quinta-feira, 1 de junho de 2017

Histórias de Cinema


 
Desde a evolução do cinema como sétima arte até o apagar das luzes da década de 1940, o maior exibidor cinematográfico do país era o cearense Luiz Severiano Ribeiro, dono de uma poderosa cadeia de salas exibidoras espalhadas por todo o país, principalmente no Rio de Janeiro, então Capital Federal.

Em Fortaleza, à exceção de duas ou três salas pertencentes a irmandades religiosas, todos os cinemas eram monopólio da Empresa Ribeiro, que contava com mais de duas dezenas de cinemas em nossa capital; a Severiano Ribeiro reinava absoluta, sem concorrência que a incomodasse.
Pouco a pouco os seus concorrentes, inclusive os cinemas de bairros conhecidos como “poeiras” foram sendo eliminados pelo poder de expansão do grupo. A empresa de Clóvis Janja mantinha os cinemas Rex - que fechou e foi reaberto anos mais tarde pela Empresa Severiano Ribeiro - o Odeon, na Praça de Otávio Bonfim  e o Santos Dumont. O Cine Diogo que era considerado o mais luxuoso da cidade,  também foi adquirido pelo grupo Severiano Ribeiro. Antes, do Diogo, o Majestic fora a atração dos que buscavam diversão. Tornara-se conhecido como cinema popular e por isso, proporcionava boa renda. Era bastante quente, principalmente durante o dia, pois não dispunha de ventiladores. 

Cine Diogo na Rua Barão do Rio Branco

O Moderno, também pertencente ao grupo, inaugurado 4 anos depois do Majestic, também era bastante frequentado e dispunha de ventiladores, mas  em pequeno número. O Diogo na sua fase inicial dispunha de boa ventilação, mas posteriormente, só se fazia sentir no trecho próximo a tela, local que passou a ser disputado pelos espectadores.

Fora do centro, havia ainda alguns poucos cinemas que atendiam os bairros, como o Cine Familiar, no Otávio Bonfim, o Benfica, na Avenida Visconde de Cauipe e o América, com fundo correspondente ao Colégio Juvenal de Carvalho, no Jardim América.

A esperança de modernização dos cinemas de Fortaleza se concentrara na inauguração do Cine São Luiz, cujo edifício fora iniciado desde o final da década de 1930. A demora no andamento da obra repercutia nas discussões da Câmara Municipal, de onde partiam requerimentos solicitando aceleração das obras. A polêmica acerca da lentidão em se concluir o cinema ampliava-se através dos jornais. O prédio inacabado era tido como “o aleijão que enfeia a Praça do Ferreira”. A critica lembrava o contraste entre a exigência de concessão de licenças para que as residências fossem pintadas, enquanto o amontoado de material de construção permaneceu cercado, durante anos, no centro da cidade.

Cine Cristo-Rei na Avenida Santos Dumont 

No interior dos cinemas, a molecagem da plateia constituía-se motivo de preocupação frequente da Polícia, que chegou a organizar uma campanha de vigilância: “já se pode assistir a uma fita sem ouvir as piadas de mau-gosto, os gritos e assobios. Ontem, onze pessoas foram presas acusadas de promover anarquia”. A ação repressora da polícia também recebia apoio da Câmara Municipal, que se preocupava com a falta de decoro de ocorria nos cinemas da cidade, “onde atuam pessoas mal-educadas e moleques”. O vereador Manoel Lourenço solicitara ao secretário de Polícia para intensificar o policiamento dos chamados cinemas elegantes, a fim de por termo a molecagem que se observava principalmente aos domingos.  

O depoimento de frequentadores assíduos dos cinemas, revelava os problemas enfrentados por eles, alguns bastante curiosos, que ultrapassavam as costumeiras reclamações contra o calor ou condições inadequadas. Em 1951, um dos impasses enfrentados prendia-se ao final das projeções. A pressa da plateia inquieta, em retirar-se do cinema ao final da exibição: “ os mais apressados se levantavam, levando outros espectadores a fazerem o mesmo. Por isso, muitos fãs de Ingrid Bergman não puderam ver os momentos finais do filme “Sob o Signo de Capricórnio”. 

Rua Barão do Rio Branco com o edifício Digo em 1939

Em fevereiro de 1950, os alicerces da possante indústria foram abalados com a inauguração do Cine Jangada, que veio quebrar o monopólio do grupo já consolidado. Idealizado pelo  empresário Amadeu Barros Leal, o Cine Jangada era na verdade a primeira de treze salas de exibição  que deveriam ser implantadas em Fortaleza pela Empresa Cinematográfica do Ceará (CINEMAR).

Funcionando numa sala adaptada, estreita e comprida, o Cine Jangada não tinha decoração requintada nem os luxos dos concorrentes. A única originalidade ficava por conta da sala de espera, que ficava localizada nos fundos. Na verdade, nem era uma sala, era um terraço-jardim com bancos e palmeiras. Ali também ficavam os sanitários.

Sem hall para as bilheterias, estas foram montadas logo à frente, quase na rua, e os espectadores, tão logo entravam no cinema, já estavam dentro da sala de projeção, e de frente para o público. A tela, portanto, servia de fundo para as bilheterias e para o painel de cartazes. Era exigido aos homens, o uso de paletó e gravata, a exemplo do que já fazia o sofisticado Cine Diogo.

edificio São Luiz, em construção na Praça do Ferreira

Em 1957 o prédio do São Luiz ainda em construção era visita obrigatória de muitas pessoas que frequentavam o Centro. Em fase de acabamento, o prédio atraía curiosos que comentavam admirados sobre os detalhes da construção: a sala de projeção com pintura em alto relevo, tapetes, lustres, paredes e pias de mármore. O São Luiz foi finalmente inaugurado com grande solenidade e a presença muitos convidados, no dia 26 de março de 1958.

fontes:
Fortaleza: cultura e lazer (1945-1960) de Gisafran Nazareno Mota Jucá
Os Dourados Anos, de Marciano Lopes 
fotos do arquivo Nirez