segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Estação de Otávio Bonfim


A estação do Quilômetro 3 foi inaugurada em 1922 pela Rede de Viação Cearense. Logo depois teve o nome alterado para Matadouro por estar junto na época a um abatedouro de gado. O local escolhido para a instalação da estação,  o bairro Farias Brito, surgiu de uma povoação que margeava a antiga Estrada para o Soure (atual Caucaia). 


Até 1917, a linha instalada pela antiga Estrada de Ferro Baturité passava por outro trajeto, que corresponde hoje a Avenida Tristão Gonçalves, até a Estação Central. A partir daí, os trilhos foram arrancados e um novo trajeto foi estabelecido mais a oeste do centro, cortando os bairros do Jacarecanga, Otávio Bonfim e Porangabuçu, chegando até Couto Fernandes.   

Nesse ponto se juntava com a linha antiga, pouco antes da futura estação de Couto Fernandes, e daí seguindo rumo sul do Estado, fazendo nesse trajeto uma grande tomada à esquerda da linha original. Anos mais tarde o nome da estação do Matadouro foi alterado para Otavio Bonfim, em homenagem a um engenheiro da RVC. 

No mesmo atordoamento chegaram à Estação do Matadouro.
E, sem saber como, acharam-se empolgados pela onda que descia, e se
viram levados através da praça de areia, e andaram por um calçamento pedregoso, e foram jogados a um curral de arame
onde uma infinidade de gente se mexia, falando, gritando, acendendo
fogo. Só aos poucos se repuseram e se foram orientando.
(Rachel de Queiroz - O Quinze, pág. 39)


A estação do Matadouro, mais tarde Otávio Bonfim, é citada no livro "O Quinze" de Rachel de Queiroz, como porta de entrada para as pessoas que sofriam com a seca, procedentes de todo o interior do Ceará. Mas a estação só foi inaugurada em 1922, não poderia, portanto, ter sido utilizada pelos retirantes da seca de 1915. Como o romance foi publicado em 1930, pode se concluir que a escritora ilustrou a história utilizando o local que só existia de fato, na época em que a obra foi escrita. 

Nas proximidades da estação, no bairro do Alagadiço, foi formado um dos famosos campos de concentração,  local onde os retirantes ficavam confinados, vigiados por soldados. Ali os retirantes podiam fazer tudo, contanto que não saíssem de lá. O governo fornecia alguma alimentação, água, e prometia soluções que nunca chegaram.  O objetivo era evitar que os miseráveis, vítimas da seca, entrassem em Fortaleza. Foram os flagelados que ajudaram a formar os bairros Alagadiço, Moura Brasil, e Pirambu. 

Conceição atravessava muito depressa o Campo de Concentração.
Às vezes uma voz atalhava:
- Dona, uma esmolinha...
Ela tirava um níquel da bolsa e passava adiante, em passo ligeiro,
fugindo da promiscuidade e do mau cheiro do acampamento.
Que custo, atravessar aquele atravancamento de gente imunda, de latas
velhas, e trapos sujos!
Mas uma voz a fez parar.  me conhece?
( Rachel de Queiroz - O Quinze, pág. 24)


Em 1979, o prédio original da estação foi demolido para acolher uma nova. Em maio de 2009, parte da linha, o trecho entre Parangaba e Otavio Bonfim foi desativado. Com isso, o trem da Metrofor passou a rodar apenas da estação de Parangaba para a estação terminal de Vila das Flores, em Maracanaú. O trecho Estação João Felipe/Otavio Bonfim foi mantido com um trem cobrindo ida e volta entre os dias 11 e 17 de maio, e sustado nesse dia pois o número de passageiros em sete dias não havia passado de quatro por viagem.





Com a implantação do Metrofor, gradativamente, as antigas estações ferroviárias foram sendo demolidas, e a de Otávio Bonfim não escapou da sina: foi demolida parcialmente,  restando as colunas de sustentação e as fundações. Agora, um grupo de ativistas luta pela restauração e preservação da Estação do Otávio Bonfim, e pelo reconhecimento de sua importância histórica e cultural. Uma vez recuperado, o prédio deveria abrigar um memorial para lembrar vítimas das secas.

Lembrando que Fortaleza já contou com um Museu da Seca, que estava localizado no Palacete Carvalho Mota, no Centro, na esquina das ruas General Sampaio e Pedro Pereira. O prédio abrigou o Museu da Seca no período de 1985 até 2003, ano em que fechou as portas para uma restauração que não se concretizou. O imóvel ainda passa por reformas, mas com previsão de reabrir em breve, não mais como museu. 

fotos do site Estações Ferroviárias
fotos atuais Fortaleza em fotos
     

Um comentário:

Érica Barretto disse...

Nossa, como é bom saber um pouco mais sobre o passado de Fortaleza.. Quando vejo essas fotos em preto e branco, me transporto em pensamentos para tentar vivenciar como seria as coisas nessa época. Obrigada por dividir isso com a gente!