Em meados dos anos 40, a população de Fortaleza, de cerca de
200 mil habitantes, assim como as demais cidades do Brasil e do mundo, vivia
ainda a euforia pelo término da Segunda Guerra Mundial, e mostrava um clima de comemoração pelo fim do conflito.
Talvez por ser tão pequena, Fortaleza era uma cidade com
ares aristocráticos, era francesa no seu aculturamento.
A Franca determinara a
formação das senhoritas de boa estirpe, comandava a moda, o padrão das lojas, e
de suas artísticas vitrines, a vida social que acontecia no Clube Iracema, no
Clube dos Diários e no Ideal Clube. Por isso era comum naquela época, as
moças "de boas famílias"conversarem em francês e tocarem piano nos fins de tarde, nas
senhoriais moradias do centro da cidade.
Edifício onde funcionava a Casa Parente na Rua Guilherme Rocha esquina com a Barão do Rio Branco
Também era chique assistir à sessão das sete e meia do
Cine Diogo, fazer compras na Casa Sloper, ver as vitrines da Casa Parente,
merendar no Jangadeiro ou no Eldorado, ter na sala uma ampliação colorida da Aba Film,
usar perfume Promesa, encomendar chapéus às Irmãs Almeida, frisar os cabelos na
Madame Santinha, comprar tecidos finos na A Cearense ou na Broadway e, aos
domingos, assistir a missa das 8 na Capela das Missionárias, na Avenida Rui
Barbosa.
anúncio da loja A Cearense (Revista Verdes Mares)
Vila Morena (Estoril) imóvel construído na Praia de Iracema entre 1920 e 1924 que durante a 2a. Guerra funcionou como cassino dos oficiais norte-americanos, baseados em Fortaleza.
Fortaleza nos idos de 1945 compunha-se além do centro, que
era comercial e residencial, de poucos bairros e, consequentemente, de poucas
linhas de bondes e de ônibus. A vida era
pacata. Nas calçadas das residências, à noite, formavam-se as chamadas rodas de
calçadas com papos variados e as reuniões iam noite a dentro. As ruas muito limpas eram pavimentadas
com paralelepípedos, com pedras toscas ou concreto. As praças eram ajardinadas,
fartamente arborizadas e frequentadas por pessoas de todas as idades. Havia segurança,
não se ouvia a palavra assalto e ladrões, só os de galinha. Podia-se andar
livremente, a qualquer hora do dia ou da noite, em todos os quadrantes da
cidade, sem o menor receio.
Praça da Sé, anos 40 (cartão postal da época)
Não havia exploração nem carestia, os preços das
mercadorias, principalmente dos chamados “secos e molhados” passavam até um ano
sem serem alterados. A moda também era
duradoura. Roupas, sapatos e chapéus eram usados até a saturação. Não havia
técnicos de marketing determinando que a moda tinha de ser efêmera e mudar
continuamente para agradar às indústrias têxteis.
anúncio da Alfaiataria Amâncio, uma das mais famosas da cidade
Tampouco havia a indústria da confecção,
todo mundo era obrigado a comprar os tecidos e procurar os alfaiates e as costureiras
para a confecção de suas roupas.
Os homens usavam ternos de linho irlandês de dia, e de
casimira inglesa à noite. As mulheres
usavam muita seda francesa, com estampa
florais sobre o fundo negro, musselinas para os vestidos de noite, com muito
laço, muito drapeado e fivelas. Os sapatos eram quase sempre combinados de
pelica e camurça, abertos de preferência e, não raro, os ditos plataforma,
inspirados em Carmem Miranda. As luvas e os chapéus eram indispensáveis, até
para as compras; os decotes eram discretos, as saias desciam até esconder os
tornozelos envoltos em meias de seda.
anúncio da loja Crysanthemo
As compras de mercearia e comestíveis importados eram
efetuadas na Casa Tupy, na Casa Joana D’Arc, na A Miscelânea, na Casa Leitão,
na Casa Tabajara e na Leão do Sul. O Posto Mazine oferecia os melhores carros
de aluguel e era de bom tom, tomar sorvete no Café Belas Artes, no Palácio do
Comércio, após sair das sessões noturnas do Diogo e do Moderno.
Os cinemas do
centro apresentavam duas sessões, sendo uma às três e meia e a outra às sete e
meia. Assim era Fortaleza em 1945, quando as mulheres se arrumavam para sair,
se faziam elegantes para ir ao cinema, quando as bijuterias eram filigranas e
marcassitas, quando as meias eram de seda, quando as sombrinhas protegiam dos
raios solares as “cútis aveludadas como pétalas de rosas”.
anúncio do Cine Moderno (do livro A Tela Prateada)
Extraído do livro de Marciano Lopes
Royal Briar, a Fortaleza dos anos 40.
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