segunda-feira, 1 de março de 2010

A Cidade Ilegal

...não uma, mas muitas cidades. Há, no entanto, pelo menos duas, a dos pobres e a dos ricos,
e em cada uma delas estão incluídas muitas outras.
Você se enganaria totalmente se as considerasse como um único Estado.
Platão (A República)

Moradia inadequada. As margens de rios são áreas de preservação permanente e consideradas áreas de risco por estarem sujeitas a inundações e alagamentos,


o muro do condominio de classe média invadiu a calçada. O espaço destinado ao trânsito de pedestres é minimo

imóvel sem atributos de urbanização.

O crescimento desordenado dos grandes centros urbanos, aliados a processos de urbanização diferenciados acabaram mostrando as diversas faces que uma mesma cidade pode apresentar, dependendo do bairro e da classe social da população que o ocupa.

A face mais visível é a existência de duas cidades dentro da cidade, que convivem e coexistem pacificamente, lado a lado: a cidade legal onde se encontra presentes todos os serviços e infra-estrutura urbana, e a cidade ilegal ou clandestina, que se caracteriza pela ausência de normas legais e urbanísticas.

A cidade legal pode ser identificada com o processo de expansão e de ocupação urbana planejada, amparada por instrumentos jurídicos e práticas políticas legais. É aquela que observa uma determinada ordem, é baseada em um projeto e costuma apresentar a chamada urbanização completa, onde todos os itens de consumo coletivo, de equipamentos e serviços encontram-se presentes.

a cidade ilegal está associada ao processo informal de ocupação urbana, o qual ocorre sem qualquer participação do poder público ou de suas instâncias administrativas.

Segundo noticia publicada pelo jornal O Povo (edição de 25/02/2010), durante o ano de 2009, nada menos do que 370 obras foram embargadas em Fortaleza, pelas secretarias executivas regionais, a maioria por falta de licenciamento prévio. O licenciamento prévio autoriza a realização da obra e especifica todas as suas características.

Dentre as obras embargadas pela prefeitura estão novas construções, reformas e ampliações de pequeno e grande porte que desobedecem a legislação; muros que avançam sobre a calçada, construções que desrespeitam os recuos determinados.
Fiscais da Prefeitura, responsáveis pelos embargos alegam que de modo geral, a população sabe que o inicio da obra depende de uma autorização, mas aposta na falta de fiscalização e prefere correr o risco de ver sua obra multada e embargada.

A falta de licenciamento não é, no entanto, por culpa exclusiva ou por negligência da população; em primeiro lugar porque o Código de Obras e Posturas, é um instrumento de gestão do qual a maioria absoluta da população nunca ouviu falar e nem lhe conhece o conteúdo; além do desconhecimento da norma, há o trâmite burocrático e as despesas com taxas.

Sem submeter o projeto ao órgão municipal é quase certo que a obra acabe desobedecendo aos parâmetros oficiais. O prejuízo não é só do controle urbano, da estética da cidade, da circulação de vento ou do vizinho que se sente invadido. A falta de regulamentação da obra pode resultar em acidentes, sem contar que, depois de pronto o imóvel não possui documentação, o que dificulta uma futura comercialização.

Todos os serviços de obras, reformas, ampliações precisam de um licenciamento expedido pela prefeitura de Fortaleza. A autorização é concedida com base no Código de Obras e Posturas que regulamenta o que é e o que não é permitido no espaço urbano.

A situação de ilegalidade em Fortaleza não é um atributo da classe social, nem se restringe aos pobres. Existem na cidade inúmeros empreendimentos, em todas as áreas de comércio, indústria e lazer que funcionam irregularmente, sem jamais serem incomodados pelos fiscalizadores, e só quando acontecem incidentes é que são descobertos e responsabilizados.

Avalia-se que nas maiores cidades do Brasil, entre 40% e 70% da população, vive, mora, trabalha ou se diverte ilegalmente.

A ilegalidade é a regra, não é mais exceção.

Fonte da pesquisa: As Cidades da Cidade/ Carlos Antonio Leite Brandão (org) Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.

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