terça-feira, 16 de março de 2010

No escurinho do cinema

cine Majestic era cinema e ao mesmo tempo teatro. Sofreu dois incêndios. Nos andares de cima do prédio, os quartos eram alugados para uso residencial. (foto arquivo NIREZ)

O cinema trouxe para as autoridades e para os defensores da moralidade de Fortaleza, preocupações novas a respeito do comportamento das plateias cinematográficas e dos problemas que poderiam advir dentro das salas de projeções. Tanto a situação quanto o ambiente eram completamente novos: um grupo heterogêneo, de classes sociais diversas, reunido frente a uma tela, numa condição de proximidade e aglomeração, numa sala escura, num espaço fechado.

Uma das maiores preocupações era com os gatunos, que frequentavam as salas de projeção e, no primeiro descuido, subtraiam pertences alheios;
Além dos gatunos, outro personagem surgiu no espaço, causando pavor na mulherada: os bolinas, nome pelo qual ficaram conhecidos os rapazes afoitos ou senhores, alguns até de idade provecta, que se aproveitavam do escurinho para conferir os atributos do sexo oposto.

Um jornal local, de 1908, denunciava o abuso de alguns frequentadores do Teatro Iracema (espaço adaptado no clube de mesmo nome para exibir filmes), que tinham por hábito comprar lugares na pior colocação e trocá-los por outros melhor colocados (que custavam mais caros).
Outro jornal advertia para o costume de alguns indivíduos, que se postavam próximos ao aparelho de projeção, diante da luz e faziam gestos obscenos que apareciam na tela.

Mas o que mais incomodava aos frequentadores, era a molecagem da plateia dentro dos cinemas, a ponto de muitas vezes, ser necessário chamar a polícia, para coibir a falta de decoro e a algazarra. Frequentadores assíduos revelavam os problemas por eles enfrentados, além das costumeiras reclamações contra o calor ou condições inadequadas do cinema: vaias, apupos, assobios, gritos, piadas de mau-gosto, tudo fazia parte da diversão.

Ao final das projeções, uma parte da plateia impaciente por retirar-se do cinema, levantava-se e encobria a visão dos demais, levando outros espectadores a fazer o mesmo; com isso muitos perdiam o final do filme.

Segundo conta o escritor Antonio Girão Barroso, o Cine Majestic tinha “geral”, um lugar mais afastado da tela onde o ingresso era mais barato. Muita gente comprava a entrada normal e ia para a geral, fazer bagunça. Jogavam cascas de banana, caixas de fósforos, pontas de cigarros e até coisas piores, nos que estavam embaixo, nas cadeiras.

Lembra que certa vez passava um filme, no qual a certa altura da fita havia uma cena de um casal perdido na mata. A moça tira um cigarro, fala em inglês e aparece a legenda em português: “você gosta de tabaco?”. E um sujeito responde na plateia: “eu aprecio e muito”.

Para disciplinar o comportamento dos frequentadores dos cinemas, surgiram os lanterninhas, na década de 1930, com a função não só de guiar os espectadores às suas poltronas, mas também para botar ordem na casa.

Extraído dos livros:
Roteiro Sentimental de Fortaleza: depoimentos de História Oral de Moreira Campos, Antonio Girão Barroso e José Barros Maia/ Coordenadores: Simone de Souza e Sebastião Rogério Ponte.
Verso e reverso do Perfil urbano de Fortaleza
Autor: Gisafran Nazareno Mota Jucá.

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