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Um dos crimes que mais agitaram a opinião pública
não só da capital como também de outras cidades do interior, ocorreu surpreendentemente
em águas costeiras do Ceará, envolvendo passageiros, cujo destino seria o Rio
de Janeiro. 
 brigue-escuna O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
embarcação semelhante ao Laura II
 
No dia 12 de junho de 1839,
no lugar denominado Arapaçu, distante três léguas de Aquiraz, ancorou o
brigue-escuna Laura II, que há alguns dias atrás zarpara do Maranhão. O ancoramento
foi proposital, não que estivesse nos planos de viagem, nem o local fosse propício,
porém, por circunstâncias adversas, envolvendo comando e tripulação.
Insatisfeitos com o tratamento recebido, nove tripulantes, todos escravos,
insurgiram-se contra o seu comandante, Capitão Francisco Pereira da Silva e o
assassinaram, além de um passageiro de nome Francisco Frates, que se destinava
ao Rio de Janeiro. 

Cascavel+-+Rua+principal+de+Cascavel.+1924 O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
Cascavel em 1924

 Depois de cometido o delito, abandonaram o navio na costa e
tomaram o rumo de Cascavel. Na Vila de Cascavel, onde os fugitivos fizeram
abordagens, um dos que não haviam participado da chacina denunciou os demais, e
os nove envolvidos foram presos. Com eles foram encontrados um conto,
oitocentos e tantos mil réis e algumas joias, valores que deveriam estar sob a
guarda do comando. Em diligência procedida pelo Juiz de Aquiraz, ainda
foram salvos alguns sacos de arroz, barris de manteiga e outras mercadorias de
menor valor e algumas moedas de cobre. Informado do ocorrido, ordenou o chefe
do governo, Dr. João Antônio de Miranda, o deslocamento de 23 praças para a
região, no sentido de fazer o que fosse possível, não havendo notícias do
resultado dessa operação.

brigue+escuna+laura+II O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
 Figura de proa da Escuna Laura II, recuperada em
Aquiraz. Hoje é parte do acervo do Museu do Ceará. 

Processados pelo juiz de Aquiraz e pronunciados como
incursos no art. 192, do Código Criminal, os presos foram remetidos para a
capital, onde teriam condições mais seguras para aguardar o julgamento. 

O júri reuniu-se no dia 18 de julho de 1839, presidido
pelo juiz municipal  Dr. Clemente
Francisco da Silva, com  Ângelo José da
Expectação de Mendonça na promotoria e como assistente de defesa o padre José
Ferreira Lima Sucupira; como Presidente do Conselho, Manuel José de Albuquerque. 

cadeia+de+aquiraz1 O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
 cadeia+de+aquiraz O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
 Casa de Câmara e Cadeia de Aquiraz, atualmente Museu São José de Ribamar


Interrogados os réus confessaram friamente o crime, protestando apenas contra
maus tratos a bordo e deficiência de alimentação. Proclamada a sentença,
seguiram-se os resultados: os réus João Mina, Hilário, Benedito, Antônio, Constantino
e Bento foram condenados à pena máxima, ou seja, morte natural na forca. 
O escravo
Luiz, natural de Cabo Verde, foi condenado ao grau médio ou galés perpétuas,
segregado em Fernando de Noronha. Luiz, natural de Aracati, condenado ao grau
mínimo. Dada à sua condição de escravo, deveria ter sua pena comutado em 450 açoites,
e depois entregue ao seu proprietário, que além de assinar termo de
responsabilidade, seria obrigado a conservá-lo durante seis anos com uma argola
no pescoço. Condenado também o armador ou preposto seu e liquidação do navio
como forma de ressarcimento das despesas existentes. Foi absolvido o réu José
Mina,  considerado inocente.

A data das execuções foi marcada para o dia 19 de
outubro de 1839, mas acabou sendo adiada para o dia 22 do mesmo mês por motivos
burocráticos. No dito dia 22, às 7 da manhã os prisioneiros deixaram o quartel  (onde hoje está a 10ª Região Militar) e
seguiram o mesmo itinerário por onde em 1825 haviam passado os “Mártires da
Confederação do Equador”, em direção ao Campo da Pólvora, local das  execuções. O porteiro dos auditórios, Agostinho José da Silva,
abria caminho por entre a multidão. Na vanguarda marchavam a cavalo o juiz, um
médico e o escrivão. Por fim desfilavam os seis condenados, trajando ceroulas e
camisas amarelas. Algemados, os braços em volta do pescoço, tinham ao lado os
confessores dos seus instantes finais.

Fortaleza+-+Passeio+P%C3%BAblico+-+1907 O Julgamento dos Escravos da Escuna Laura II
 Passeio Público, antigo Campo da Pólvora onde ocorriam as execuções de réus condenados à pena capital

João Mina, acusado de ter sido o principal assassino
do capitão, teve a primazia do infortúnio, porém antes chorava copiosamente e
aterrorizado, implorava piedade e perdão. Hilário, o segundo a ser conduzido ao
patíbulo, possuía têmpera de aço e se contradizia diante do terror que o
cercava. Comia pão-de-ló e bebia vinho juntamente com os outros dois e ainda
desdenhava do companheiro, dizendo: “morre homem, mas não dá gosto a teus
inimigos”. No momento de entregar o pescoço ao laço, lutou tenazmente, desde a
subida à forca até o momento de ser lançado ao espaço. 
O próximo foi o cabra
Benedito, que deveria ter sido vendido no Recife e fora o assassino do
negociante Feliciano Frates. O quarto condenado era angolano e se chamava
Antônio, acusado de haver assassinado um marujo seu companheiro. Constantino o
quinto e o primeiro da tragédia do Laura II, comportara-se durante o tempo de
prisão como verdadeiro cristão, segundo seus confessores. Era baiano, tinha 34
anos de idade e pensava-se que seria indultado, visto como antes esse boato se
espalhara. Bento foi o último na ordem das execuções  o primeiro em crueldade quando por ocasião do
crime. Além de atrair o capitão, assassinou um marujo de nome Maia e outro de
nome  Antônio, todos igualmente escravos
e companheiros de viagem.  
extraído do livro 
Pena de Morte, de R. Batista Aragão  
     

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