Na Fortaleza de hoje
temos os bairros do Meireles, Aldeota e alguns emergentes como Cocó, Guararapes
e Lourdes como os mais valorizados e consequentemente, os mais elegantes da
cidade, já que esse atributo – elegância – sempre esteve ligado, primordialmente,
ao poder aquisitivo dos moradores e ao alto padrão das edificações.
Mas no início do Século
XX, outros bairros detiveram esse status de “mais elegantes”, levando em conta
os mesmos parâmetros usados hoje.
Tudo começou quando o Centro da cidade, então
local de moradia das classes mais abastadas, se afirmava como núcleo comercial
e administrativo, e as elites elegeram novos espaços para construírem suas residências.
Essa dinâmica foi possível graças ao surgimento do automóvel como meio de
transporte daquele segmento da sociedade, que facilitou a mobilidade e possibilitou
o surgimento dos dois primeiros bairros elegantes de Fortaleza: O Jacarecanga e
o Benfica.
fotos Fortaleza em Fotos
O Jacarecanga localizado na zona Oeste da cidade, próximo à área central, nasceu nas proximidades do riacho do mesmo nome, onde se aglutinaram em sobrados, os representantes das elites comercial e agrária, tornando-se um local privilegiado, com mansões e chácaras com plantas e fachadas copiadas de revistas e publicações especializadas europeias. A partir do cruzamento com a Avenida Imperador, a Travessa Municipal formava um corredor diferenciado pelo seu conjunto de luxuosas residências. Era o início do bairro. A continuação da Travessa Municipal, depois Rua Guilherme Rocha é a atual Avenida Francisco Sá, antiga Avenida Demóstenes Rockert.
Uma das mais suntuosas residências do Jacarecanga, foi construída em
1924, planta copiada de um imóvel de Portugal, em estilo art-nouveau, para moradia
de Thomaz Pompeu Sobrinho. Tem 38 cômodos em quatro andares feitos com
materiais importados da Europa. Tem porão habitável, salão de festas, quartos e
salas com as dimensões de alguns apartamentos atuais. imagem Fortaleza em Fotos
Na Avenida Philomeno Gomes ainda resiste a residência da
família do advogado Raimundo Pinheiro de Melo. Construída em 1920, é cópia de
uma casa da Normandia, obtida de uma revista francesa. A casa continua
praticamente inalterada, exceto o alto muro de proteção que hoje ostenta. A outra casa visível, uma mansão de três andares,
era a moradia do empresário do ramo de transportes, Oscar Pedreira. Foto Arquivo Nirez
Na Rua Guilherme Rocha,1055, erguia-se um dos mais
importantes símbolos dos tempos de fausto do Jacarecanga: a Itapuca Villa.
Cercada por imenso jardim, com gradis artísticos, a vila foi erguida com dois
pavimentos, copiados das construções inglesas, na Índia. A edificação tinha um
vistoso trabalho em madeira: na parte superior existiam imensas varandas com
circulação livre. Na edição de O Povo, de 11/11/1989, era noticiada a demolição
do imóvel que se encontrava em ruínas. A Itapuca Villa pertencia ao comerciante
Alfredo da Rocha Salgado.
Imagem: óleo sobre tela do artista plástico Tarcísio
Garcia
na esquina da Praça Gustavo Barroso (Praça do Liceu)
com a Avenida Philomeno Gomes, ficava a casa da família do advogado e professor
Luiz Moraes Correia e Dona Esmerina. Depois que a família deixou o imóvel
funcionou no local uma repartição pública. Suas duas fachadas de ornamentos,
sacadas e escadas, com tantos elementos decorativos não foram respeitadas pelas
picaretas do progresso: a casa foi demolida para construção de um galpão. Foto Arquivo Nirez
Hoje, a maioria das residências construídas no período do apogeu, foi demolida, descaracterizada ou se encontra em precário estado de conservação. O Jacarecanga perdeu sua condição de área nobre a partir de meados do século passado, quando a sua avenida principal, a Avenida Francisco Sá, começou a ser ocupada por uma série de indústrias de transformação e com a instalação do ramal ferroviário e das oficinas da Rede Viação Cearense. Os novos equipamentos atraíram vizinhos de menor poder aquisitivo, que se alojaram em vilas operárias ou ocuparam irregularmente as terras situadas entre a principal avenida do bairro e a zona litorânea, dando origem ao que viria ser a maior favela de Fortaleza, o Pirambu.
Imóvel na Avenida Francisco Sá (imagem Fortaleza em Fotos)
Igreja dos Remédios foto Arquivo Nirez
Em 1878, com o Benfica ainda com uma ocupação insipiente, foi iniciada a construção da primeira igreja do lugar, a Igreja de Nossa Senhora dos Remédios. Mas quem verdadeiramente iniciou o processo de ocupação e desenvolvimento do Benfica foi o banqueiro e empresário José Gentil Alves de Carvalho, que em 1909, adquiriu de João Antônio Garcia, uma chácara localizada na Avenida Visconde de Cauípe (atual Avenida da Universidade), que remodelada em 1918, perdeu as feições rurais e virou palacete.
Casal José Gentil e Dona Melinha com seus 15 filhos em frente a casa antiga da chácara - 1909
e o Palacete de 1918, atualmente ocupado pela reitoria da UFC, proprietária do imóvel. Fotos Arquivo Nirez
Em torno da construção
principal, José Gentil loteou terrenos e construiu uma vila moderna e
aprazível, amplamente arborizada, com residências dotadas de esgoto e água
encanada, que recebeu o nome de Gentilândia. Boa parte das construções do Benfica
e da Gentilândia viriam a ser incorporadas ao patrimônio da Universidade
Federal do Ceará.
Antigo prédio do Colégio Santa Cecília, na Avenida da Universidade, que foi adquirido e demolido pela UFC - acervo do MAUC
Na década de 1950, quando
as famílias mais ricas estavam de mudança para a zona leste da cidade, e os
imóveis estavam sendo colocados à venda, o palacete da família Gentil foi
adquirido pela Universidade Federal do Ceará, que havia sido criada em dezembro
de 1954, e estava se instalando em Fortaleza. Depois da aquisição do casarão
dos Gentis, a Universidade comprou vários outros imóveis ao longo da principal
avenida.
Rua N. S. dos Remédios - imagem Fortaleza em Fotos
A chegada da Universidade
ao Benfica em 1956, repercutiu sobre o espaço físico natural e construído do
bairro. Muitos imóveis de belíssimas arquiteturas que poderiam ter sido
preservados, não o foram, e muitas árvores foram abatidas, inclusive para construção da Concha Acústica, inaugurada em
1959.
Fontes:
Lira Neto. História
Urbana e Imobiliária de Fortaleza: uma biografia sintética/Lira Neto, Cláudia
Albuquerque – 1ª ed. – São Paulo: Editora Braba, 2014.
Revista Universidade
Pública ano 8 n° 45 – Set/Out 2008.
7 comentários:
O trabalho desse blog é maravilhoso, parabéns!!
Linda história do bairro em que nasci.
parabéns,bela matéria.
nasci nesse bairro benfica. parabéns pela reportagem. Me deu saudade.
Uma tristeza passear pelo Jacarecanga, bairro que moro e vê-lo tão maltratado ....
Muito legal e interessante saber sobre a Fortaleza antiga. Parabéns!
Adoro as postagens do BLOG..fascinada por conhecer mais sobre a história de minha cidade.Confesso que fiquei assustada com a quantidade de filhos de José Gentil,sei que era normal para a época,mas.... É mta gente para dar de comer kkkkkkkkk
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