O ano de 2015 assinala o centenário de um ano
particularmente dramático para o Ceará, em razão do fenômeno climático, cíclico, que
sempre marca presença por aqui: a seca. O ano de 1915 e a seca são temas do romance de
estreia da escritora Rachel de Queiroz. Marca também o surgimento em Fortaleza
de uma das figuras populares que fez história nos anais do folclore cearense; desta vez não se tratava de nenhum daqueles tipos bizarros que surgiam na cidade vez em quando, quase sempre ruidosamente saudados com muitas vaias pela turba que batia ponto na Praça do Ferreira. Dessa vez, o tipo popular era diferente. Era uma vez um bode. O bode Yoyô.
Yoyô no Museu do Ceará (foto de Muhammad Said)
Consta que o animal veio para Fortaleza com alguns
retirantes fugidos da seca no sertão. Aqui, seu proprietário resolveu ganhar
uns trocados e saiu oferecendo o bicho à venda, de porta em porta. Foi comprado por uma quantia irrisória por um
representante da firma Rossbach Brazil Company, empresa inglesa instalada na
Praia de Iracema, cujos armazéns ficavam nas imediações da alfândega.
Ali o
Bode Yoyô virou uma espécie de mascote e passou a viver sua vida de boêmio,
primeiro somente pela praia, e mais tarde, pela cidade inteira. O nome foi dado por populares em razão das idas e vindas no trajeto
que fazia diariamente, da praia de Iracema para a Praça do Ferreira, sempre
pelo mesmo percurso. Na praça conheceu políticos, escritores, artistas, ganhou o nome e
a simpatia do povo.
Muitas histórias são contadas sobre o bode que bebia
cachaça e levantava a saia das mulheres com os chifres. Yoyô participou de atos políticos em
coretos, praças e saraus literários, assistiu peça no Teatro José de Alencar,
passeou de bonde, perambulou pelas igrejas e até pela Câmara Municipal.
O bode protagonizou acontecimentos que
conquistaram de vez o coração do Ceará moleque. As imediações da Praça do
Ferreira, estava em festa pela inauguração do Cine Moderno, ocorrida no dia 7
de setembro de 1922, dentro das comemorações do primeiro centenário da
Independência do Brasil. Os convidados, em seus melhores trajes, aguardavam
a chegada do governador Justiniano de Serpa, para início da solenidade. Mas o
bode, que também compareceu, cansou de esperar: foi até a entrada do prédio e
comeu a fita inaugural. No mesmo ano foi candidato a vereador de Fortaleza,
em campanha encabeçada pelo escritor Quintino Cunha. Teve tantos votos que teria
sido eleito, caso se tratasse de um candidato real.
O bode Yoyô levou sua vida de boêmio até 1931,
quando desapareceu das ruas. Ultimamente já vinha reduzindo seus passeios até a
praça, porque estava ficando velho, a cidade estava mais
movimentada, tinha aumentado o movimento na Ponte Metálica, porto da cidade, e
havia muito mais carros, caminhões, ônibus e gente.
Um dia, foi encontrado morto, nas imediações da
Praça do Ferreira que ele tanto gostava de visitar. Nas lendas da cidade, a
causa-mortis teria sido o preço da vadiagem: cirrose hepática. Mas há
quem garanta que o bode Yoyô foi vítima de um atentado político.
A empresa proprietária do animal teve a ideia
inusitada de embalsamá-lo e doá-lo ao Museu do Ceará, que não relutou em
aceitar em face da notoriedade que o animal conquistara na cidade. Hoje,
exposto numa sala vermelha, o Bode Yoyô é a peça mais visitada do Museu.
fotos do arquivo Nirez
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