sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

A Ferro Carril e os Bondes de Burro

Rua Floriano Peixoto, em 1909, com o prédio da Intendência Municipal e os trilhos do bonde.
 
A partir de 1870, diversas tentativas de dotar Fortaleza de um serviço de transporte coletivo resultaram infrutíferas. O governo concede privilégios a grupos de investidores, mas as ações fracassam, frustrando a população estimada em 20.000 habitantes.
A Empresa Ferro Carril do Ceará foi fundada no dia 3 de fevereiro de 1877, pelo comendador Francisco Coelho da Fonseca e Alfredo Henrique Garcia. Entre a instalação da empresa e o início das operações, três anos se passaram, isto porque somente em 1879 são concretizadas as obras civis de construção da estação e sede da companhia, e a partir de novembro, foi cumprida a etapa de assentamento dos trilhos.
Na manhã de domingo do dia 25 de abril de 1880, a Ferro-Carril do Ceará inaugura sua primeira linha, com 4.210 metros, da Estação na Estrada de Messejana (Boulevard Visconde do Rio Branco) até a rua São Bernardo (atual Rua Pedro Pereira) e a partir desta, interligando a Praça da Assembleia ao Matadouro Modelo, bairro do Prado.

A programação festiva, com banda de música e presença de autoridades, tem início às 7 horas, em frente ao Mercado Público, com quatro bondes embandeirados que fazem o longo percurso até o Matadouro, com retorno à denominada Estação de Depósito. 
Os veículos tinham 4 ou 5 bancos, eram pequenos, modestos, providos de cortinas que protegiam do sol e da chuva, e dirigidos por um boleeiro quase sempre vestido de fraque. Mesmo assim serviram a muitos usuários que pagavam passagens de 100 réis, que mereceram bondes melhores, ampliados em sua capacidade até para sete bancos, comportando 28 passageiros.
Em 1888 mais 1.518 metros de linhas são incorporados ao serviço local de transporte coletivo, com os bondes trafegando entre a Praça de Pelotas (atual Clóvis Beviláqua) e o Benfica.
Enquanto isso, na política de expansão dos transportes de tração animal, o governo formalizaria ainda duas novas concessões para empresas que efetivamente se instalaram em Fortaleza. A Companhia Ferro-Carril de Porangaba, fundada a 10 de outubro de 1894, de propriedade de Gondim e Filhos, dirigida pelo Coronel Arlindo Gondim, estabeleceu sua estação e sede em Porangaba, explorando uma linha que passava pelo bairro Damas e finalizava no Benfica.
No dia 12 de outubro de 1896, era inaugurada a Ferro-Carril do Outeiro, de propriedade de membros da família Accioly, que atendia o bairro do Outeiro (atual Aldeota). A empresa tinha realizado durante cinco meses o assentamento dos trilhos e construído instalações de apoio, como sua estação, localizada na Rua Guajiru (atual Gonçalves Ledo). A linha percorria um pequeno trecho entre a Praça do Ferreira até as proximidades do atual Colégio Militar de Fortaleza.

 No início do novo século o governo do Ceará facilita a transferência da concessão original da Ferro-Carril do Ceará que é vendida para a firma J. Pontes e Cia, que em seguida é vendida para o capitalista Tomé Augusto da Mota. Com o objetivo de atrair investidores externos para a modernização do serviço, o empresário inicia os contatos para consulta ao City Improvements Co. Ltd., de Londres. Três anos depois havia um acordo para implantação de bondes elétricos (tramways), com participação de firmas inglesas, o que determina uma alteração contratual, ampliando a concessão para mais 35 anos. A lei fixa o objetivo de haver a substituição dos bondes de tração animal por tração elétrica e estabelece prazo máximo de um ano para o início das obras, e de até três anos para o término de implantação do novo sistema de transporte coletivo.
Em janeiro de 1911, a viabilidade de instalação de bondes de tração elétrica é estudada pelo engenheiro Ker Box, em visita a Fortaleza, tendo parecer favorável.
Na renegociação do contrato com a empresa Ferro-Carril, assinado em 12 de maio de 1911, ficou estabelecido que, além da instalação de tramways elétricos, ficava assegurado o direito de fornecer, dentro dos limites do município, luz e energia elétrica, a residências e edifícios comerciais, respeitando as condições do contrato anteriormente assinado com a Ceará Gaz Company relativo ao serviço de iluminação pública.

Posto central da Ferro-Carril na Praça do Ferreira, logo após sua transferência para a Ceará Tramway, ostentando placa com o nome das duas empresas. (1912)  
 
A última formalidade para determinar o fim de existência da Empresa Ferro-Carril do Ceará foi a transferência em cartório para a empresa estabelecida em Londres, The Ceará Tramway Light and Power Company Ltd. O ato formal de extinção da empresa cearense , bem como da Ferro-Carril do Outeiro, correu no dia 24 de janeiro de 1912, em solenidade pública, quando foi assinada pelo Coronel Tomé A. da Mota a escritura de venda, no valor de 178 mil libras esterlinas.
Anunciava-se em definitivo o ingresso da energia elétrica na vida da cidade, trazendo uma revolução para os serviços de bonde a partir do ano seguinte. Mesmo assim, por mais uma década, sobreviveria a Companhia Ferro-Carril de Porangaba que, impotente para modernizar-se, continuaria trafegando seus bondes de burros em sua área de concessão.


Extraído do livro de Ary Bezerra Leite 
História da Energia no Ceará 
fotos do arquivo Nirez e do livro História da Energia no Ceará

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