
pelas pressões dos republicanos que o identificavam como uma das “raposas” do
antigo regime, tanto que se tornou senador em 1892, cargo que lhe conferiu
grande influência na política cearense daqueles atribulados primeiros anos da
República.
Na condição de aliado político de Floriano Peixoto, Accioly
teve atuação destacada na articulação que depôs o presidente Clarindo de
Queiroz. A seguir, ocupou a presidência do Estado o tenente-coronel José Freire
Bezerril; Accioly, então já presidente do Partido republicano Federalista, que
fundara naquele mesmo ano de 1892, foi o escolhido para ocupar a
vice-presidência. Findo o quadriênio da gestão Bezerril (1896), Accioly
finalmente se elege presidente do Ceará – o primeiro governante civil do estado
– com cerca de 21 mil votos.
Embora iniciado no governo de Bezerril Fontenele (1892-96),
o Mercado de Ferro, concluído em 1897 na gestão de Accioly, se configura como a
primeira grande obra municipal que o intendente
Guilherme Rocha teve esmerada participação.
Entre 1889 e 1896, o período crítico dos 3 governos militares cearenses, foram poucas as práticas dominantes voltadas para os anseios de modernizar Fortaleza e disciplinar a população via estratégias higienistas e comportamentais. A destacar, entretanto, a tentativa em 1891, de substituir os nomes das ruas por números, a exemplo de New York, medida que acabou revogada poucos meses depois; o surgimento da Academia Cearense (1894), que, ao lado do Instituto Histórico do Ceará (1887), veio a se tornar uma das principais instituições de saber da capital, reunindo os mais ilustres intelectuais e publicando uma revista anual, em formato de livro contendo não menos de 200 páginas; e a emergência de mais uma organização voltada para o controle assistencialista do contingente de miseráveis da cidade, o Dispensário dos Pobres, em 1895.
Guilherme Rocha, Intendente de Fortaleza de 1892 a 1912
Foi a partir dos governos seguintes de 1896 a 1930, que
realmente se tornaram mais efetivos os investimentos de normalização
urbano-social em Fortaleza. Durante todo
o período em que durou a oligarquia aciolina (1896-1912) a Intendência da
capital ficou a cargo do coronel Guilherme Rocha, considerado pela histografia
cearense um dos administradores que mais fizeram pela urbanização e
embelezamento de Fortaleza.
Praça da Sé, uma das beneficiadas com melhoramentos na gestão do Intendente Guilherme Rocha
Após a construção do Mercado de Ferro, o poder municipal
investiu na ampla remodelação das três principais praças da capital – a do Ferreira,
a Marquês de Herval e a da Sé – inauguradas com muitos festejos. Nestes
logradouros foram introduzidos canteiros de flores, avenidas, réplicas de
estátuas gregas, vasos importados, chafarizes e largos pavilhões para ocorrência
de retretas, patinação e ginástica.
A regeneração das praças, portanto, vai muito além do mero
aformoseamento: facilitava a circulação e determinava novas regras de
convivência e utilização do espaço público, além de estimular a prática de
exercícios físicos nos jovens e estudantes, tidos como saudáveis aos costumes e
à saúde.
Jardim sete de setembro, na Praça do Ferreira
Atento e vigilante ao embelezamento da cidade, Guilherme
Rocha também procurou fazer cumprir o Código de Posturas de 1893, que
prescrevia a adoção de uma padronização formal nas platibandas, obrigatórias
nas fachadas de frente, bem como nos vãos de portas e janelas externas. Para
manter a harmonia do conjunto urbano, tentou impedir as construções que não
obedecessem as linhas gerais definidas pelo Código.
Com base no artigo 12 do Código, o intendente exigiu que as
esquinas fossem cortadas em dois ângulos obtusos, o que provocou reação da
oposição.
sede do Jornal "Unitário", de onde João Brígido disparava suas críticas contra o Governo Accioly
O jornalista João Brígido, inimigo político de Accioly,
aproveitava-se do fato para ironizar o intendente municipal chamando-o de nosso
Haussmann, (prefeito de Paris à época) num artigo intitulado “Fortaleza em Paris”
inserido no jornal Unitário de 23 de julho de 1908. Apontando a disparidade das
situações, afirmava que Haussmann havia
feito as derribadas de Paris para tirar aos inimigos seus melhores pontos
estratégicos acomodados às barricadas. Por tal razão, tinham sido condenadas as
esquinas angulares, dando-lhes forma arredondada. Não era este o caso de
Fortaleza, onde em ponto central se via um pardieiro, que não era do repertório
de Haussmann.
Praça José de Alencar, então Marquês de Herval depois da reforma empreendida por Guilherme Rocha. Era o cartão-postal de Fortaleza
O pardieiro a que se referia João Brígido era o Mercado de
Ferro, mas sua desqualificação é questionável: afinal o Mercado de Ferro,
metálico, em estilo art-nouveau, enquadrava-se nas reformas estéticas do final
do século. Como se vê, os segmentos modernizadores locais – prefeitos e
jornalistas, entre outros – estavam informados e alinhados com as reformas
urbanas ocorridas na Europa, sobretudo as da França e Inglaterra, países com as
quais as cidades brasileiras mantinham mais contato.
detalhes do embelezamento da Praça Marquês de Herval: réplicas de estátuas gregas e vasos importados
Um dos mais eloquentes testemunhos sobre a onde de
transformações urbanas vividas por Fortaleza é a crônica Epitáfio na Calçada,
de Paulino Nogueira, publicada no Almanaque do Ceará, ano de 1900. Já sentindo
certa nostalgia de um passado recente, o cronista compara a Fortaleza de poucas
décadas atrás com a “nova” cidade do momento em que escreve, destacando, com a
perspicácia e perplexidade do olhar literário, as fascinantes novidades que
estavam alterando a fisionomia da cidade:
... era muito pequena e atrasada esta Capital. Ainda não
tinha o Passeio Público, praças arborizadas, templos majestosos, edifícios elegantes,
tantas e tantas ruas alinhadas, calçamento, iluminação à gás, linhas de bondes,
carros de aluguel, hotéis, quiosques, clubes, prado, corrida de touros, a
cavalo e à bicicleta, quermesse, bazar e demais novidades.
extraído do livro de Sebastião Rogério Ponte
Fortaleza Belle Epoque: reformas urbanas e controle social (1860-1930)
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