Na primeira metade da década
de 1940, os distritos de Messejana, Mucuripe, Parangaba e Antônio Bezerra eram
como pequenas cidades do interior, de difícil acesso, por causa das estradas
ruins e dos transportes escassos. Ir a um desses distritos implicava numa
viagem. O Mucuripe era então quase isolado da cidade, pois não havia acesso de
veículos, com muitas dunas e outros entraves.
O Mucuripe era distante, isolado e quase desabitado - imagem: Ah, Fortaleza!
No distrito de Antônio
Bezerra, ficava o bairro Brasil Oiticica, nome que herdou da fábrica de
beneficiamento de oleaginosas que se instalou na Avenida Francisco Sá, em 1934.
O bairro começava na primeira linha de trem e terminava na altura da atual
matriz da localidade. Ali os ônibus faziam sua parada final, pois a pista, que
já era bastante estreita, era interrompida por um riacho que a atravessava. A
partir, daí, era só mata, de cajueiros e muricizeiros. Para atingir a Barra do
Ceará, então, pequeno povoado, só a pé ou em lombo de animal. Aos poucos o
bairro foi sendo ampliando e urbanizado, teve o nome foi mudado para Carlito
Pamplona.
prédio do Matadouro Modelo, hoje no local está o Colégio Paulo VI no bairro Jardim América. imagem: Arquivo Nirez
Logo após o Prado, ficava o
Matadouro Modelo, pequeno aglomerado em volta do abatedouro oficial da cidade,
que ficava no local onde hoje se encontra o Colégio Paulo VI. Mais tarde surgiu
neste local o bairro Jardim América. Depois que o matadouro público foi
desativado, os trabalhadores e suas famílias ocuparam uma grande área do
entorno, formando a hoje denominada Comunidade Brasilia. Reúne cerca de 300
famílias, a maioria de baixa renda, que ocupam becos e vielas que desembocam na
Avenida dos Expedicionários e formam a única área carente identificada como
favela do bairro.
Não existiam o Montese, e o então Porangabuçu, atual Rodolfo Teófilo, estava começando a se formar em volta da Lagoa do Bessa. Em tempos anteriores ali existiu uma fazenda, e a matriz de São Raimundo era a capela da propriedade. A capela ficava sobre um verde gramado que circundava a lagoa de águas cristalinas.
A atual Paróquia de São Raimundo Nonato era em tempos passados, a capela de uma fazenda que existia no local. A paróquia foi criada em 1963, por padres redentoristas. imagem: O Povo
Entre o Porangabuçu, que surgia e o São Gerardo, existia o Campo do Pio, pequena comunidade sem ruas definidas. Foi engolido pela Parquelândia. Outro bairro que começava a tomar forma era o Monte Castelo, entre São Gerardo e Brasil Oiticica.
Sem favelas, sem bairros miseráveis, tinha o Morro do Moinho, entre a estação da RVC e o Cemitério São João Batista. O Morro do Ouro situava-se entre o Açude João Lopes e o nascente Monte Castelo. Outro bairro bem próximo do centro e que foi totalmente tomado pelo comércio, era o Seminário, que compreendia a região em torno daquela casa de ensino religioso.
O São João do Tauape localizava-se no final do bairro Joaquim Távora e se estendia até os charcos do Lagamar. Mais além, margeando a BR-116, estava o Alto da Balança e a seguir, vinha Cajazeiras, antes de Messejana.
Pequena e tranquila, com seus 200 mil habitantes, Fortaleza era singela, com poucos bairros, que dependiam do Centro para praticamente tudo. Tirando as mercearias ou cinemas em alguns, tudo o mais só era encontrado no centro: lojas, bancos, correios, farmácias, mercearias finas.
No Joaquim Távora tinha a Casa Girão, armarinho sortido que vendia até tecidos, um cinema – o Joaquim Távora – e a Farmácia Carneiro, da família do repórter Luciano Carneiro. No Otávio Bonfim tinha os cinemas Nazaré, Familiar, a Farmácia São Sebastião e os jardins Japonês e São José, que vendiam flores e confeccionavam coroas fúnebres.
A Aldeota contava com dois cinemas, o Santos Dumont na Praça Cristo Rei e o Ventura, na Avenida Barão de Studart. Na Praça dos Pinhões, tinha a Casa Paranaense, outro armarinho sortido que vendia de tudo. No Jardim América, na Praça Presidente Roosevelt, tinha o Cine América.
As compras de gêneros
alimentícios eram feitas nas bodegas, cujos bodegueiros conhecedores da sua
clientela, formada quase que exclusivamente por moradores da vizinhança,
vendiam fiado e à retalho – ½ barra de sabão, 300 gr de manteiga, ½ pacote de
café - que não havia supermercado para lhes fazer concorrência; as contas de
luz tinham de ser pagas na sede da Light, no Passeio Público; as de água e
esgoto, na Secretaria de Viação e Obras Públicas, na Rua Dragão do Mar.
As famílias ainda guardavam o
hábito das cadeiras na calçada. O Costume predominava mais entre as famílias
que residiam para além da Rua General Sampaio, rumo do Oeste e para os lados
norte e leste além da Senador Alencar e da Governador Sampaio.
Nas ruas mais centrais, onde residiam os mais endinheirados ou projetados socialmente, as casas eram de porões e sacadas avarandadas, o que não significa que naquelas ruas não houvesse os adeptos da velha prática. Mas, geralmente, na hora de pegar o frescor vespertino, damas e cavalheiros não precisavam ir para as calçadas, bastava abrir as portas por trás das varandas, de balaustrada de ferro ou alvenaria trabalhada.
Praça Clóvis Beviláqua (antiga Praça a Bandeira)/ Rua Senador Pompeu
imagem Arquivo Nirez
Havia duas razões entre as
classes mais modestas para o hábito das cadeiras na calçada: a primeira era as
casas pegadas umas às outras, as chamadas paredes-meias, sem áreas de
circulação interna, abafadas como clausuras.
A segunda razão devia-se a necessidade do trato social, já que os clubes eram exclusivos, poucos possuíam rádio, televisão nem sonhava em chegar. Tudo isso motivava as reuniões nas calçadas em frente as casas, com as cadeiras arrumadas de modo a estabelecer a conversa fácil entre vizinhos, tudo amenizado pela brisa, sempre corrente, após o rigor do sol.
A Fortaleza de hoje, com mais de 2,6 milhões de moradores, precisou crescer, de forma desordenada, ampliando bairros, fazendo surgir uns e sumindo com outros, modificando hábitos e costumes, distanciando pessoas. Alguns bairros são verdadeiras cidades dentro da cidade, com toda infraestrutura, como supermercados, bancos, colégios, restaurantes, hotéis, e tudo o mais que compõem uma comunidade. O velho Centro, em torno do qual a cidade gravitava, está esquecido e esvaziado.
Fontes:
"Royal Briar – a Fortaleza dos Anos 40” de Marciano
Lopes
"Crônicas da fortaleza e do siará grande" de
Otacílio Colares
Guia Turístico da Cidade - Prefeitura Municipal de Fortaleza - 1961
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