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casa+listrada+de+branco Modernização e Adversidade Climática
Casa residencial na Avenida Visconde de Cauípe

Os anseios por modernização em Fortaleza começaram a se
materializar ainda no final do século XIX. 
A partir das décadas de 60 e 70 o perfil da cidade começa a sofrer
alterações. Na década de 60 surgem o Lazareto da lagoa Funda e a Santa Casa de
Misericórdia, para zelarem pela saúde pública, pois como ressaltava o saber
médico social da época, sem homens sadios para o trabalho, não haveria produção
de riquezas nem progresso.


santa+casa+de+misericordia Modernização e Adversidade Climática
  A Santa Casa foi inaugurada a princípio com 80 leitos e tinha como
mantenedora a Irmandade Beneficente da Santa Casa da Misericórdia de
Fortaleza. O Dr. Joaquim Antônio Ribeiro foi o primeiro médico nomeado
para trabalhar na Santa Casa, em 12 março de 1861.

 
Na década
seguinte, em 1870, a remodelação prosseguia com a instalação da ferrovia para
Baturité, a construção de um novo cemitério, a criação da Academia Francesa, a
iluminação a gás e o plano urbanístico de Adolfo Herbster.
A inauguração da Estrada de Ferro Baturité, em 1873,
agilizando o transporte do algodão e de pessoas para a cidade, consolidou a
hegemonia econômica de Fortaleza. Estreitando a distância e a dependência do
interior com a capital, o trem, um dos principais produtos do avanço
tecnológico do século XIX, reforçou mais ainda os resultados positivos dos efeitos
sociais do progresso.

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A Estação Central da Estrada de Ferro de Baturité foi inaugurada no dia
30 de novembro de 1873 e no dia 9 de junho de 1880, ela seria reinaugurada depois de passar por alterações definitivas
A edificação de um novo cemitério – o São João Batista, em
1872 – em local mais afastado (Jacarecanga), justificou-se pela pressão médica
de suprimir a necrópole anterior, o São Casimiro, que comprometia o estado
sanitário urbano por achar-se muito próximo (na Praça da Estação) do perímetro
central, além de ter sepultado vítimas da epidemia de cólera, ocorrida entre
1862 e 1864. Pouco depois seria a vez de alcoólatras, loucos e meretrizes,
acusados de potencialmente perigosos á saúde e à segurança pública, serem
também confinados fora da região central.

  

capela+de+s%C3%A3o+jo%C3%A3o+batista Modernização e Adversidade Climática
 Capela do cemitério São João Batista ainda em construção
O novo cemitério logo seria povoado com exuberantes sepulturas em estilo
gótico e refinadas esculturas importadas de anjos e figuras melancólicas. Nesse
sentido o São João Batista revela tanto a imponência da arte cemiterial da
época, como o poderio dos setores dominantes.  Também na cidade dos vivos, essa consagração
econômica evidenciava-se através do surgimento de suntuosos sobrados e
palacetes. Ostentando estilos em voga na Europa, estas novas construções
tomavam o lugar do casario modesto, desenhando um novo rosto para a cidade. 
A iluminação a gás carbônico, por sua vez, substituindo a de
azeite de peixe, deu mais vida e sociabilidade às noites fortalezenses, fazendo
com que a população fosse dormir mais tarde. Por motivos de economia, por algum
tempo estabeleceu-se o costume de não acender os lampiões em noite de lua
cheia.

av+alberto+nepomuceno+do+in%C3%ADcio+pra+o+fim Modernização e Adversidade Climática
 Avenida Alberto Nepomuceno

A cidade se expandia visivelmente. Para disciplinar seu
crescimento espacial foi contratado pelo governo cearense o engenheiro Adolfo
Herbster, que em 1875 elaborou a “Planta Topográfica de Fortaleza e Subúrbios”.
Atualizando o sistema de traçado urbano na forma de xadrez esboçado por Silva
Paulet em 1818, o plano urbanístico de Herbster estendia o alinhamento das ruas
até os subúrbios, corrigindo becos e vias sinuosas; esse traçado retilíneo
agilizava o fluxo de pedestres, veículos e mercadorias. Ao deixar a capital
mais aberta e transparente, o plano dificultava possíveis ocorrências de
revoltas e distúrbios, facilitando o controle dos poderes públicos sobre a
cidade.

av+dom+manuel Modernização e Adversidade Climática
 Avenida Dom Manuel, antigo boulevard da Conceição

O plano de Herbster incluiu ainda a abertura de três
avenidas (as atuais avenidas do Imperador, Duque de Caxias e Dom Manuel),
circundando o perímetro central;  o
engenheiro projetou ainda um conjunto de obras públicas, entre as quais o
edifício que iria sediar a  Assembleia
Provincial, em 1871, em estilo neoclássico. 

assembleialegislativa Modernização e Adversidade Climática
 edifício da Assembleia Provincial, onde funciona atualmente o Museu do Ceará
A devastadora seca de 1877-1879
interrompeu temporariamente esse fluxo modernizador que se instaurava na
cidade. Além de desestabilizar a economia cearense e provocar intenso êxodo
rural  para a capital, a longa estiagem
possibilitou a propagação de uma fulminante epidemia de varíola, vitimando mais
da metade dos 100 mil retirantes amontoados em abarracamentos providenciados
pelo governo na periferia de Fortaleza. 

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 retirantes da seca de 1877 (foto do google)
Ao longo desses três anos, com a
capital assistindo ao féretro diário de centenas de mortos, a cidade tomou-se
de pavor e pesar, não existindo clima para que grandes obras ou novidades
fossem patrocinadas.
Tinha Fortaleza o aspecto de sombria desolação. A tristeza e
o luto entravam em todos os lares. O comércio completamente paralisado dava às
ruas a feição de uma terra abandonada.
A cidade não estava preparada para tamanha calamidade. O
Lazareto da Lagoa Funda, edificado em 1856 para confinar doentes contagiosos,
só dispunha de 300 leitos e os acometidos pela varíola eram milhares. 

rodolfoteofilo+001 Modernização e Adversidade Climática
O auge
daquele teatro de horrores foi o dia 10 de dezembro de 1878, quando o cemitério
do Lazareto recebeu 1004 vitimas da epidemia, ficando por muito tempo na
memória da cidade como “O Dia dos Mil Mortos”. O medo alastrou-se no seio da
população nativa, sobretudo quando a varíola vitimou a esposa do presidente da
província. A partir desse fato ninguém mais se considerou a salvo, mesmo na
área urbana mais protegida.
O repulsivo e perigoso trabalho de transportar os cadáveres
dos abarracamentos até o cemitério do Lazareto, só encontrou aceitação entre
aqueles que compunham o crescente contingente de miseráveis produzidos pelo
crescimento econômico excludente. Afora a diária de mil réis e comida, os
voluntários exigiram também o fornecimento de aguardente para poderem encarar
semelhante tarefa.

extraído do artigo de Sebastião Rogério Ponte
A Belle Epoque em Fortaleza: remodelação e controle
publicado no livro  Uma Nova História do Ceará 
fotos do arquivo Nirez

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mfgprodema@yahoo.com.br

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