terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

As Eleições no Ceará no Tempo do Império


modelo de título de eleitor no Brasil Império (imagem G1)

Antigamente as eleições se efetuavam nas igrejas. Acreditavam os organizadores que dentro dos templos, em respeito ao ambiente e às imagens sagradas, arrefecessem a ira partidária,  inibisse o furor entre adversários, e a ação dos capangas, arvorados em eleitores.
Puro engano. As velhas crônicas estão salpicadas de muito sangue derramado em eleições, algumas das quais ficaram célebres pelas mortes violentas ocorridas durante os trabalhos.

 Canindé em 1940

Assim é que em 1852 foi assassinado em Canindé o tenente-coronel Manuel Mendes da Cruz Guimarães. No Crato, em 1856 o proprietário José Landim; no mesmo ano em Sobral, dentro da igreja, durante a votação, quatro pessoas foram mortas a punhaladas e cinquenta ficaram feridas. Ainda no mesmo ano, em Santana (atual Santana do Acaraú) morreram três liberais durante as eleições; e na Telha, hoje Iguatu, ocorreram quatorze mortes, inclusive a do delegado de polícia, na eleição de 1860. 

 Crato, 1936

Em Maria Pereira (atual Mombaça) na eleição de 1880, uma forte discussão entre eleitores degenerou em áspera luta dentro da igreja, onde o professor Jayme de A. Araripe disparou vários tiros de garrucha, na intenção de amedrontar os brigões. O expediente não surtiu efeito; a luta continuou e os combatentes usaram até os castiçais dos altares para acertar os adversários.
Quando o conflito acabou a igreja estava destruída; vários eleitores estavam feridos, inclusive o Sr. Joaquim Torres e, foi assassinado o caboclo Farias, agregado da tradicional família da região. Já em eleição anterior, ali mesmo, em Maria Pereira, o coronel Manuel Martins, famoso pela coragem e força, feriu gravemente três soldados, que queriam impedir que entrassem na igreja alguns eleitores, seus amigos.

 Sobral, 1924

Não se cogitava, então, uma eleição pacífica: eleição era sinônimo de luta e combate no sentido estrito da palavra, e por isso os cabos eleitorais iam para o local de votação, no caso as igrejas, armados de facas, facões, garruchas e pedaços de paus.  Quando as lutas se acirravam entravam em cena os bacamartes.
Naqueles tempos, todo mundo era eleitor, desde as pessoas de melhor condição social até indivíduos pertencentes às classes mais baixas. No período eleitoral em Fortaleza, viam-se grupos enormes de gente, quase toda descalça, a percorrer as ruas em passeatas entusiásticas antes, e malcriadas depois da vitória. 

 Cruzamento das ruas Major Facundo e Guilherme Rocha - década de 1920

O ano de eleição para juízes de paz e vereadores, em 1879, foi bastante atribulado em Fortaleza.Corriam os trabalhos na Matriz quando se espalhou a noticia de que ali começara uma grande desordem. Assustada, a mulher do político José Feijó de Melo, que se encontrava na igreja, mandou que um criado de nome João Peci, fosse chamá-lo. 
O criado saiu apressado e, correndo quis entrar na Sé, cujas portas estavam guardadas por soldados. Supondo que o criado fosse um desordeiro atraído pelo tumulto reinante na igreja, um dos soldados matou-o com um tiro de espingarda.
 A  noticia do assassinato espalhou-se pela cidade que ficou apavorada. No dia seguinte o corpo da vítima foi levado em passeata até o cemitério, pelo Partido Conservador graúdo. Por algum tempo, Peci ficou falado e célebre em Fortaleza: não pelo que houvesse feito, mas pelo que lhe fizeram. 

 Igreja da Sé, 1914

Durante muitos anos só havia dois partidos políticos no Brasil, o Liberal e o Conservador. Mas no Ceará cada um deles se subdividia em duas facções irreconciliáveis. Para a eleição da Câmara de 1880 os Liberais Paulas  se coligaram com os Conservadores Graúdos e os Conservadores Miúdos com os Liberais Pompeus.
No dia da eleição, ainda cedo, os dois primeiros grupos, com seu numeroso eleitorado, ocuparam militarmente, a Igreja da Sé. Quando por volta das 9 horas, chegaram os Miúdos e os Pompeus, também acompanhados de um eleitorado da mesma espécie, foram atacados e repelidos à faca, pedaços de paus e tiros pelos adversários.
Travou-se então uma verdadeira batalha campal em frente à Matriz. Os atacados, em menor número, recuaram e resistindo sempre, foram empurrados pela Rua Conde D’eu em direção ao Palácio da Luz. Houve um momento em que o campo de batalha se estendia desde o portão do Mercado Novo até perto da esquina da Rua da Assembleia. Por toda parte se lutava. Sangue por todos os lados; muitos já fugiam, outros jaziam estendidos pelo calçamento e calçadas. 

 Sede da Assembleia Provincial, 1908

A luta se acirrou brutalmente nas proximidades daquela esquina. Um homem à cavalo, dava tiros para o ar, e um outro, armado de uma acha de lenha fazia frente a cinco atacantes numa calçada da Rua Conde D’Eu. Foi ali que o conflito terminou, pela retirada dos atacados. Seriam 11 horas do dia. 
A população apavorada, muitos apanhados no meio do fogo cruzado, assistia sem compreender o porquê de tanta brutalidade, nem a razão de tamanha violência. 

 Largo do Palácio, em 1908

Tão acostumados estavam os nossos antigos moradores com desordens e mortes em eleições, que o Barão de Ibiapaba, proclamou a modo de axioma que – quem morre em eleição, morre de morte natural. 
O processo eleitoral só saiu da igreja com a lei Saraiva, de 1881, ainda na época do Império. Além de criar o título eleitoral e estabelecer eleições diretas, o texto previa que o eleitor deveria ter mais de 21 anos, ter renda maior que 200 mil réis e ser alfabetizado.

fotos do Arquivo Nirez e do Álbum de Vistas do Ceará 
pesquisa:
Eleições de Outrora, de João Nogueira, publicado na Revista do Instituto do Ceará.
G1.globo.com
wikipédia

Nenhum comentário: