domingo, 20 de dezembro de 2015

As Revoltas Urbanas: A Queda do Governador Clarindo de Queiroz

José Clarindo de Queiroz nasceu em Fortaleza, na Rua Sena Madureira n° 71, no dia 28 de abril de 1841. Foi indicado para o cargo de governador do Ceará pelo Marechal Deodoro da Fonseca  através de decreto federal de 4 de abril de 1891. No período inicial da República, o Marechal Deodoro mobilizou forças na tentativa de aplicar um golpe de estado, fechando o congresso nacional e decretando estado de sítio.


A maioria dos governos estaduais apoiou a iniciativa, pois tinham sido nomeados pelo próprio presidente.  Ao dissolver o congresso em 3 de novembro de 1891, Deodoro pegou praticamente de surpresa as lideranças civis e militares. O vice-presidente Floriano Peixoto, com a ajuda do almirante Custódio José de Melo, reagiu ao golpe.  

Praça General Tibúrcio no início do Século XX, com o Palácio da Luz e a Igreja do Rosário

Com a saúde debilitada e sob criticas por parte da oposição, Deodoro renunciou vinte dias depois, passando a presidência para Floriano Peixoto.  Este iniciou o novo governo mandando destituir todos os que se solidarizaram com o antecessor. 

A ascensão de Floriano Peixoto à presidência da República e sua caça aos governadores que apoiaram Deodoro, soou como uma ameaça para Clarindo de Queiroz. Contando com o apoio do Congresso  Cearense, de parte da imprensa, da maioria dos oficiais do 11° Batalhão do Exército e até com certa simpatia popular, o general começou a sofrer intensa pressão do Presidente da República para que deixasse o governo. Recebeu de delicados memorandos pedindo seus serviços na capital do país a agressivos ultimatos.  A oposição bem articulada por Nogueira Accioly conspirava abertamente contra Clarindo. Este, a tudo resistiu, pelo menos até 16 de fevereiro de 1892.

Deposição do governador Clarindo de Queiroz pelas forças que apoiavam o Presidente Floriano Peixoto
 
Nessa data, após o governo federal mandar o 11° Batalhão “realizar exercícios práticos” em Maranguape (no intuito de esvaziar o apoio a Clarindo), alunos do Colégio Militar, marinheiros e o restante da força federal dirigidos pelo major Bezerra de Albuquerque, se revoltaram e usando canhões e metralhadoras, exigiram a renúncia do general.
 
Uma multidão se postou nas imediações do Palácio da Luz, onde o governador resistiu por uma noite, ao cerco dos revoltosos que queriam sua saída do governo do Ceará. O centro de Fortaleza virou uma praça de guerra. Clarindo de Queiroz  apoiando-se numa minguada força policial e em alguns civis (entre os quais o Conselheiro Rodrigues Junior) resistiu aos golpistas. Os oposicionistas levantaram barricadas e bombardearam a sede do governo na Praça General Tibúrcio. O tiroteio se estendeu por toda a noite e provocou pânico na população.

uma multidão se reuniu nas imediações do Palácio da Luz onde o governador resistia ao cerco dos revoltosos que queriam sua saída do governo

Na manhã do dia 17, com o Palácio da Luz crivado de balas, o governador, sem munição para continuar a luta, rendeu-se aos inimigos e entregou o cargo ao tenente-coronel José Freire Bezerril Fontenele, deputado e comandante interino do Colégio Militar. Treze pessoas perderam a vida no confronto. A praça foi completamente destruída – num canto desta, curiosamente, encontrou-se a estátua do General Tibúrcio, tombada de seu pedestal, em pé, após ser atingida por tiros de canhão. 

Clarindo em seguida, partiu para o Rio de Janeiro, onde em dezembro de 1893 viria a falecer em decorrência das torturas sofridas na prisão, pois fora um dos 13 generais desterrados por decreto de Floriano Peixoto ao pedir a renúncia deste. 

estado em que ficaram a Praça e o Palácio da Luz depois dos ataques que culminaram com a deposição do governador Clarindo de Queiroz. A estátua do General Tibúrcio foi atingida com tiros de canhão e caiu de pé.

O interior do Palácio da Luz ficou destruído depois do ataque contra o governador. (foto cedida por Isabel Pires)
 
No dia posterior ao golpe, Bezerril passou o comando do executivo cearense ao vice-presidente Liberato Barroso.  Começa então, uma intensa perseguição aos partidários de Clarindo de Queiroz e Deodoro da Fonseca. O grupo dos maloqueiros e Rodrigues Junior eram os mais visados. Foram efetuadas várias prisões arbitrárias e demissões de funcionários públicos e até de quatro desembargadores do Tribunal de Apelação (atual Tribunal de Justiça) e 12 juízes do interior. Além disso revogou-se a Constituição Estadual de 1891, promulgada durante a gestão de Clarindo de Queiroz e dissolveu-se o congresso cearense – composto por câmara, e senado estadual de maioria pró-Deodoro – sendo convocado outro com poderes constituintes a 12 de maio.

Este novo congresso, promulgou a segunda Constituição do Ceará em 12 de julho de 1892. Na mesma data, Liberato Barroso deixou o governo do Estado, sendo substituído interinamente por Nogueira Accioly, eleito pelo Congresso primeiro vice-presidente. A 27 de agosto empossou-se no governo o tenente-coronel José Freire Bezerril Fontenele, escolhido também indiretamente pelos deputados estaduais.
Antônio Pinto Nogueira Accioly, o grande articular da derrubada de Clarindo de Queiroz

O grande articulador e vitorioso com a queda de Clarindo de Queiroz foi Nogueira Accioly. Contando com o apoio partidário dos cafinfins, do Comendador Boris (da Casa Boris), do Barão de Ibiapaba e do governo federal, seu grupo ascendeu ao controle da máquina administrativa cearense. Durante o governo de Bezerril consolidou-se do regime republicano no Brasil e no Estado. O governador procurou adequar os municípios ao novo regime, e aqueles que não cumprissem as novas exigências, seriam anexados ao vizinho que tivesse a situação já regularizada. Vários adversários acabaram perseguidos e forçados a emigrar. 

Como presidente, Bezerril não realizou nenhuma obra de relevo para o Estado. Limitou-se a arrecadar quantia considerável de recursos  através de uma eficiente máquina tributária. Era o que ele chamava de “reserva sagrada”. Nisso tudo, Nogueira Accioly – escolhido senador em 1894 – contribuía, participava, influenciava. Em 1896 foi escolhido como sucessor de Bezerril. Nas décadas seguintes sofreria o Estado nas mãos de uma das mais duradouras oligarquias de sua história: a Oligarquia Accioly.

Fontes:
História do Ceará, de Airton de Farias
A História do Ceará passa por esta rua, de Rogaciano Leite Filho 
fotos do arquivo Nirez e do livro "Coisas que o Tempo levou"
        

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