Praça do Ferreira atual |
Os cafés eram uma tradição do centro
da cidade: ponto de encontro de intelectuais, poetas, seresteiros e da
população masculina em geral. Não era um espaço destinado às mulheres. Nos
cafés se debatiam os assuntos que impactavam a cidade, os acontecimentos
políticos e sociais, os últimos lançamentos literários, e até assuntos menos
nobres, como a vida alheia. As vezes se acertavam diferenças e se confrontava
as divergências. Servia-se café, aluá, licor, cachaça, vinho, refresco, caldo
de cana, e o que mais fosse procurado.
Os cafés da Praça do Ferreira foram
uma espécie de precursores desse tipo de ambiente eclético. Eram quiosques de
madeira artisticamente trabalhada, ocupavam os quatro cantos da Praça do Ferreira e foram
construídos em fins do século XIX.
O pioneiro foi o Café Java,
localizado na esquina noroeste da praça, famoso por ter acolhido a Padaria
Espiritual, grupo de intelectuais de caráter inovador, organizado sob o comando
do poeta Antônio Sales em 1892. Seu primeiro proprietário foi Manuel Ferreira
dos Santos, vulgo Mané Côco, aracatiense emigrado para a capital. Naquele
tempo, Mané Côco era o tipo mais singular de Fortaleza, alvo de imensa
popularidade. Antônio Sales dizia sobre o dono do Java que, se estivesse em
Paris, ele estaria a frente de um dos famosos cafés excêntricos de Montmartre.
O Java passou depois para a propriedade de Ovídio Leopoldino da Silva e esteve
durante algum tempo aos cuidados de Antônio Silva Lima, pai do escritor
cearense Herman Lima.
Decorridos em torno 5 anos da
construção do Java, outros dois quiosques foram levantados na Praça do Ferreira
com autorização da Câmara Municipal. Seu construtor o negociante Pedro Ribeiro
Filho subsidiou as obras com a condição de explorar o comércio por 10 anos, sem
isenção de impostos e com sua entrega, findo o prazo, ao patrimônio do
município. Estes quiosques foram batizados de Café do Comércio, e Café Elegante.
O Café do Comércio era o maior deles
e pertenceu inicialmente a José Brasil de Matos, e depois passou por inúmeros
donos. O Café Elegante, assobradado como o do Comércio teve várias denominações
e foi também propriedade de diversos. Havia ainda no canto sudeste da praça, o
Café Iracema, o mais procurado como casa de pasto. Pertenceu a Antônio Teles de Oliveira e também
passou por diversas mãos.
Café do Comércio |
Café Elegante - ao fundo o Cine Majestic Café Iracema |
Esses quiosques foram preservados pelo intendente Guilherme Rocha quando, no início do século XX, em 1902, embelezou a praça do Ferreira convertendo o logradouro num jardim. A parte mais central do quadro cercado de gradis, e no interior, floridos e belos canteiros cercados de bancos. Ao redor do vasto piso de cimento róseo, nos quatro lados, uma série de frades de pedras de lio.
Os cafés ganharam vida e puderam
estender suas mesas e cadeiras ocupando uma área maior. A essa área cercada e
ajardinada recebeu o nome de Jardim 7 de Setembro, inaugurada solenemente na
data comemorativa dos oitenta anos da Independência do Brasil. No lado sul,
entre os Cafés Elegante e Iracema, erguia-se um belo chafariz com quatro
torneiras. No centro, um catavento puxava água para um depósito que abastecia
oito tanques destinados à manutenção dos canteiros, situados nas partes em que
se dividia o trecho central, cercado de gradis, cortados por dois passeios em
forma de cruz, em cujas extremidades havia quatro portões de ferro.
Vinte e oito lampiões a gás
iluminavam o jardim interno, enquanto fora deste mais vinte combustores clareavam
toda a praça. Os quiosques concorriam para melhorar a claridade do ambiente, e
consequentemente uma maior circulação dos pedestres. Este movimento cresceria
com a inauguração do Cine Polytheama em 1910, dos bondes elétricos em 1913 e do
Cine Majestic, 1917. A Praça do Ferreira nesse período tornou-se o lugar mais
frequentado da cidade, uma pequena amostra do que Fortaleza queria ser no
futuro: um local público bonito, confortável e iluminado, com jardins, estátuas
e colunas, cafés, cinemas, transporte fácil, frequentado por pessoas bonitas e bem-vestidas.
No entanto, no ano de 1920, o prefeito Godofredo Maciel em sua primeira administração, mandou demolir os quiosques. Quando ao sair de uma sessão de cinema, o escritor Antônio Sales notou que os cafés estavam sendo demolidos, inclusive o seu querido Café Java e escreveu: esta noite, ao sair do cinema, parei defronte dos destroços fúnebres do Café Java, sacrificado à estética da Praça do Ferreira, que é o centro vital de nossa urbe. E nessa contemplação, veio-me uma grande tristeza e uma grande saudade. Ali reinou Mané Coco, o fundador dessa instituição popular que era o café, hoje desaparecido.
Além dos cafés, o
prefeito também retirou as grades do jardim 7 de Setembro e mandou construir um
coreto; as laterais receberam recortes para estacionamento de automóveis e
bondes, desafogando o trânsito nas Ruas Major Facundo e Floriano Peixoto.
Extraído do livro “A Praça” de Mozart
Soriano Aderaldo/Tipogresso/Fortaleza,1989. E outros/publicação Fortaleza em
Fotos/Fotos do Arquivo Nirez, postal antigo e Fortaleza em Fotos
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