segunda-feira, 28 de julho de 2025

O Jardim Zoológico da Cidade da Criança

 


Em 1946 Onélio Porto mantinha um terreno particular, cedido pelo Colégio Cearense da Ordem dos Irmãos Maristas. Nesse local Onélio criava pássaros e outros animais. Em 1951, o vereador Lúcio Magalhães propôs a criação de um jardim zoológico, na área do Parque da Liberdade, para onde seriam transferidos os animais de Onélio Porto, juntamente com outros criados pelo sargento do Exército, conhecido por Prata.

Eram ao todo 565 animais, de diversas espécies, que ficariam sob a responsabilidade da Secretaria de Educação e Cultura do Município, e aos cuidados de Onélio Porto. O mini zoológico permaneceu por quase duas décadas na Cidade da Criança sempre com muitas dificuldades, com instalações inadequadas à maioria dos bichos e água sem tratamento e alimentação escassa. Também tiveram alguns problemas devido a interação entre animais e crianças do Jardim de Infância. Então Onélio Porto retirou seus animais como forma de protesto. A partir de 1979 o zoológico foi transferido para o Horto Florestal numa área do Parque Ecológico do Passaré.




Uma crônica de Blanchard Girão relata um incidente havido com um amigo quando o zoológico ainda estava no Parque da Liberdade.

O amigo ficou até altas horas bebericando com outros notívagos contumazes no bar localizado no Passeio Público, na Avenida Caio Prado. Encerrada a noitada etílica, os antigos companheiros de bancos da faculdade, tomaram cada qual o seu rumo. O amigo do cronista dirigiu-se à Praça do Ferreira, ponto habitual do local de encerramento das noitadas do bloco dos que ficavam na praça até muito depois da meia-noite e ponto de partida para os cabarés que funcionavam nas redondezas.

Tomou o rumo da praça, quando à altura da Rua Senador Alencar proximidades da Rua Major Facundo, avistou algo estranho, a poucos metros. Mas estranho ainda, porque na sua visão aquilo era uma onça... e vinha em sua direção. Uma onça em pleno centro da cidade! raciocinou que realmente devia estar muito bêbado, e o bicho vindo em sua direção! Aquilo era grande demais para ser confundido com um cachorro!  

Os efeitos do álcool não tinham lhe tirado todos os sentidos, especialmente o instinto de preservação. Com medo, recostou-se à parede, como a procurar um abrigo salvador. E a onça como se estivesse em seu ambiente, caminhava sem pressa, investigando. De repente, pelo olfato interessou-se por uma grande lata de lixo entreaberta na calçada. Para lá se dirigiu, faminta, à procura de algo que lhe aplacasse a fome.



Foi o chamado instante decisivo. Arrancando as últimas forças das pernas, o amigo fugiu em desabalada carreira em direção à praça. Lá encontrou alguns companheiros de boemia, a quem relatou a sua incrível visão: ninguém o levou a sério. Desacreditado, tonto pela cerveja consumida no bar do Passeio Público, resolveu ir embora, em direção a sua casa na Floriano Peixoto. De longe, ainda ouvia os gritos de gozação dos amigos: “olha a onça, nego véi” “cuidado com a onça”,” eta cachaça da peste, dá até pra ver onça na Praça do Ferreira”

O susto ainda estampado no rosto, o rapaz se depara ao entrar em casa, com a avó, a quem transmite sua fantástica história. E a avó carinhosa foi preparar um café forte e amargo, servido junto com a reprimenda “você andou bebendo de novo, menino! deixe disso!”.  

Assim, desacreditado por todos o nosso boêmio notívago foi dormir; manhã cedo, ainda de ressaca, não tardou em ler nas bancas, as manchetes dos jornais em letras grandes: “Onça foge do Parque e é morta a tiros pelos bombeiros”.  Era a confirmação do episódio para desmoralizar a todos os incrédulos, se um dos seus companheiros que estivera na Praça do Ferreira na noite anterior, não tivesse espalhado um boato pela cidade: a de que o rapaz fora ao Parque da Liberdade, onde ficava o mini zoológico de Onélio Porto, soltar a onça para provar sua história”.

Na verdade, a onça escapara de sua jaula, perambulava pelas ruas centrais, quando esteve a poucos passos de nosso personagem. Horas depois, pôs em polvorosa os moradores do Pirambu, quando acabou abatida a tiros de fuzil pelos soldados do Corpo de Bombeiros.

    

Fontes: 

Caminhando por Fortaleza, Francisco Benedito. 1999

Sessão das Quatro, cenas e atores de um tempo mais feliz, de Blanchard Girão, 1998.

fotos do Parque da Liberdade: IBGE e postais antigos


 

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