quarta-feira, 25 de maio de 2016

A Cidade e o Progresso ( O Crescimento de Fortaleza no Século XIX)

Ao longo do século XIX teve início o processo de hegemonização de Fortaleza, vindo a se tornar ainda na segunda metade deste, o principal núcleo urbano, político, econômico e social do Ceará. Os motivos que levaram a esse processo foram muitos e estão interligados. Em primeiro lugar, não deve ser desvinculado do sistema político do império, que criou mecanismos favoráveis à hegemonia de Fortaleza, ao beneficiar as capitais provinciais.

Durante o período monárquico, sobretudo no II Reinado (1840-1889), houve por parte da monarquia a postura intencional de tornar as capitais das províncias verdadeiros núcleos a serviço da ordem social, e da unidade territorial desejadas contra qualquer pretensão autonomista/separatista, que as oligarquias regionais possuíssem. 

 A família imperial no II Reinado, por volta de 1870. Da esquerda para a direita: conde D'Eu, D. Pedro II, D. Teresa Cristina e D. Isabel.

O império tomou medidas diversas para estimular e reforçar o papel das capitais provinciais como grandes centros locais de poder político, econômico, militar e administrativo. Por isso foram as capitais os núcleos urbanos que mais receberam investimentos e obras, mais recolhiam a produção interiorana para exportação, mais captavam recursos para o governo. E quanto mais as capitais prosperavam, mais investimentos e poderes elas obtinham, verificando-se mais prosperidade e hegemonização urbana, enquanto as outras vilas e cidades das províncias eram esvaziadas.

antes da construção da Ponte Metálica - o primeiro porto de Fortaleza, a cidade contou com inúmeros trapiches. Esse ficava na Prainha

Daí se entende porque na segunda metade do século XIX, uma série de obras e atos administrativos beneficiaram Fortaleza em detrimento das outras localidades, como as obras no Porto – no exato momento em que sua a “rival” e decadente Aracati reclamava da erosão de seu porto e da inadequação deste para navios de maior calado; abertura e melhoria de estradas ligando a capital a áreas produtoras próximas – enquanto nenhum recurso era despendido com o melhoramento da estrada Aracati-Icó, a mais importante para o comércio da região.

estação central da Estrada de Ferro Baturité
 Estação de Canafístula, inaugurada em 1880, ao pé da Serra do Vento, entre Fortaleza e Baturité. Na década de 1940 o lugar passou a se chamar Antônio Diogo. 

Uma outra obra que mostrava a hegemonização de Fortaleza, foi a construção da Estrada de Ferro Baturité, a partir de 1870. Esta incrementou a posição da capital como grande centro coletor e exportador da produção interiorana – sobretudo do algodão. A posterior expansão da ferrovia – em 1926 atingira o Crato – aumentou consideravelmente a função comercial de Fortaleza. O raio da ação da capital ampliou-se para além das zonas produtoras de Uruburetama e Baturité, atingindo o Oeste e o Sul do Ceará, isto é, acompanhou a própria expansão da cotonicultura, a base da economia cearense de então.

Outra razão para o crescimento de Fortaleza está relacionada ao comércio de exportação da produção agrícola cearense, que conheceu grande expansão na segunda metade do século XIX, com os produtos algodão, café, couro e açúcar. Como se não bastasse essa estrutura de transportes (estradas, porto, ferrovia), foi ainda a capital beneficiada por sua proximidade geográfica em relação as áreas produtoras agrícolas, principalmente Maranguape e Baturité com o café, Itapipoca, Caucaia e Cascavel com o algodão.

A cidade cresceu em termos populacionais igualmente em função do êxodo rural, sobretudo dos camponeses obrigados a migrar pela estrutura latifundiária sertaneja ou pelas secas – onde buscavam em Fortaleza por melhores condições de vida. 

A partir de 1850, Fortaleza passou por profundas mudanças em sua infraestrutura e equipamentos urbanos, visando atender as novas demandas, disciplinando espaços e controlando a população. Viveu uma explosão de modernidade e aformoseamento, quando os discursos e as práticas buscavam imitar a civilidade europeia. A cidade então colocou-se entre as maiores do País.

Assim, teve calçamento nas ruas centrais (1883), canalização de água potável (em 1867, ao encargo da inglesa Ceará Water Company Limited), bondes à tração animal (1880) (inaugurados pela Cia Ferro Carril e depois transferidos para a Ceará Light and Power), iluminação a gás carbônico (1867), linhas de navios a vapor para a Europa e Rio de Janeiro (a partir de 1866), melhorias no porto (o chamado Porto das Dragas)  (entre 1870 e 1886), Biblioteca (1867), jornais, praças arborizadas, clubes para lazer, fábrica de tecidos (1883), hospital (Santa Casa de Misericórdia, em 1861), asilo para alienados (1886), Mercado Público com estrutura metálica (1897), estrada de ferro ligando a capital a cidades do interior, telégrafo (1879), telefone (1883), caixas-postais (1889), boas escolas (O Liceu do Ceará desde 1845, o Seminário da Prainha e o Colégio da Imaculada Conceição em 1864), entidades intelectuais e cemitérios.  
   
 sistema de distribuição de água em lombo de animais

Apesar da precariedade dos recenseamentos, em 1837 Fortaleza contabilizava 16.557 habitantes; em 1872, contava 21.372 moradores atingindo na virada para o século XX, 48.369 pessoas, num crescimento considerável e sinal claro da hegemonia urbana de Fortaleza.  

 antiga Rua de Baixo

Por volta de 1867, a capital limitava-se ao norte pelas ruas da Praia e da Misericórdia; a Leste, pela Rua de Baixo (atual Conde D’Eu); ao sul, pela D. Pedro I e a Oeste pela Rua d’Amélia, atual Senador Pompeu. Fora desse perímetro, só havia o Palácio do Bispo, o Colégio das Irmãs de Caridade, o Seminário da Prainha, e uma ou outra casa.                


fonte:
Fortaleza, uma breve história
de Artur Bruno e Airton de Farias
fotos do arquivo Nirez
 

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