segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

O Naufrágio da Expedição Científica


Desembarcou em Fortaleza no dia 4 de fevereiro de 1859, vinda do sul pelo paquete “Tocantins”, a famosa Comissão Científica, nomeada pelo governo imperial para estudar as condições naturais das províncias do Norte, e colher material para o acervo do Museu Nacional. Sua criação foi proposta em sessão de 20 de maio de 1856 pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Dom Pedro II aceitou e o Instituto ficou encarregado de indicar pessoas habilitadas para a missão. Isto posto, a comissão ficou assim formada:

O Ceará foi o primeiro destino. A Comissão Científica atravessou o semiárido do Estado entre fevereiro de 1859 e julho de 1861

Para presidir a Comissão Científica foi nomeado o botânico, cirurgião pela antiga Escola Médico-Cirúrgica, doutor em Medicina pela Faculdade de Paris, professor de Botânica e Zoologia pela Universidade do Rio de Janeiro, médico da Imperial Câmara, do Conselho de Sua Majestade O Imperador, Comendador da Rosa, além de outros títulos e condecorações, Francisco Freire Alemão, natural de Campo Grande nascido em 24 de julho de 1797. Além de presidente da Comissão, tinha a seu cargo a seção de Botânica da mesma, tendo como ajudante seu irmão Manuel Freire Alemão.

Desenho da Villa de Pacatuba feito por Francisco Freire Alemão

A Casa da Baronesa é a casa mais antiga de Pacatuba. A construção do século XVIII  serviu de abrigo para os exploradores da Expedição Científica. Abarrotados de equipamentos, em caravana, os cientistas  levaram dias para chegar a Serra da Aratanha, domínios dos barões do café, Antônio Costa e Silva e Maria do Carmo Teófilo e Silva, pais do poeta Juvenal Galeno. 
A casa fica a meio caminho do ponto mais alto da Serra da Aratanha. 


A Seção de Zoologia foi entregue a Manuel Ferreira Lagos, natural do Rio de Janeiro, nascido em 1816. Fizera com distinção todo o curso médico, mas não quis defender tese para obter o grau de doutor. Condecorado com as ordens brasileiras da Rosa e de Cristo, com as estrangeiras da Legião de Honra e da Instrução Pública de França, era secretário perpétuo do Instituto Histórico, 1° Oficial da Secretaria de Negócios Estrangeiros, e diretor da Seção de Zoologia do Museu Nacional. Levou como seus auxiliares os irmãos João Pedro e Lucas Antônio Vila Real.

Sob a responsabilidade de Guilherme Schuch Capanema estava a Seção de Geologia e Mineralogia. Mineiro de origem alemã, nascido em 1824, foi um dos grandes cientistas do Brasil, doutor em Ciências Físicas e Matemáticas pela Escola Militar do Rio de Janeiro, engenheiro pela Escola Politécnica de Viena, professor conselheiro de Estado, Major honorário, Comendador da Rosa e de Cristo, membro do Instituto Histórico e de várias academias e sociedades culturais nacionais e estrangeiras. Por decreto de 26 de fevereiro de 1881, Barão de Capanema publicou muitos trabalhos especializados sobre Matemática, Geogologia e Mineralogia, inclsuive seus "Apontamentos sobre as Secas no Ceará", de 1878. Era seu auxiliar o Dr. Miguel da Silva Coutinho.

Giácomo Raja Gabaglia foi nomeado chefe da Seção de Astronomia e Geografia. O primeiro-tenente era filho de italianos, nascido no Uruguai em 1872, quando aquele país ainda estava anexado ao Brasil como Província Cisplatina. Bacharel em Matemática formado pela Escola Militar, professor catedrático da Academia da Marinha e membro do Instituto Histórico. Eram seus auxiliares o Dr. Agostinho Vitor de Borja Castro e os 1°s tenentes João Soares Pinto, Amado Caetano Brito de Sousa Gayoso, Basilio Antônio de Siqueira Barbedo e Antônio Alves dos Santos Sousa.

Participava da Comissão Científica como chefe da Seção de Etnografia e Narrativa o poeta Antônio Gonçalves Dias, que acabara de regressar da Europa, onde estudara a mando do governo, o desenvolvimento da instrução pública. Era seu auxiliar o Dr. Francisco de Assis Azevedo Guimarães. Terminados os trabalhos da Comissão, o poeta foi para o Amazonas, onde permaneceu por um semestre em sucessivas investigações, de onde voltou com a saúde abalada.

