A inauguração do Teatro José de Alencar, em 17 de
junho de 1910, foi marcada por uma programação composta de apresentações musicais
e inúmeros discursos oficiais, numa festa que se estendeu por três dias
seguidos. Constituiu-se, sobretudo, em ato de louvor ao presidente Antônio
Pinto Nogueira Accioly, que havia chegado recentemente do sul do País.
Além dos elogios de praxe, o orador oficial pregou contra
a permissividade e os vícios que os atores, artistas em geral e as artes
espalham na sociedade. Em artigo posterior, publicado no "O Povo", JC Alencar Araripe, assim descreve as festividades: “ tudo fora feito de maneira a
emprestar a maior importância possível à recepção do prestigioso chefe
político. Formaram o Batalhão de Segurança e os alunos do Liceu, realizaram-se
espetáculos de gala em todos os cinemas, os cafés foram ornamentados, bandas de
música alegravam a cidade com retretas, fogos de artificio subiram ao ar em
várias oportunidades, e o Palacete Guarany regurgitou com um banquete de 200
talheres. A cerimônia inaugural contou com o alto mundo oficial e o escol da
sociedade. O teatro, feericamente iluminado, oferecia um espetáculo soberbo.”
O programa de inauguração foi aberto por um concerto
da banda sinfônica do Quartel do Batalhão de Segurança, ao término do qual o
Dr. Nogueira Accioly sentou-se a uma grande mesa, colocada no centro do palco,
rodeado de seu secretariado e de algumas outras figuras da elite local. Com três
golpes de martelinho na mesa, Accioly declarou inaugurado solenemente o teatro.
Como orador oficial, discursou o Dr.
Júlio César da Fonseca, com algum exagero verbal: “ afinal temos um teatro,
depois de tantos projetos vãmente elaborados, de tantas iniciativas perdidas e
tantos tentames malogrados. Está satisfeita a necessidade que cotidianamente
acentuava num relevo imperiosamente clamante.” Em seguida foi executado o Hino
Nacional.
O primeiro diretor do Teatro José de Alencar foi
Faustino de Albuquerque, (que mais tarde seria governador do Estado). Mas
somente ao final do terceiro mês de sua gestão, o teatro receberia seu batismo
de grande público, com a temporada da companhia carioca de Lucília Perez,
iniciada em 23 de setembro.
Aspecto da Rua Barão do Rio Branco - antiga Rua Formosa - à época da inauguração do Theatro José de Alencar
O início de funcionamento do majestoso teatro foi de
altos e baixos. Várias companhias de teatro se apresentaram no local, a
maioria, com grande público na estreia, e bilheteria escassa na sequência, a
exemplo da temporada inaugural, que foi bem sucedida na estreia, mas já com esvaziamento de público nas apresentações seguintes.
Em Janeiro de 1911, “A Pérola”, comédia drama de
Marcelino Mesquita, consagrado autor português, apresentada pela Companhia
Francisco Santos, fez temporada no teatro. Após as primeiras apresentações, o jornal “A República”, publicou a seguinte nota: “E no entanto, as
bellezas de muitas scenas d’A Pérola resistiram ao ambiente de indiferença e de
frieza e a correção, o calor, a vida da representação, pozeram-se em destaque
na quase solidão, que reinava no recinto do teatro”.
Outra peça apresentada, “A Tosca” de Victorien
Sardou, drama de grande sucesso – segundo os jornais – trazia Maria Castro como
protagonista. Com esta apresentação, a famosa atriz homenagearia seus
conterrâneos mais ilustres, entre eles, Papi Junior e Hermínio Barroso. E
novamente, reclama o jornal: “É
injustificável essa indiferença para com uma companhia digna de nosso
franco acolhimento pelo conjunto mais ou menos harmônico do seu elenco, em que
se notam artistas de real merecimento e pelo primor das peças de seu variado
repertório. Camarotes inteiramente vazios, frisas em sua quase totalidade
abandonados, occupadas algumas dezenas de cadeiras da primeira ordem e poucas
da segunda – tal era o aspecto do Theatro José de Alencar, em a noite hontem”.
Sucedem-se temporadas de peças apresentadas, com larga
vantagem, por companhias de fora do Estado, algumas das quais de operetas, como
a da atriz espanhola Dolores Rentini. O público, porém, continuava retraído, e
as peças começaram a rarear. O insucesso era tanto, que o teatro foi forçado a
fechar as portas.
Maestro Henrique Jorge com a mulher e a filha no Passeio Público. Foi um dos regentes da orquestra do Batalhão de Segurança no concerto de inauguração do teatro, e mais tarde, um dos seus diretores
Em 1915, o maestro Henrique Jorge, então diretor do
teatro, queixava-se: “a receita tem sido quase nulla, o que se explica pelo
facto de ser o theatro pouco procurado para o fim a que se destina, isto, em
grande parte devido aos inconvenientes acima apontados.” Os tais inconvenientes
resumiam-se praticamente a um: o extremo calor que fazia no interior do teatro,
devido à iluminação carbônica local, sem abertura que permitisse a circulação
de ar. Além disso, o primeiro regulamento do TJA, declaradamente
repressivo, aconselhava terno e gravata
para os homens, bem como traje de gala para as mulheres. O mesmo regulamento
impunha a presença de três inspetores, que em comissão, censuravam textos e
proibiam gestos indecorosos, além de qualquer expressão de desrespeito à moral
vigente, a seus juízos.
Nesse período, os frequentadores do teatro se
distribuíam desigualmente na plateia. Enquanto a elite, com seus trajes
vistosos, ocupavam os camarotes, estudantes e pequenos empregados do comércio
apinhavam-se nas gerais, depois chamadas torrinhas, onde as moças não deviam
frequentar. Para todos havia regras rigorosas de comportamento, que incluíam
desde a proibição do uso de chapéus (para não atrapalhar a visão dos demais),
passando por horários precisos para o início e o término dos espetáculos, e até
multas e prisões para os atores que se recusassem a representar.
Ainda em 1915, em razão da quase ausência de
programação, o teatro passou dois anos de portas fechadas, tendo como principal
motivo, a questão do desconforto causado pelo calor excessivo gerado pelos combustores de gás carbureto usados na iluminação.
Daí o teatro passou pela sua primeira reforma, acontecida em 1918, durante o
governo de João Thomé de Saboia, que mandou instalar iluminação elétrica,
substituiu o asfalto do pátio interno por ladrilhos, abriu portas laterais na
plateia e consertou o telhado.
Enquanto isso, Carlos Câmara enchia, nos fins de
semana, o seu teatro improvisado do Grêmio Dramático Familiar, no bairro
Joaquim Távora.
Fonte:
Theatro José de Alencar – O Teatro e a Cidade
Coordenação Editorial – Patrícia Veloso
fotos do arquivo Nirez e do livro O Teatro e a Cidade
fotos do arquivo Nirez e do livro O Teatro e a Cidade
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