terça-feira, 14 de agosto de 2012

A Vida Difícil dos Catequizadores


Nos primeiros séculos da colonização, a cruz era muito pesada. Eram poucos os clérigos, sobretudo nos momentos iniciais da colonização, que tinham interesse de vir para a capitania do Siará, terra muito pobre, de índios belicosos e selvagens, com rudes habitantes, muitos dos quais criminosos, negros e mulatos, todos em constantes pecados com as índias, e gerando famílias de grosseiros mestiços, os primeiros cearenses.
Além disso, a remuneração era baixíssima. Muitos desistiam no meio do caminho, preferindo permanecer entre os gentios domésticos, na segurança e relativo conforto das aldeias já catequizadas. 

 Ruínas jesuítas de São Miguel das Missões, na Região das Missões. Patrimônio da Humanidade desde 1983 no Rio Grande do Sul, Brasil.

Tornados padres por determinação dos pais, desejosos de ter um filho ministro de Deus, muitos esqueciam os votos sagrados e constituíam família. Os livros dos cartórios civis estão cheios de registros de escrituras e testamentos, em que sacerdotes católicos confessam a fragilidade humana dos seus acasos com mulheres.
Muitos clérigos entregavam-se aos prazeres materiais. No final do século XVIII, colonos e soldados do fortim de N. S. da Assunção, acusavam o padre José Leite de Aguiar de se dedicar mais ao seu curral bovino do que às questões religiosas, e de ter sucumbido cedo às tentações da carne, vivendo licenciosamente com índias e mestiças. Sacerdotes assediavam sexualmente negras, nativas e em fase mais avançada da colonização, as nem sempre recatadas donzelas e matronas da sociedade.

  Vista do Quartel de N. Sra. da Assunção, antigo Schoonenborch, com o gasômetro ao fundo (arquivo Nirez)
Longe dos olhares dos superiores do bispado de Olinda, a ação dos padres da aldeia da fortaleza e das vilas interioranas era quase sempre de complacência com as "faltas" dos colonos, soldados e autoridades da capitania, mesmo porque as relações entre o poder constituído e o clero, nem sempre foram cordiais. 
Em muitos momentos verificavam-se confrontos entre os representantes da Coroa e os padres. Em 1787, uma carta dos párocos das igrejas matrizes da capitania do Ceará denunciava o capitão-mor João Batista de Azevedo Coutinho de Montauri. A Igreja se dizia vítima da arbitrariedade da autoridade, que era comparado a Nero.  

Entre os filhos de padres notáveis da provinciana Fortaleza, estava o escritor José de Alencar, da estirpe do padre José Martiniano de Alencar (Senador Alencar), polêmico político do século XIX, que se amasiou com uma prima.

Os padres que desviaram caminho dos votos de castidade são personagens em um cenário maior. O século XIX pegou a Igreja Católica desprevenida. Quando os anos 1800 chegaram, trouxeram os protestantes (O primeiro a chegar ao Ceará foi o reverendo presbítero De Lacy Wardlan em 1882, num programa missionário promovido pelas igrejas Presbiterianas do sul dos Estados Unidos), a maçonaria, e a corrente filosófica que explica racionalmente a fé. A Igreja Católica reagiu no segundo tempo. O Concilio Vaticano (1869-1870) determinou que só uma estrutura centralizada poderia fazer o catolicismo triunfar. 


 Com a criação da Diocese em 1861, o padre Luis Antônio dos Santos foi nomeado o primeiro bispo do Ceará. Ele permaneceu a frente da Diocese entre 1861 e 1881. Nesse período fundou o Seminário da Prainha (1864), e o Colégio da Imaculada Conceição (1865).  fotos do Arquivo Nirez

É por esse motivo que o Ceará se prestará tão bem aos propósitos da reforma religiosa do Brasil, em curso no século XIX. Em 1861 se instala a Diocese do Ceará, sete anos depois de autorizada.  Fortaleza então se equipara ao Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. E se completa a emancipação do Ceará, que ainda estava ligada eclesiasticamente a Pernambuco.  A criação da Diocese do Ceará foi um momento de luta entre a Igreja e o Estado.
 
fontes:
História do Ceará, de Airton de Farias
Revista Fortaleza, fascículo 2, de 16 de abril de 2006

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