Integravam finalmente a Comissão o pintor José Reis Carvalho, seis artífices e 1 trabalhador especialista em metais. 

Representação de um acampamento da Comissão Científica. 
Gravura de José Reis de Carvalho

Apesar da excelente qualificação dos componentes que constituíram essa Comissão Científica, nenhum outro grupo de pesquisas e estudos no Brasil foi tão combatido e desmoralizado tanto no parlamento quanto na imprensa quanto essa Comissão. Tudo era pretexto para críticas e censuras. Ganhou um apelido que logo pegou devido à coleta de insetos para o Museu: Comissão das Borboletas.

Um episódio pitoresco serviu para mostrar o ponto a que chegara essa campanha de descrédito. Por volta de 1856 construiu-se em Fortaleza, num terreno baldio existente na esquina da Rua Amélia – atual Senador Pompeu – com a de São Bernardo – atual Pedro Pereira, fronteiro à fachada lateral da Igreja de São Bernardo, um barco à vela, que foi empurrado sobre rolos até o mar pela Cidade da Criança, Rua Sena Madureira e Avenida Alberto Nepomuceno. Armado em iate, fez o comércio de cabotagem dos pequenos portos costeiros, até que a Comissão Científica o alugou para trazer de Camocim a Fortaleza, o material geológico, mineralógico, zoológico e etnográfico colhidos pelas equipes no interior da província.

Na travessia da foz do Acaraú para Fortaleza, o barco “Palpite” foi a pique, perdendo-se toda essa custosa coleta. Logo começou a se espalhar que o naufrágio fora proposital, a fim de que se perdesse a papelada da Comissão das Borboletas e jamais se pudessem apurar os deslizes de seus membros.

Segundo o pesquisador Renato Braga, o iate foi a pique ao amanhecer do dia 13 de março de 1861, na altura da Barrinha, ao sul da foz do Acaraú, quando navegava de Granja para a Capital, carregado de madeira. Afundou-o um aguaceiro pesado, acompanhado de forte ventania. Com ele se foram os volumes embarcados por Capanema.

um dos modos de deslocamento da população
Fortaleza vista do mar com o Forte em primeiro plano, as torres da Sé, coqueiros e um casario escasso. É a iconografia mais antiga da capital. 
Gravura de José Reis de Carvalho

Era período chuvoso, Capanema seguia para Fortaleza por terra, mas escolhera mandar seu material pelo mar. Um mês após o ocorrido, ele descreve sua chateação ao amigo Dias: “Creio que o mais espantoso caiporismo persegue a Comissão. Ontem, recebi a notícia que 13 ou 15 volumes que eu tinha mandado embarcar na Granja foram a pique, entre eles os meus baús com roupas, aí vinham mais: geologia de toda parte percorrida da província, observações astronômicas feitas desde o princípio até ali, observações meteorológicas e determinações de alturas, 420 páginas com aquela minha letra; tradução do livro de Liebig as ciências naturais aplicadas à agricultura (…). Perderam o seu valor as minhas coleções geológicas.”

Villa de Arronches e a Igreja de Bom Jesus dos Aflitos - gravura de José Reis de Carvalho

Além dos contratempos políticos e financeiros, a Expedição enfrentou acusações de comportamentos inadequados por parte de membros como Capanema e Gonçalves Dias, e a fracassada aclimatação de 14 camelos importados da Argélia. Por fim, a perda do material coletado diante do naufrágio, comprometeu dos resultados e acirraram as críticas ao empreendimento.

Para o escritor Gustavo Barroso, aqueles homens de ciências e letras, indicados pelo Instituto Histórico, nomeados pelo governo Imperial, não eram capazes de malversações dessa natureza, nem se eles tivessem de fato existido, haveria necessidade de se afundar uma embarcação para encobri-las, pois isso poderia ser feito por processos mais simplificados, pelo simples manejo da papelada. E que o que de fato se perdeu, foi o resultado de pesquisas e coletas interessantes, que produziram trabalhos escritos e publicados de real valor para o estudo do homem e da terra nordestina.

Com o naufrágio do “Palpite” afundou de vez a boa fama da Expedição Científica do Império e, além disso, não foi possível publicar o resultado integral das explorações realizadas.


Pesquisa:

À Margem da História do Ceará, de Gustavo Barroso
Comissão Científica de Exploração: uma experiência de transição no fazer científico brasileiro. Disponível em https://bibliotecadigital.butantan.gov.br/
Um mergulho nos livros https://diariodonordeste.verdesmares.com.br
imagens da Internet



Um comentário:

kallinnaito disse...

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