terça-feira, 23 de agosto de 2022

Identificação das Ruas e Numeração dos Prédios

 

Quem diria que nossa Fortaleza, atualmente com respeitáveis 2.703.391 pessoas (IBGE estimativa 2021), um dia foi tão pequena que não tinha, (nem precisava) de placas de identificação de logradouros, nem números das portas para localizar moradores ou comércios.



Rua Sena Madureira, antiga Rua Nova dos Mercadores


Nos primórdios da Vila os nomes das ruas e vielas eram dados pelos moradores e adotados pelo poder público. Alguns nomes antigos eram tão naturais e apropriados que, por si mesmos, estavam indicando sua procedência, tais como as ruas da Assembleia, da Municipalidade, do Chafariz, do Cajueiro, do Quartel, do Gasômetro, da Cacimba, a Rua de Baixo, de Cima, da Direita...


Com o passar do tempo, os logradouros foram sendo disciplinados. A partir de 1800 a cidade já contava com um arruador, mas o disciplinamento começou realmente a partir de 1812, com a chegada do governador Sampaio que trouxe a Fortaleza, o tenente coronel de engenheiros Silva Paulet, que elaborou a “Planta do Porto e Villa da Fortaleza”, em 1813.


A Decisão sobre a aposição de placas nas esquinas com indicação da nomenclatura das ruas, ocorreu em sessão da câmara municipal de março de 1818, ainda na gestão de Sampaio, e começou e ser implementada no ano seguinte. Dessa forma, já em janeiro o fortalezense pode ler os nomes das vias públicas da vila.


Com o crescimento e a consequente urbanização, ruas foram alinhadas, becos foram eliminados, as calçadas demarcadas. A nomeação dos logradouros ganhou ares de modernidade, a identificação pela funcionalidade virou coisa do passado. Assim, muitas vias tiveram seus nomes modificados, algumas delas, várias vezes.



Rua Barão do Rio Branco, antiga Rua Formosa


A Numeração nas portas demorou um pouco mais. Em sessão ordinária de 12 de janeiro de 1861, o presidente da câmara Dr. Manoel Soares da Silva Bezerra indicou que se fizesse a numeração e indicação dos nomes de ruas através de tabuletas. Mas a indicação, apesar de aprovada, não foi logo cumprida, tendo sido objeto de nova apreciação por vereadores de nova legislatura. A falta de numeração ensejou a que os comerciantes usassem na divulgação dos seus estabelecimentos, nos anúncios veiculados pela imprensa, o nome de pessoas conhecidas da população, como se nota pelos anúncios publicados em jornais da época:


Aluga-se o armazém que fica embaixo do sobrado onde morou o Dr. José Liberato Barroso, e presentemente a Sra. Dona Thereza da Rocha Moreira”. (Jornal Pedro II, 27.01.1862).


Estabelecimento Fotográfico de Madame Fletcher – Rua Nova na casa onde morou o Dr. Justa (A Constituição, 25.02.1865)


Assim o logradouro era conhecido não pelo seu nome, mas porque fulano ou sicrano morava no local. O costume era tão arraigado entre a população que até o vigário da Sé anunciou pela imprensa, qual seria o percurso de uma procissão, comunicando que o cortejo passaria em frente à casa de determinadas personalidades conhecidas.


“O Sol”, jornal que fazia oposição à Câmara de Vereadores reagiu indignado à  publicação do anúncio, afirmando que o fato de ruas e travessas não terem nomes escritos, nem as casas possuírem numeração, resultava na publicação de notas como aquela, como se Fortaleza fosse uma “povoaçãozinha de meia tigela”, onde a população se orientava pela localização das casas de moradores notórios.


Em janeiro de 1865 o assunto da numeração dos prédios voltou a pauta na câmara, pela fala do vereador Rufino Antunes de Alencar, que lembrou da necessidade de numerar os prédios da cidade e solicitou orçamento elaborado por um engenheiro. Dois meses depois, em março, já aparecem anúncios na imprensa com endereços completos, a exemplo do que foi publicado pelo “O Cearense”, de 8 de março, sobre os serviços prestados por Raimundo Pacheco Amora, de pintura, escultura e douramento, com endereço à Rua da Alfândega, n° 8.


Em 29 de outubro de 1890, por determinação do intendente  municipal, José Freire Bezerril Fontenele (01.01.1890-12.11.1890), a câmara municipal acatou a sugestão de se trocar a denominação das ruas pela numeração, com a alegação de por um fim as contínuas e sucessivas mudanças de nomenclatura, quase sempre oriundas de sentimentos partidários. Fortaleza foi  a primeira cidade do país a adotar esse sistema americano. Os nomes de várias praças também foram substituídos.



A Rua do Rosário foi nomeada pela população e nunca mudou de nome. Virou rua numerada e seis meses depois recebeu seu nome original de volta. É a denominação de rua mais antiga de Fortaleza.
 

A medida "não pegou", nem agradou à população. Vários estabelecimentos comerciais continuaram a anunciar na imprensa utilizando os antigos nomes de ruas e travessas onde estavam situados. Raros foram os que adotaram, e passaram a publicar seus anúncios desta forma:


“Explêndido sortimento de calçados BOSTOK para homens, senhoras e crianças, despachou a Loja Magnólia – Rua 3 - n° 93” (Libertador, 17, 19 e 22.11.1890)


Fatos por Figurinos – Fazem-se vestidos para senhoras e meninas e fatos para meninos pelos figurinos mais modernos e preços módicos – Rua 7D (antiga Rua do Sampaio) n° 73. (O Cearense, 05.02.1890).


Não durou muito. Em 1891, por determinação da câmara, todos os logradouros voltaram a ostentar seus antigos nomes. A intendência mandou colocar em ruas e praças as placas com os nomes pelos quais eram conhecidos. Fortaleza esteve assim oficialmente privada da nomenclatura de suas ruas, praças, travessas por cerca de seis meses.



Praça dos Voluntários, no centro, conhecida por Praça da Polícia 
 

Até hoje, Fortaleza ostenta alguns nomes de logradouros, principalmente praças, que são conhecidos da população por nomes não oficiais. 

Nomes de logradouros que “não pegaram”:

Praça do BNB no centro, nome oficial Praça Murilo Borges;

Praça da Estação, oficialmente Praça Casto Carreira;

Praça da Lagoinha, nome oficial Praça Capistrano de Abreu

Praça da Polícia, nome oficial Praça dos Voluntários;

Passeio Público tem nome oficial de Praça dos Mártires

Praça das Flores, na Aldeota, nome oficial Praça Carlos Alberto Studart

Praça do Liceu, chama-se oficialmente, Praça Gustavo Barroso

Praça dos Leões, o nome oficial é Praça General Tibúrcio

A Praça da Bandeira no centro, chama-se oficialmente Praça Clóvis Beviláqua

A Praça do Cristo Rei ou do Colégio Militar, na Aldeota, é a verdadeira Praça da Bandeira.



Fontes consultadas:   

Coisas que o Tempo Levou – crônicas históricas da Fortaleza antiga, de Raimundo de Menezes

Guia Turístico da Cidade – Prefeitura Municipal de Fortaleza – 1961

Fortaleza – Casas e Ruas Numeradas, de Ismael Pordeus    

Disponível em > https://institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1963/1963-FortalezaCasaseRuasNumeradas.pdf> 

imagens Internet e Fortaleza em Fotos


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